Uma vez que o governador Camilo Pena (PT), do Ceará, pediu o envio de tropas da Força Nacional para restabelecer a ordem no seu Estado ameaçada por policiais fantasiados de milicianos, Jair Bolsonaro fez o que lhe cabia – atendeu-o.
Mas é a favor dos baderneiros mascarados, que usam seus próprios familiares como escudos humanos a exemplo dos terroristas do Estado Islâmico, que bate o coração do outrora sindicalista militar afastado do Exército por indisciplina.
Foi por ser um bom atleta que Bolsonaro começou a chamar a atenção dos superiores em sua fase inicial na caserna. Na fase terminal, destacou-se por reivindicar melhores salários para a soldadesca e tramar atentados a bomba em quartéis.
O sindicalista fardado deu lugar ao deputado federal de uma nota só – a defesa intransigente de tudo o que pudesse interessar aos seus antigos pares. Foi entre eles que montou sua base eleitoral. O resto é história conhecida.
Empossado na presidência, dedica-se desde o primeiro instante em fazer o gosto dos que o apoiaram incondicionalmente – e, entre esses, estão os militares e os policiais beneficiados com suas medidas.
E agora? Como comportar-se quando o dever lhe impõe que não compactue com greves ilegais, e ele, no entanto, hesita em bater de frente com seus devotos? É real o perigo de a sedição armada no Ceará alastrar-se a galope por outros Estados.
Anteontem, em Fortaleza, no 18º batalhão da Polícia Militar transformado na central da desordem, os amotinados receberam a visita de um deputado que lhes prometeu o apoio de Bolsonaro. A massa respondeu com gritos de “Mito. Mito”.
Assim como Bolsonaro não disse até aqui uma só palavra a respeito do ataque do general Augusto Heleno ao Congresso chamado por ele de “chantagista”, também não disse uma só contra a insubordinação dos seus seguidores no Ceará.
Pelo contrário. No número semanal que encena no Facebook, preferiu debochar do senador Cid Gomes (PDT-CE), atingido por dois tiros ao valer-se de uma retroescavadeira para tentar pôr fim à ocupação de um quartel em Sobral.
Ontem à noite havia 10 quartéis no Ceará sob o controle de policiais em pé de guerra. A Força Nacional não será usada para desalojá-los. Em apenas dois dias, 51 pessoas foram assassinadas. Antes da rebelião, a média era de 12 homicídios.
Bolsonaro não é o primeiro presidente da República a testemunhar rebeliões de policiais militares durante o seu governo. Mas nenhum presidente como ele foi tão umbilicalmente ligado e dependeu tanto do voto dessa gente.