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Pé na estrada

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Viagens de carro para quem ama o caminho tanto quanto o destino
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Como atropelamento de cicloativista escancara a hostilidade do trânsito

Situação de quem pedala para trabalhar ou para curtir momentos de lazer piorou muito e é dever de cada motorista contribuir para a convivência pacífica

Por André Sollitto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 Maio 2024, 18h37 - Publicado em 12 dez 2023, 08h00

O trânsito no final de ano pode ser especialmente caótico nas grandes cidades do país. Confraternizações, compras de Natal e preparativos para as festas e as férias escolares fazem com que todos peguem seus carros e lotem as vias. Não há mais horário de pico. Basta sair de casa para enfrentar algum congestionamento. Em São Paulo, a quantidade de obras que acontecem ao mesmo tempo, em diferentes vias, tem prejudicado ainda mais a circulação de todos. Mas a especial falta de cuidado com a manutenção das ciclovias tem exacerbado o quão miserável tem sido a vida de quem pedala em São Paulo tanto para se locomover até o trabalho quanto quem quer usar a bicicleta como esporte ou lazer.

Na última semana, a cicloativista Renata Falzoni, do canal Bike É Legal, foi atropelada por um motorista. Felizmente ela não se feriu, mas todo o evento foi filmado e mostra a agressividade do trânsito. Ela circulava por uma ciclovia binária (que tem dois sentidos), quando a pintura no chão sumiu e ela se viu na “contramão” da via, com veículos vindo em sua direção. Um deles, depois de bloquear o caminho, acelerou e jogou o carro sobre ela, que foi atingida pelo retrovisor. O motorista para e diz que fez aquilo de propósito porque ela estava, afinal, “na contramão”.

O caso apenas ilustra uma sensível piora na qualidade de vida dos ciclistas da cidade. Não é de hoje, mas mostra a transformação que a sociedade passou – para pior. Antes da pandemia, havia um clima mais propício a quem adotava a mobilidade ativa. Startups de aluguel de bicicletas e patinetes elétricos fizeram com que muitos descobrissem as vantagens de se deslocar pela malha cicloviária existente. Nos horários de pico, havia trânsito de bicicletas, patinetes, skates e monociclos elétricos. Com a pandemia, a circulação diminui. E quando a situação se acalmou e todos voltaram a sair de casa, as pessoas deram preferência aos veículos particulares. O trânsito piorou e andar de bicicleta ficou ainda mais arriscado.

Com as obras de recapeamento, a situação se agravou ainda mais. Muitas ciclovias foram apagadas sob o novo asfalto. Algumas delas estão há dois anos sem nova pintura e demarcação. Outras estão em péssimo estado de conservação. Quando as obras invadem a ciclovia, não há uma segregação da via para garantir a segurança de quem passa. É um reflexo do descaso da gestão atual com todos que não dirigem carros. Absurdos são apontados pelos coletivos de cicloativistas diariamente. A Praça do Ciclista, por exemplo, está fechada há meses com tapumes, embora nenhuma obra seja realizada ali. Mais recentemente, o palco do show de natal da Avenida Paulista foi instalado sobre a ciclovia, bloqueando a passagem. A ciclovia da marginal Pinheiros também segue com inúmeros bloqueios. Quem precisa se locomover de bicicleta é jogado à própria sorte no meio da barbárie que é o trânsito da cidade.

O blog chama-se Pé na Estrada e o foco é em viagens de carro. Mas a estrada, bem como as vias da cidade, não são exclusivas para quem está sobre quatro rodas. O Código Brasileiro de Trânsito estipula que o ciclista tem direito de andar na via, e tem preferência sobre seu uso. Afinal, é dever dos maiores cuidarem da segurança dos mais frágeis no trânsito.

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Não é que se vê por aí. Antes de motoristas, somos todos pedestres. Muitos também são ciclistas. Ninguém muda de direção propositalmente para atropelar um pedestre que atravessa correndo fora da faixa. Mas claramente faz isso com ciclistas. O respeito deveria ser a regra, não a agressividade.

É claro que todos já presenciaram algum comportamento de risco de algum ciclista. Muitos andam na contramão, numa tentativa de se fazer notar com maior facilidade pelos carros. Ou invadem as calçadas e furam os semáforos. É um perigo. Mas as autoescolas nada ensinam sobre as melhores práticas sobre as bicicletas. Não há fiscalização para punir quem invade as ciclovias ou estaciona sobre elas, nem orientação aos ciclistas desavisados ou infratores. No salve-se quem puder, cada um escolhe seu método de sobrevivência. E, em vários casos, optam por comportamentos arriscados que põem todos em risco.

Há muito o que avançar. As piores obras da cidade ainda vão demorar para acabar – na Santo Amaro, via repleta de corredores de ônibus e importante trecho de ligação, a previsão de conclusão é setembro de 2024, e na Ponte Cidade Jardim, que dá acesso a bairros como Jardins e Itaim Bibi, conhecidos pelos escritórios modernos e pela variedade de restaurantes, final de janeiro do próximo ano – e dificilmente a gestão atual vai abraçar os ciclistas de uma hora para a outra. Portanto, é o dever de cada motorista contribuir para a segurança no trânsito. Dá para curtir o trajeto dividindo a via com todos.

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