“Um cão danado, todos a ele!”. Mistura de indignação, cimentada em fartas doses de ódio e inveja mal disfarçadas, a tempestade de ataques, ironias e impropérios começou a desabar sobre a cabeça do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) desde o fim da semana passada, quando já se delineava seu insucesso na mais improvável e atabalhoada aventura política e partidária na qual se meteu, com passagem só de ida. Desgraça sacramentada segunda-feira, com a derrota fragorosa e humilhante na tentativa de fazer de Baleia Rossi seu sucessor na presidência da Câmara – em disputa a ferro e fogo, além de muita grana pública, favores e promessas a granel, ainda por atender ou serem desmentidas pelos fatos –, o que me levou a recordar do ditado lapidar, de abertura deste artigo, tantas vezes escutado de D. Celina Dourado, uma sábia mulher à frente de seu tempo, da família de antigos chefes políticos da região de Irecê, no sertão da Bahia.
Para profissionais que estudam, se interessam e dão atenção aos signos da comunicação – ou apenas curiosos e diletantes da matéria –, já era para fincar antenas no ponto mais alto do planalto central e atentar para os insistentes “ruídos” (na expressão que aprendi de Juarez Bahia, saudoso editor nacional do Jornal do Brasil) e anotar sinais nítidos das mudanças no rumo das coisas nos dias estranhos que atravessamos. Observo (com lupa), por exemplo, na coluna Raio Laser da Tribuna da Bahia, a nota de uma manifestação contra o presidente nacional do DEM, ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, e hostilizado, no aeroporto de Brasília, por apoiadores do presidente Bolsonaro, aos gritos de “fora ACM, bandido comunista”. Vai pra Cuba, capacho socialista ”. Isso quando o político, de direita, desembarcava com alegado propósito de discutir com a cúpula, o posicionamento do seu partido na briga ferina pelo comando da Câmara.
O fato, de tão insólito, teve o dom até de operar curas. Na quarta-feira, 3, na mesma TB, leio que o senador do PT-BA, Jaques Wagner – que apresentou atestado médico licenciando- o de comparecer para votar na briga pela presidência do Senado – parece vender saúde e veneno. Provável adversário do neto de ACM (“o original”, como diz o radialista Mario Kertész), nas eleições do ano que vem, o ex – governador petista é só ironia, em postagem nas redes sociais, sobre a “traição” do democrata baiano ao ex- presidente da Câmara: “Não me surpreende. É a tradição dele. Abandonar amigos e aliados, sempre no apagar das luzes, como fez em 2018 e agora. Só se move pelos próprios interesses, dispara Wagner, já sem sintomas de qualquer moléstia. Na quinta, ACM Neto, em manchete na página política da TB, proclama -se “independente” (e o DEM) de governo e oposição e jura não ter negociado nada com o Palácio do Planalto – nem o MEC, de porteira fechada, como já anda na boca dos baianos. A conferir.
Enquanto o circo pega fogo, o turista francês, na Praça dos Três Poderes, olha por trás de cortinas semi abertas e vê que Bolsonaro faz piada com a desgraça de Maia, disfarça quando o assunto é ACM Neto e promete voltar em 2022, aos petistas e esquerdistas que o vaiam e xingam no Congresso, onde o mandatário se sente em casa, nos braços do Centrão. Com ares de Mephístole do planalto , sorri para as paredes. E o viajante irônico diz com os seus botões: “Amaldiçoado seja aquele que pensar mal dessas coisas”. E desce a cortina.
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br