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O Som e a Fúria

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Aposta irlandesa ao Oscar, ‘Kneecap’ mistura hip-hop, sexo e drogas

Filme norte-irlandês, com Michael Fassbender, conta a história real de um trio de músicos desajustados que se tornou um libelo pela independência do país

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 19 nov 2024, 17h07 - Publicado em 19 nov 2024, 16h43

Quando ainda era bebê, um dos integrantes do trio de hip-hop da Irlanda do Norte, Kneecap, sofreu uma violência típica do país onde vive. Filho de família católica e, portanto, nacionalista (que defende a independência do país do Reino Unido), ele havia sido levado para uma floresta para ser batizado como seus ancestrais. A cerimônia, no entanto, foi interrompida por um helicóptero da polícia que suspeitou de que se tratava de uma reunião do IRA (o exército republicano irlandês), grupo paramilitar notório por ataques a bomba e emboscadas contra os ingleses. A cena surreal é recriada no filme que leva o mesmo nome do trio e dramatiza a história do grupo, surgido em 2017, que se notabilizou por cantar letras em irlandês repletas de palavrões e apologia ao sexo e às drogas, mas também por protestar a favor da independência do país do Reino Unido e defender o fim da proibição do ensino da língua irlandesa nas escolas. Inclusive, um de seus integrantes se apresenta com uma balaclava com as cores da República da Irlanda.

O filme, estrelado pelos próprios músicos, que atendem pelos nomes artísticos de Mo Chara, Móglaí Bap e DJ Provaí, já estreou no Reino Unido, mas ainda não tem data para chegar ao Brasil, e surge como um forte candidato a ser indicado ao Oscar e também ao Globo de Ouro, ambos na categoria de melhor filme internacional. Estofo o filme já tem após levar o prêmio de público em Sundance. O elenco, aliás, conta com o ator Michael Fassbender, nascido na Alemanha, mas criado na Irlanda, onde aprendeu a falar a língua local fluentemente, e interpreta o pai de um dos músicos que fez parte do IRA e simulou a própria morte para continuar atuando na clandestinidade.

Com uma pegada semelhante ao filme Trainspotting (1996), Kneecap é uma viagem lisérgica pela cabeça dos rappers que aprontam poucas e boas em Belfast, capital da Irlanda do Norte, sempre com um pint de Guinness em uma das mãos. Mas, apesar das doideiras de seus integrantes, o longa surge como um libelo pela “libertação dos colonizadores” (como eles chamam os ingleses) e contra o unionismo, vertente política que defende a manutenção da união com o Reino Unido, formado por cristãos protestantes.

Das boas sacadas do filme, há cenas divertidas, como o momento em que eles decidem como irão chamar a banda. Um dos integrantes pergunta como a Irlanda do Norte, país mais pobre do Reino Unido, é conhecida no exterior. “Por George Best (antigo jogador de futebol), pelo Titanic (que foi construído em Belfast) e por Kneecap (rótula, em português)”, pontua um deles. A palavra ganhou popularidade no país, pois tanto o IRA, quanto o exército britânico, atiravam nos joelhos dos combatentes como forma de tortura, para incapacitá-los sem matar. Outro momento divertido é o interesse sexual que um dos integrantes desenvolve apenas por mulheres protestantes, portanto, unionistas. Sempre que está transando com elas, ele gritava alguma palavra de ordem contra os ingleses. Acontece que, uma delas, em vez de reagir raivosamente, ficou ainda mais excitada, descambando num diálogo para lá de surreal em que eles repetem sem parar: “Irlanda do Norte” e o outro “Norte da Irlanda”.

A defesa da língua irlandesa como arma na independência do país permeia todo o filme. É luta inglória e ato de rebeldia. Em toda a ilha da Irlanda, apenas 80.000 pessoas são falantes nativos de irlandês, desses, apenas 6.000 vivem no norte da Irlanda. Isso porque é proibido ensinar o irlandês nas escolas da Irlanda do Norte, já que desde 1998, com o Acordo de Belfast, a língua é reconhecida como minoritária. Não por acaso, o personagem de Fassbender diz para o filho que “cada palavra de irlandês falada é uma bala pela liberdade irlandesa”.

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Para além da qualidade musical do trio de hip-hop, o filme é diversão garantida por seu enredo anárquico, roteiro criativo e a direção ágil. Em tempo, caso tenha curiosidade, as músicas dos caras estão disponíveis nos serviços de streaming, mas o difícil mesmo é entender o que eles cantam.

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