O recente declínio da popularidade do presidente Lula (PT) acionou alertas dentro do governo, precipitando uma série de reuniões de emergência. Circulam especulações até sobre a possível contratação de um consultor de marketing para revisar a estratégia de comunicação. As soluções propostas, por serem convencionais, parecem pouco promissoras para mudar o atual cenário. Diante dessa queda de popularidade, surgem questões cruciais: como o governo pode recuperar o apoio perdido e quais são as consequências dessa perda de apoio?
Vamos tentar desdobrar tais questões. Para começar, é crucial entender que a perda de popularidade do presidente Lula ocorre principalmente entre aqueles que não se identificam diretamente com ele, mas que o elegeram como uma alternativa ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A distância crescente entre esses eleitores e o presidente se deve, em grande parte, à percepção de que as propostas do governo pendem excessivamente para a esquerda, contrastando com suas expectativas. Essa situação sugere que Lula, assim como Bolsonaro fazia, pode estar falhando ao priorizar o diálogo com seu círculo de apoio direto, em detrimento de uma abordagem que poderia manter e até expandir sua base.
“O fato é que, sem uma mudança de estratégia, o capital político de Lula pode se esgotar rapidamente”
O presidente enfrenta um dilema: governar exclusivamente para a sua base de apoio ou adotar uma postura mais abrangente e inclusiva. E o fato é que, sem uma mudança de estratégia, o capital político de Lula pode se esgotar rapidamente. Então, qual o caminho a seguir? A lógica sugere a segunda opção, ou seja, uma governança voltada para o conjunto da sociedade, superando controvérsias e extremismos. Para isso Lula precisaria, primeiro, reorganizar sua administração, focando em resultados concretos e limitando a sua narrativa a aspectos positivos. Seria desejável também manter as ações do governo alinhadas às prioridades de desenvolvimento econômico e social, dentro de um quadro de responsabilidade fiscal. Além disso, a comunicação deveria evitar abordagens puramente mercadológicas ou populistas, tendo em vista alcançar um público mais amplo, com uma visão holística da comunicação.
O que seria isso? Seria, basicamente, considerar que a comunicação inclui um conjunto de iniciativas que vão desde o simples diálogo até estratégias de divulgação das ações governamentais. As críticas a mercados, a elites e a supostas conspirações internacionais já não têm o mesmo impacto em um contexto de informação saturada. O público quer resultados objetivos e bem definidos. Outro ponto controverso refere-se à ambiguidade ao defender a democracia no Brasil e ser complacente com regimes autocratas. O governo também está devendo à população narrativas mais consistentes quanto à segurança e à saúde públicas.
O presidente está em meio a escolhas de Sofia — um dilema moral extremamente doloroso. Basicamente, Lula tem que escolher entre ser pragmático e organizado, estabelecendo padrões de eficiência e entrega aos cidadãos, ou ficar preso a narrativas que são caras a padrões ideológicos com os quais historicamente se identifica. Por fim, é sempre bom lembrar que para ser um governo popular não é necessário que o presidente seja populista. Basta que ataque os problemas que mais preocupam os brasileiros.
Publicado em VEJA de 22 de março de 2024, edição nº 2885