Efetivamente, chegamos à temporada eleitoral. Até agora tivemos ensaios, treinos, pré-temporadas e afins, que dão uma ideia do confronto, mas ainda não definem o resultado das urnas. A campanha vai aquecendo por etapas e só em setembro tomará conta do cenário nacional. Muitos têm como fato dado a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Lula (PT). E que Lula é o favorito nas intenções de voto. Claramente, a situação aponta nessa direção. Contudo, as eleições costumam ser cheias de surpresas.
Considerando que temos três meses pela frente até o pleito, duas questões devem ser postas. A primeira é se há tempo para mudanças. A segunda é sobre o que pode mudar as tendências hoje verificadas. Vamos tentar responder às duas perguntas. O primeiro aspecto a ser considerado é o fator tempo. Três meses é uma eternidade em um processo eleitoral.
O segundo aspecto a ser considerado refere-se à agenda. Em 2018, a escolha de Bolsonaro foi mais uma aposta afirmativa na renovação do que na rejeição específica ao universo “lulopetista”. Hoje a pauta eleitoral se sustenta na rejeição que ambos os candidatos despertam no eleitorado. A predominância de uma elevada rejeição combinada a três meses de campanha pode abrir brechas para alterações. Bolsonaro perde parte do seu eleitorado de 2018 para Lula. Por outro lado, o antipetismo continua relevante para manter a competitividade do presidente. Lula e Bolsonaro são uma espécie de nêmesis um do outro. Uma eleição com muita rejeição termina gerando uma adesão não engajada ao escolhido. E isso abre a possibilidade de transformar a polarização de hoje em uma incerteza.
“O favoritismo de Lula é inconteste, mas a resiliência de sua candidatura será posta à prova na campanha”
Para reforçar um quadro de potencial mudança, tanto Bolsonaro quanto Lula não perdem a oportunidade de praticar o “sincericídio”, que, em doses significativas, pode ser mortal. Lula flerta com o perigo ao mencionar a sua intervenção em favor de sequestradores. Assusta ao se posicionar pela regulamentação da mídia e pela revogação de reformas. Bolsonaro não perde a oportunidade de dar opiniões sem avaliar seus impactos. Não cansa de desagradar ao eleitor de centro, que não está engajado em sua pauta. Outro aspecto reside no fato de Bolsonaro gastar mais tempo atacando inimigos incompreensíveis para boa parte do eleitorado, como o TSE, o STF e a Petrobras, em vez de divulgar suas realizações.
Ambos disputam uma corrida para ver quem erra menos. Mas parece que não estão preocupados com isso. O favoritismo de Lula é inconteste, porém a resiliência de sua candidatura será posta à prova nos próximos três meses, quando os ataques ao passado do PT forem explorados. Já Bolsonaro tem o desafio de conquistar votos que se perderam ao longo de sua gestão. Medidas como aumentar o Auxílio Brasil e dar subsídio aos combustíveis devem ajudá-lo. Mas podem não ser suficientes se não houver uma modificação nas narrativas.
Portanto, há tempo para mudanças. A resposta sobre o que afetaria a polarização está no fato de a agenda predominante ser a da rejeição, os ponteiros estarem excessivamente expostos a polêmicas e haver eleitores que podem trocar de opinião. Por fim, existe o acaso. A corrida eleitoral mal está começando.
Publicado em VEJA de 6 de julho de 2022, edição nº 2796