De ‘papar’ a ‘papável’: quando o papa e a comida viram heresia linguística
Descubra como essas palavras unem religião e culinária em uma deliciosa confusão — com direito a etimologia, duplo sentido e bom humor

Fala, pessoas!
A língua portuguesa é mesmo um espetáculo, né? Riquíssima, cheia de nuances e, às vezes, deliciosamente ambígua. Quem viu as recentes reportagens sobre a sucessão papal, após a morte do Papa Francisco no último domingo, provavelmente teve aquela reação digna da quinta série (ou melhor, do sexto ano, como se diz hoje em dia): “Papável? Isso é de comer?”
Calma, você não está sozinho. Vamos desvendar essa deliciosa confusão linguística.
De onde vem a palavra “papa”?
Tudo começa no grego antigo. A palavra “papa” vem de pappas, que significa “pai”. No início, entre os séculos III e V d.C., o termo era usado de forma mais ampla, referindo-se a diversos bispos. Só no século IX é que o título passou a designar exclusivamente o bispo de Roma, ou seja, o líder máximo da Igreja Católica.
A palavra “padre”, que no espanhol significa “pai” e no português se transforma para nomear o sacerdote responsável por uma igreja, uma paróquia, uma comunidade cristã católica é mais um exemplo de como a raiz “paternal” assume diferentes formas e funções nas línguas de origem latina, especialmente no campo religioso.
Portanto, “papa”, nesse contexto, não tem nada a ver com comida. Pelo menos, não ainda…
E o verbo “papar”, vem de onde?
Agora sim entramos no campo da alimentação, ou quase isso. O verbo “papar”, no sentido de comer, vem do latim pappo e origina também papo, pela sua associação com a parte dilatada do início do trato digestivo das aves na base do pescoço, região que se associa à fala nos seres humanos.. Em português, “papar” é um termo informal que remete a comer com vontade, às vezes até com pressa. Mas também pode ganhar outros tons mais… digamos, picantes.
Dependendo do contexto, “papar” pode significar conseguir algo de forma duvidosa ou até fazer alusão a relações sexuais. Tudo depende do tom da conversa (e da malícia de quem ouve).
“Papável”: uma palavra, dois sentidos e muita confusão
A cereja do bolo é a palavra “papável”. Do ponto de vista da morfologia, trata-se de um adjetivo formado pelo sufixo “-ável”, usado para indicar aquilo que pode ser feito. Exemplos? “Verificável” (que pode ser verificado), “ajustável” (que pode ser ajustado), e claro, “papável”, que pode ser Papa… ou pode ser comido.
Sim, a mesma palavra carrega esses dois significados, e os editores mais espertos têm se aproveitado disso. Muitos veículos de imprensa, inclusive, passaram a usar “papável” entre aspas nos títulos, justamente para destacar esse duplo sentido — meio sacana, meio religioso.
Coincidência ou destino linguístico?
No fim das contas, trata-se de uma feliz coincidência etimológica. Duas origens latinas, dois sentidos distintos, e um mesmo termo capaz de deixar até os mais sérios leitores com um sorrisinho no canto da boca.
A língua portuguesa, afinal, é isso: uma mistura de história, cultura e criatividade. E às vezes, ela nos prega essas peças que são puro sabor, seja de risada, seja de reflexão.
Espero que você esteja gostando dessa coluna que tem por finalidade deixar você com a língua portuguesa NA PONTA DA LÍNGUA.
Não se esqueça de que toda terça-feira e toda quinta-feira posto um texto novo por aqui; se você está gostando, já compartilha o link da coluna com a família e todos os seus amigos!
Vamos que vamos!
Professor Noslen Borges
Revisão textual: Profª. Ma. Glaucia Dissenha
Revisão de Conteúdo: Prof. Me. Fernando Pestana