Pra trás, Brasil?
Temos um governo nacional desacreditado, um time em quem ninguém confia, em fim de campeonato, mas que continua atacando.
O começo não foi promissor. E tem o tabu: nunca uma seleção brasileira de futebol foi campeã do mundo tendo empatado (ou perdido) na estreia de uma Copa do Mundo. Mas se, na sequência dos jogos, vierem bons espetáculos e vitórias, o clima de animação tomará conta do país. Até os que não gostam de futebol vão prestar alguma atenção.
O “velho esporte bretão” faz parte da nossa cultura. É impressionante como as crianças e os adultos ficam agitados quando uma bola rola. Seja ela de meia, de capotão (como se dizia antigamente) ou de material sintético das multinacionais de artigos esportivos. Todo o mundo quer dar um chutinho, fazer uma graça.
É verdade que a situação geral do país não tem graça, não comporta euforias. É bom não nos distrairmos sobre o que continua acontecendo no dia a dia. Temos um governo nacional desacreditado, um time em quem ninguém confia, em fim de campeonato, mas que continua atacando. Vorazmente.
Agora mesmo, em 12 de junho, Temer decretou nova vulnerabilização das áreas de proteção ambiental e mineral. O artigo 72 do Decreto 9.406 determina que “em zona declarada reserva nacional de determinada substância mineral (…) o Poder Executivo federal poderá, mediante condições especiais condizentes com os interesses da União e da economia nacional, outorgar autorização de pesquisa ou concessão de lavra de outra substância mineral”. Lembra da Reserva do Cobre (Renca)? Temer tentou iniciar a exploração por lá, atingindo reservas indígenas e ambientais. Foi a reação da sociedade que impediu a devastação. As grandes mineradoras, muito influentes no governo (leia-se “interesses da economia nacional”), atacam outra vez. O PSOL entrou com um Projeto de Decreto Legislativo para sustar os efeitos dessa medida predatória.
Em outra frente, os ruralistas retomam a tentativa de aprovar o PL do Veneno, aquele que libera o uso generalizado de substâncias tóxicas, proibidas em muitos países do mundo. Eles até mudaram a denominação de agrotóxicos para “defensivos fitossanitários”. Há resistência, mas, com o aval do governo, os defensores do projeto têm maioria no Parlamento para legalizar o “doping” na agricultura…
Que não se duvide da capacidade de qualquer governo fazer estragos, mesmo enfraquecido. Por isso, a bem do interesse público, é bom que este acabe logo. Há mil razões para o envio à Câmara de nova denúncia contra Temer. Dia 7 de julho termina o prazo para investigação da PF sobre as suspeitas de favorecimento no Porto de Santos e ligações de Temer com o indigitado coronel Lima. Dia 14 de agosto encerram-se as investigações sobre os vínculos do time do MDB, capitaneado por Temer, com Odebrecht e JBS.
Ética pública não pode estar submetida a conveniências políticas, do tipo “deixa quieto, só restam cinco meses para o final do governo”. Aliás, o exemplo vem da própria Copa: por muitíssimo menos, a Espanha trocou de técnico a dois dias do início do torneio.
*Chico Alencar é professor, escritor e deputado federal (PSOL/RJ)