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Amargo exílio

Vivemos um momento crítico para a educação brasileira

Por José Paulo Cavalcanti Filho
Atualizado em 6 dez 2019, 12h00 - Publicado em 6 dez 2019, 11h00

Exílios podem ser voluntários. Como o de Fernando Pessoa, exilado nele mesmo. “Tenho saudades de mim”, disse em Carta do heterônimo Henri Moore. Outros, violência pura.  “O pão amargo do exílio”, na definição de Shakespeare (em Ricardo II). Lembro três casos. Dois no passado.

Washington, julho de 1969. Um grupo de latino-americanos, que estudavam nos Estados Unidos, foi conversar com Paulo Freire. Autor da Pedagogia do Oprimido, doutor Honoris Causa em 35 universidades estrangeiras e exilado. No seu modesto apartamento, recebeu todos com um sorriso largo. E, depois de explanar sua visão sobre os compromissos com a educação, quiz se inteirar de como iam as coisas no Brasil. Ausente do país por muito tempo, não escondia sua curiosidade. Ficou preocupado especialmente quando lhe dissemos que a Ditadura estava ensinando Moral e Cívica (EPB), nas escolas. Para ele, educação era tudo. E, se o governo estava cuidando disso, iria durar bem mais do que esperávamos. Estava certo.

Paris, primavera de 1973. Josué de Castro, autor de Geografia da Fome, Presidente do Conselho da FAO e embaixador brasileiro da ONU, era outro exilado. Jantar no seu apartamento, às margens do Sena. Entre os talheres de sobremesa, 12 comprimidos. Foi fácil contar. Que era um comprimido e um gole d’água. Ritmadamente. Numa coreografia lenta, sem sentido e triste. Perguntei: “Por que isso?, dr. Josué. O senhor está tão bem”. “Estou não, amigo. Estou morrendo”. “De que?”. “De saudade”. Três meses depois (em 24/9), o exílio era só aquela saudade pressentida. Traduzida num adeus.

O terceiro exílio mora no presente. Vivemos um momento crítico para a educação brasileira. No exame PISA (da OCDE), correspondente a 2018 (agora divulgado), andamos muito mal em leitura (57º lugar), ciências (66º) e matemática (70º).  Claro que é culpa do passado. Mas precisamos avançar, para reverter esse quadro. Sem preconceitos. E o primeiro gesto do Ministério da Educação foi banir Paulo Freire de seus registros. A Plataforma Freire, que reúne informações sobre professores do ensino básico, agora se chama Plataforma Capes de Educação Básica. A explicação técnica é que foi ampliada sua abrangência. Nada contra. Mas não custaria manter o nome. São pequenas coisas que machucam. Sem contar que essa troca tem uma dimensão simbólica. Porque, e seria bom que alguém informasse o Ministro Weintraub, por disposição expressa da Lei 12.612 (de 13/4/2012), Paulo Freire é o Patrono da Educação Brasileira. Os dois primeiros exílios foram trágicos. Esse novo é um mau presságio.

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