
A aluvião de caras manjadas e malandras da “velha política” nacional que, coincidentemente (ou não?), saiu das sombras de repente, em meio ao caos da pandemia covid-19, para assumir o palco principal da decantada “nova política” do presidente Jair Bolsonaro, após a renúncia do ministro da Justiça, Sérgio Moro, lembra, em muitos aspectos, a chanchada “Tem Boi na Linha”, filme brasileiro de grande sucesso de público nos Anos 50/60. O jeito e o tom de comédia de escracho, utilizado pelo mandatário do Palácio do Planalto para “cozinhar” em fogo alto Regina Duarte, até retirá-la do cargo de Secretária Especial da Cultura, dia 20, e mandar a atriz tomar conta da cambaleante Cinemateca Brasileira, em Sampa, só completam a semelhança. No caso dos dias que correm, e m tom de tragicomédia cultural, política e governamental.
Sem falar na escolha, mais esdrúxula ainda, do ator de “Malhação” (seriado juvenil da Globo), Mário Frias – recebido pelo chefe da Nação, em Brasília, juntamente com os cartolas presidentes do Flamengo e do Vasco – para substituir a “namoradinha do Brasil” no comando da política cultural do País nos dias mais bicudos de sua história. Dramática comédia de época e de costumes. Ou não?
Sem perder de vista, é claro, os lances cada vez mais desenvoltos e explícitos de “espertos e malandros”. A começar pela turma do Centrão, do começo deste artigo, chefiada pelo notório Waldemar da Costa Netto. E o significativo reaparecimento (para quem lê nas entrelinhas) do indefectível Carlos Marum, de hilária memória recente, que conseguiu manter a sua bem remunerada sinecura no conselho diretivo de muitas e generosas tetas da Hidrelétrica Itaipu Binacional, ao lado do baiano sempre em movimento, José Carlos Aleluia (DEM).
Foram estas “y otras cositas mas” que conduziram a memória do rodado jornalista à antiga e bem humorada comédia de costumes do cinema nacional, ajudado pelos fatos correntes da tragicomédia tosca que atualmente se desenrola no Palácio do Planalto e adjacências, sob a direção do mandatário da vez, cuja credibilidade e prestígio parece derreter a cada dia de invencionices e primarismos, somados a novas e graves contradições que o desnudam.
O filme, de 1957, dirigido por Aloísio T. de Carvalho tem enredo simples e bem ao gosto popular, como era comum nas chanchadas. Na armação da jogada, para se casar com a filha de um milionário, um típico malandro tido como muito esperto, aceita a proposta do pai da noiva de fazer prosperar uma falida agência de publicidade, com ajuda de um amigo. Mas outros bandidos roubam o primeiro cheque recebido pela promoção de um hotel a ser inaugurado, causando enorme confusão. A graça maior fica por conta do elenco, encabeçado pelo baiano Zé Trindade e a impagável Zezé Macedo, além de Ronaldo Lupo, Neide Landi e outros. Vale a pena rever (está na WEB e na cinemateca que Regina Duarte vai cuidar, incluído na relação dos 50 melhores filmes nacionais de todos os tempos) nestes dias amargos de isolamento do coronavírus, da política brasileira e do jogo pesado do poder em re-arrumação.
Aqui e agora cabe aquele aviso final dos letreiros das comédias de costumes do cinema brasileiro: “Qualquer semelhança com fatos e personagens da vida real pode não ser mera coincidência. Viva a chanchada e o cinema, que muito nos ensinam.
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br