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Grande domador do barro, Francisco Brennand foi o escultor filósofo

Poucos sabem, mas o artista foi autor dos desenhos de cartilhas de Paulo Freire

Por Ricardo Noblat
Atualizado em 30 jul 2020, 19h15 - Publicado em 20 dez 2019, 09h00

Por Joaquim Falcão

Na década de 1960, o futuro do Brasil passava pela intensa alfabetização de nosso povo. Ainda por completar.

A intensa alfabetização passava por Paulo Freire. Seu método, sua mobilização, seu patriotismo, sua esperança no futuro do país.

Poucos sabem. Francisco Brennand também. Foi autor dos desenhos de cartilhas de Paulo Freire.

Estamos todos lá: nossa flora, nossas frutas, nossa fauna, nossos trabalhadores, nossas cores, nossa gente, nossa luz, nossa realidade. Nós. Educando-nos a nós mesmos. Sendo o que também somos. Com orgulho e exuberância. Foi inédito.

Quem, senão Francisco Brennand, teria a ousadia de nos fazer tão grandes cajus, tão imensos abacaxis, tão saborosas pinhas, tão vivos peixes, porcos e tatus? Tantos tucanos sendo pelicanos também? A nos descrever?

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E ainda a pintar dezenas de outros bichos que inventou e que ainda não criamos. Estamos em falta.

Esta intimidade conosco vinha de sua própria vida vivida nas terras do seu herdado engenho na Várzea, no Recife, onde plantou a si próprio. E de lá quase nunca saiu. Longe de partidarismos e ideologias. Nunca foi.

Viajou, então, para dentro de si mesmo. E tanto, e tanto, e tanto, que se fez filosofia.

Basta ler os vários volumes de seu diário. Disse certa feita: “Quando eu pinto, sou um artista ocidental. Quando faço cerâmica, não tenho pátria. Minha pátria é o abismo pelo qual vou resvalando sem saber o que encontrarei no fundo”. Pura filosofia.

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O fundo resvalante poderia mesmo ser a surpresa da cerâmica. Os fornos foram também autores algumas vezes. E desfazia seu próprio projeto.

Quando passava do ponto de cozimento, ou ficava aquém, ou algum imprevisto, o forno se rebelava.

Assumia, então, a autonomia da obra diante do criador. Desenhava o inesperado. O forno, muita vez, lhe foi um ninho de surpresas. Onde resvalava a vida. Como na filosofia.

Ele entregava um projeto e o forno lhe devolvia outro. Sua arte foi domá-lo como ninguém.

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Prazer maior era, na visita à sua oficina, encontrá-lo perambulando pelos corredores. Quase que com uma lanterna na mão.

Na mesma hora, com o visitante qualquer, vinha a conversa fácil. Fluente. Explicativa. Dialógica. Educadora.

Não existe a escultura de Francisco Brennand sem a explicação de Francisco Brennand. Adorava dizer a gênese de sua ideia, de sua concepção, da suavidade, ou mesmo rudeza, das tessituras da cerâmica. Como domava o barro.

Então, sua escultura: a forma se fazia conteúdo em Édipos, Atenas, Arquimedes, Electras, oráculos, altares. Pura mitologia grega materializada. E se fazia Vênus, e Vênus, e Vênus. Muitas Vênus.

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Quem mais e melhor esculpiu a mulher? Uma farta e generosa mulher. Em todas as suas exuberâncias e intimidades. Ventres em abundância. Seios a não mais medir. Redondos, redondos, redondos. Até mesmo algumas freiras.

Não é por menos sua admiração por Balthus e seu erotismo feminino. Talvez só igual a seu encantamento com Fernand Léger. Influência de sua estada em Paris, logo no muito começo.

E Francisco a explicar o tom, a tonalidade, a textura; a acariciar, ou melhor, saborear, com mãos e palavras, suas esculturas. Seus mitos. Sua filosofia.

Cícero Dias, artista ícone, pernambucanamente, pintou uma aquarela de alguns metros de extensão e lhe deu um nome ícone também: “Eu Vi o Mundo… Ele Começava no Recife”.

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Com Francisco Brennand poderíamos dizer: “Eu vi o mundo… ele veio ao Recife”.

Joaquim Falcão é membro da Academia Brasileira de Letras, professor da Escola de Direito do Rio e da Fundação Getulio Vargas

(Transcrito do jornal Folha de S. Paulo) 

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