Que tipo de escritor vale mais: os prolíficos ou os perfeccionistas?
Enquanto Murilo Rubião passou a vida reescrevendo 34 contos, Coelho Neto encerrou a carreira com mais de 100 livros publicados
Nas biografias dos escritores é interessante observar o quão longevo foi o sujeito, ou seja, com quantos anos morreu, e o quão produtiva foi sua obra, ou seja, quantos livros publicou. É assim que se pode identificar os prolíficos e os perfeccionistas.
Os primeiros escrevem com frenesi, publicam um livro atrás do outro, cultivam todos os gêneros, da poesia ao romance, do conto ao ensaio, e normalmente possuem um renque de obras “menores” como manuais escolares ou antologias de discursos cívicos. Já os perfeccionistas, conforme a própria denominação, são terrivelmente cautelosos na hora de publicar, passam anos revisando o mesmo livro e não raro se mordem por uma vírgula fora de lugar ou uma palavrinha que ficou sobrando numa fala de personagem.
No caso da nossa literatura, não há dúvidas de que o protótipo do escritor prolífico seja Coelho Neto (1864-1934). É possível que o leitor nunca tenha ouvido falar dele. É que Coelho Neto, hoje, está esquecidíssimo, mas foi, em sua época, um dos prosadores mais festejados do Brasil. Amigo de Machado de Assis e membro fundador da Academia Brasileira de Letras, publicou nada menos do que 102 livros! Houve ocasião em que chegou a publicar 10 volumes num único ano. Outra de suas façanhas foi ter escrito um caudaloso romance em apenas 15 dias.
Se quisermos encontrar o oposto de Coelho Neto, basta prestar atenção na parcimônia mineira. Lá nasceu Murilo Rubião (1916-1991), uma espécie de Kafka tupiniquim que gastou muito mais noites reescrevendo do que propriamente escrevendo a sua literatura. “Sete anos levei para escrever meu primeiro livro, O Ex-Mágico”, informou num depoimento. “Nem por isso ele saiu melhor”. Detalhe inquietante: O Ex-Mágico era um livrinho magro com menos de 100 páginas! Em toda a sua carreira, Murilo Rubião publicou apenas 34 contos. Sua obra completa cabe numa edição menor do que qualquer volume da série Harry Potter.
Seja como for, existe uma “verdade” corrente a respeito dos escritores: dizem que passam a vida reescrevendo o mesmo livro, tratando dos mesmos assuntos e quase sempre com os mesmos recursos de linguagem. Os prolíficos fazem isso em vários volumes, tentativa após tentativa. Já os perfeccionistas, mais ciosos e comedidos, resolvem o problema em poucas páginas, esmeradas, sofridas…