Ego inflado aprisiona a política
A saída virá de uma maturação coletiva e de instituições fortes
A política vive um momento psicologicamente denso e complexo. A confusão mental gera uma polarização insana, arrastando parte expressiva do eleitorado e, também, dos formadores de opinião.
Esse ambiente revela algo além do conflito institucional ou ideológico. Há uma dimensão psicológica estruturante, acessível por meio da psicologia analítica de Carl Jung. Especificamente, pela tensão entre a inflação do ego e a dificuldade no processo de integração da sombra, que é um conjunto de aspectos da personalidade que o ego não reconhece ou rejeita por considerá-los inaceitáveis.
Essa tensão resulta em um paradoxo: quanto mais o ego tenta controlar a totalidade do real, mais se torna refém das forças que julga dominar.
Para Jung, o que aqui chamarei metaforicamente de “entrega” — o reconhecimento dos limites do ego diante da totalidade psíquica — não é desistência, mas maturação: integrar aspectos negados de si mesmo é aceitar que a realidade não se curva integralmente à vontade. O poder que admite vulnerabilidades se fortalece.
Esse paradoxo descreve líderes que, ao tentar moldar a realidade conforme suas narrativas, acabam capturados pelas mesmas forças que pretendiam controlar. A política brasileira vive permanentemente esse movimento — e seus dois principais protagonistas o encarnam de formas distintas.
“Lula tropeça quando tenta organizar o mundo apenas a partir de suas certezas ideológicas”
Lula é um exemplo disso. Ele alterna momentos de grande pragmatismo — quando se entrega ao real, amplia alianças e negocia a partir do que encontra — com momentos de tentativa de controle total da narrativa. Sua dificuldade está justamente em não se entregar ao que o país se tornou: uma sociedade em que a maioria do eleitorado valoriza ordem, segurança pública efetiva, clareza discursiva e previsibilidade programática.
Quando Lula tenta organizar o mundo apenas a partir de suas certezas ideológicas e de sua narrativa heroica, tropeça. Quando aceita a pluralidade do ambiente político e governa com base no que a realidade lhe oferece, cresce.
Bolsonaro, por sua vez, encarna outro polo do paradoxo. Sua persona política é construída sobre a recusa absoluta de qualquer entrega. Ele não reconhece vulnerabilidades, não admite erros, não integra a sombra. Ao tentar controlar sua base com disciplina emocional e moral — transformando-a em extensão de seu próprio ego —, tornou-se dependente dela.
Na tentativa de manter controle total sobre a sua própria imagem e sobre o ambiente político, Bolsonaro aprisionou-se no personagem que o impede de evoluir. Não pode moderar sem trair a si mesmo.
O resultado é um país dividido entre um líder que se perde quando tenta controlar demais e outro que desmorona quando a realidade exige qualquer gesto de rendição. A política brasileira é, nesse sentido, a expressão coletiva de egos inflados, sombras não integradas e narrativas que tentam domesticar o real — e sistematicamente falham.
A saída não virá de novos personagens com as mesmas patologias, mas de uma maturação coletiva E de instituições suficientemente fortes para conter os excessos do ego político. No fim, Jung oferece uma chave simples: o poder que se entrega ao real se fortalece; o poder que tenta dominá-lo integralmente torna-se sua vítima.
Publicado em VEJA de 14 de novembro de 2025, edição nº 2970
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