A desordem e o retrocesso tomam conta do Sanatório. Como disse Chesterton, há quase sempre método na loucura. Ou deveria haver. Mas em nosso Sanatório, a loucura tomou conta e jogou pelas janelas o método e a ordem e adotou como parâmetro o retrocesso.
Começa que ninguém fala a mesma língua, a oficial da Nova Política. Chama-se Bolsonarês, é de difícil compreensão e nunca diz exatamente aquilo que parece estar dizendo.
Dou como exemplo Eduardo Bolsonaro que disse em entrevista à Leda Nagle que caso houvesse manifestações esquerdistas aqui no Brasil, como as que acontecem no Chile, ele sugeria que se editasse a volta do AI5. Disse isso com a cara limpa, em alto e bom tom. Falou em puro Bolsonarês. Afrontou a Constituição que jurou defender ao tomar posse como deputado federal por São Paulo.
A reação veio com a velocidade da luz. O pai do deputado, ao sentir que o filho lhe dera uma grave rasteira, fez ver ao garoto o crime que estava cometendo e esse, habituado ao vezo do “falou, mas não foi isso que quis dizer”, já deu outra declaração, dizendo que interpretaram mal o que ele quis dizer, afirmando que não tem nenhuma proposta para a volta do AI5. Ou seja, como bom aluno da língua oficial, o que ele disse não foi bem o que ouvimos, foi aquilo que ele queria que ouvíssemos.
Assim como o capitão e seus filhotes, o ministro do Meio Ambiente, também fluente em Bolsonarês, acusou num momento a ONG Greenpeace, que ele chamou de ‘greenpixe’, pelo vazamento de óleo nas praias do nosso Nordeste, mas menos de 48 horas depois desdisse o que disse e pior, desmentiu que algum dia tivesse dito o que disse! O desmentido aconteceu no programa Central Globo News no qual o que mais chamou minha atenção foi a expertise da defesa que Ricardo Salles faz de seu chefe. É justo que se diga, Salles é um bolsonarista leal e apaixonado, nunca vi nada igual.
Nesse programa, o jornalista Fernando Gabeira fez a pergunta que eu gostaria de ter feito: sobre a vontade demonstrada por Bolsonaro de transformar a Estação Ecológica de Tamoios, em Angra dos Reis, em uma reles Cancún. Resposta enfática de Salles, o defensor do capitão: o presidente não disse isso, ele apenas citou Cancún como exemplo de um resort que colabora para o progresso de seu país, o México. E onde a pesca não é multada, que foi o que aconteceu com Bolsonaro em Tamoios. Pois é…
Infelizmente, o eleitor brasileiro escolheu um homem destemperado, mal-educado, agressivo, para ser presidente do Brasil por quatro anos. Vamos ter que carregar essa cruz por mais três anos, com calma e paciência, mas sempre atentos para não deixar que os filhos do capitão extrapolem. O mais interessado em controlar os garotos é o pai. Até porque cada vez que eles movem uma peça no tabuleiro, eles prejudicam seu governo e diminuem o número de seus seguidores.
Creio ser urgente a contratação de tradutores-intérpretes bolsonarês/português, juramentados, para acompanhar, quando em Brasília ou em viagens, Jair Bolsonaro e seus filhos. Assim, a desculpa favorita deixará de funcionar. Tudo que eles disserem será traduzido para o português e não poderá ser desmentido e transformado em fumaça.
Mas não quero me despedir do Leitor sem comentar dois maravilhosos artigos publicados no jornal O Globo de 31 de outubro: Ascânio Seleme comentando sobre ‘A Ira Desnecessária’ do capitão e Cora Rónai, brilhante, lembrando a semelhança entre Jair Bolsonaro, lá em Rhiad, e Bruno Ganz, o grande ator alemão interpretando Hitler em ‘A Queda’. Simplesmente genial!
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa é professora e tradutora, escreve semanalmente para o Blog do Noblat desde agosto de 2005.