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Revolução cultural: Super-Homem bi e seção de brinquedos neutros

Inclusão ou forçação de barra? Novos projetos voltados para crianças e jovens mostram que a fila anda rápido e muitos não sabem como reagir

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 12 out 2021, 08h10 - Publicado em 12 out 2021, 08h09

Não é um pássaro nem um avião. É Jon Clark, filho e sucessor do Super-Homem, arrumando um novo namorado, o hacker Jay Nakamura – o sobrenome já indica que o escolhido tem a vantagem de não ser um branco ocidental, o que conta pontos adicionais no sistema politicamente correto.

Tom Taylor, o roteirista australiano que anunciou a saída do armário de forma a obter repercussão máxima, deixou para trás o Super-Homem negro que será filmado com roteiro do escritor Ta-Nehisi Coates, mais conhecido pelos livros de abordagem radical à questão racial.

O novo Super-Homem, filho de Clark Kent e Lois Lane, também tem uma roupa redesenhada, músculos mais lapidados ainda e dúvidas sobre seu verdadeiro papel como super-herói, mas obviamente o que chama atenção é seu comportamento sexual.

Quem não gostar, que não compre, não acesse, não veja. Esta é a resposta menos complicada que pode ser dada aos que reagem negativamente às mudanças das quais o Super-Homem bi é um dos resultados mais recentes.

É claro que a questão envolve aspectos mais complicados para mães e pais que querem criar filhos decentes, de bom caráter, que respeitem as diferenças e os diferentes, mas também acham que existe um exagero ou uma tendência à doutrinação nas múltiplas iniciativas feitas sob o rótulo genérico da inclusão.

Algumas são feitas sob a égide do Estado e soam invasivas. Um exemplo da semana: o governador da Califórnia assinou o projeto de lei que obriga as lojas ou setores de brinquedos a ter seções neutras em matéria de gênero. Ou seja, uma alternativa ao universo cor-de-rosa das Barbies e os foguetes azuis, uma divisão que “pressiona as crianças a se enquadrar nos estereótipos de gênero”, segundo ativistas LBGTQ defensores da nova lei.

A nova lei não proíbe as seções voltadas para meninas e meninos em matéria de brinquedos e produtos como escovas de dente, estes pérfidos instrumentos da discriminação por gênero, mas exige a seção alternativa (lugar garantido: brinquedos da Lego, que agora considera sua missão fazer produtos que “encorajem meninos e meninas a brincar com peças que são vistas tradicionalmente como ‘não para eles'”).

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“Espero que seja um incentivo a outros comércios para evitar reforçar estereótipos artificiais e superados”, disse o autor do projeto de lei da Califórnia, o deputado estadual Evan Low.

É certo o Estado interferir dessa forma em empreendimentos particulares (e implicitamente condenar os pais que presenteiam suas filhas com bonecas cor-de- rosa)?

Muito mais do que brinquedos conformes aos estereótipos de gênero, o que está mobilizando mães e pais nos Estados Unidos atualmente é o ensino orientado pelos princípios da teoria racial crítica, uma visão que saiu do mundo universitário para se propagar por escolas para crianças e jovens.

A teoria racial crítica interpreta o mundo primordialmente à luz das relações raciais e, por paralelos óbvios, evoca o enfoque marxista baseado na luta de classes.

As reações são intensas, para dizer o mínimo. Estados com maioria conservadora aprovaram projetos proibindo o ensino da teoria nas escolas públicas. Ao mesmo tempo, o ministro da Justiça do governo Biden, Merrick Garland, prometeu colocar o FBI para investigar pais que protestam contra a nova modalidade de ensino e podem ser enquadrados por crimes de terrorismo caso façam “ameaças de violência”.

Raça e gênero são hoje os elementos que dominam os debates culturais e sociais, com exageros que deixam estupefatos os que não se situam entre as elites para as quais toda a civilização ocidental está irreversivelmente contaminada pelo preconceito racial e a discriminação às sexualidades alternativas.

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Fora do mundo acadêmico, soa inacreditável o que acontece em universidades americanas e britânicas onde reina uma revolução cultural que evoca frequentemente paralelos com a ocorrida na China quando Mao Tsé-tung colocou estudantes e operários para sabotar todas as hierarquias, de professores a dirigentes partidários – uma forma de garantir a hegemonia dele sobre outros líderes do Partido Comunista.

Soa como exagero comparar tendências acadêmicas do mundo anglo-saxão ou leis sobre bonecas com as atrocidades ocorridas na China, com expurgos, execuções e transferências em massa de populações das cidades para o campo e resultados devastadores, em termos de sociedade, economia, ensino e ciência.

Mas o ambiente de intimidação é real. Anonimamente, para proteger suas carreiras do tribunal das redes sociais, professores da Universidade de Edinburgh, na Escócia, queixaram-se da “censura institucionalizada” representada pela iniciativa da direção acadêmica de pagar a alunos para “descolonizar” o currículo.

“Alunos de graduação ficam na posição de vetar ou ‘descolonizar’ o currículo proposto pelos professores com quem deveriam estar aprendendo”, disse um deles.

Super-Homem bissexual é uma provocação quase infantil comparado à universidade que paga a estudantes para detonar professores. Até Michel Foucault, provavelmente o maior responsável por toda a sequência de acontecimentos desencadeada a partir do pós-modernismo, talvez interpretaria o que está acontecendo como uma velha e tradicional luta pelo poder em que o papel de repressor apenas transita de um polo para outro.

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