O iluminado
O sujeito ainda tem a cara de pau de se dizer iluminado. É o fim do mundo! O sujeito em questão era Michel Temer.
Seu Juca estava bravo demais no sábado, 2. No caixa da padaria, desabafava: O sujeito ainda tem a cara de pau de se dizer iluminado. É o fim do mundo!
O sujeito em questão era Michel Temer, alvo principal da fúria de seu Juca. A rapaz do caixa, sorriu, fez a egípcia, e seu Juca, buscando parceria, subiu o tom.
– O cara disse isso, sem nem ficar vermelho, num encontro desses de igreja. Falou pra plateia com a TV filmando. O povo ralando da fila, sem gasolina e sem gás. Prateleira vazia e o vampiro garantindo que, por iluminação divina, tinha fechado acordo com os grevistas. De lascar!
Seu Juca pagou, mas não interrompeu o solo da revolta.
– To perto dos 80. Já vi um de tudo na vida, mas tamanho deboche nunca tinha visto. O cara tá pendurado na Lavajato, cercado de amigos carregador de mala com dinheiro roubado, faz um governo de M e ainda se diz iluminado. I-lu-mi-nado! Só se for por archote do inferno, que é da turma dele. Já viu a cara dele? As mãos? Só falta o chifre.
A senhora arrumada, com cabelos gomados a laquê, ousou dialogar. “A gente precisa ter paciência. Tem que ver que ele pegou um governo destruído por aquela mulher do PT”.
– A senhora me desculpe a ousadia, mas to cansado de ouvir essa lengalenga. A culpa sempre é do de antes. Eu não sou PT, não votei na reeleição da Dilma, não gostava dela. Mas também não apoiei a palhaçada que fizeram com ela. Deu nisso. Ta bom agora?
Já pegando a chave do carro na bolsa, a dama do laquê, rebateu: Bom não tá. Mas quem garante que com ela estaria melhor?
Antes que seu Juca respondesse, um jovem que tomava suco de laranja no balcão entrou na bronca: Pior não estaria! Esse cara é o fim, senhora. Não dá pra defender.
A do laquê, balançou a cabeça, deu as costas e foi-se. Seu Juca partiu para o diálogo com o garoto, cara de sono, cabelos pro desgrenhado.
– Meu jovem, vou dizer pra você o que digo pros meus netos. O Brasil tem jeito sim. O Fernando Henrique não acabou com a inflação? O Lula, em quem ninguém botava fé, não governou direitinho? Não fez o Brasil crescer em paz?
Antes que o mocinho respondesse, outro senhorzinho adiantou-se: Mas roubou. Não roubou?
– Veja como o Brasil é forte. Tanto que até dá pra roubar e governar direito, né não?, devolveu seu Juca, ignorando o colega de idade e falando para o garoto do suco de laranja, que sorriu e respondeu: Imagina então se não roubassem…
Do outro lado veio a voz exaltada: Ah, não me venham defender o Lula!
Virou um furdunço, bate boca no salão. De cada canto um grito, um chavão.
– Pois se tem alguém que merece ser defendido é o Lula!
– Isso mesmo. Só ele preso? Cadê o pessoal do PSDB?
– Já que o Sergio Moro pega eles todos. O Temer inclusive. Não perdem por esperar!
– Esse Zorro de Curitiba tá mais pra Mazzaropi…
Já no carro, a do laquê, gritou:
– Vão defender o Lula na Venezuela, em Cuba!
– E leva o Temer junto. (Emendou outra).
– E deixe esses FDPs por lá. (Reforçou mais um).
– O Temer é da conta dóceis. E Venezuela é isso que vocês arranjaram pra gente, sua coxona! (Berrou uma voz grossa talvez pra dama do laquê que já nem estava mais em cena).
– 13 Milhões desempregados e vocês falando em Venezuela.
– Viva o Moro!
– Lula livre!
– A Petrobrás arrasada…
– Essa é da conta do PT, dos mortadelas.
– Num vem não. O Parente, o Temer, o Maia… tudo invenção dos patos paneleiros.
Quem não gritava, ria.
Seu Juca, que puxou a revolta, já calmo, já rindo, suspirou alto: Iluminado! Quem pariu que embale. Em fila.
Tânia Fusco é jornalista, mineira, observadora, curiosa, risonha e palpiteira, mãe de três filhos, avó de dois netos. Vive em Brasília. Às terças escreve sobre comportamentos e coisinhas do cotidiano – relevantes ou nem tanto