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Pesquisa: está a imprensa americana desconectada do mundo real?

Apenas 30% dos americanos acreditam que os meios de comunicação cobrem os fatos como eles são e 25% que administram bem a informação

Por Vilma Gryzinski 24 jun 2022, 07h59

O público americano, principalmente fora dos grandes centros, é de Marte e os jornalistas são de Vênus. Esta é, metaforicamente, a conclusão de uma pesquisa do Pew Research Center, que consultou 12 mil jornalistas e cotejou sua opiniões com a do público em geral.

Dos profissionais da imprensa, 65% disseram que seus veículos fazem um trabalho sério na cobertura dos assuntos mais importantes do dia. Apenas 30% do público acha a mesma coisa.

Fiscalizar os detentores do poder político é uma das missões que 52% dos jornalistas consideram que fazem bem. Menos de três em cada dez americanos fora da profissão acham a mesma coisa. 

Outro dado: 43% dos jornalistas acham que administram bem a desinformação, contra 25% do público em geral.

Um número parecido, de 46%, se considera bem conectado com seus leitores e ouvintes, mas só um quarto do público sente a mesma coisa.

Escrevendo no The Hill, Joe Concha atribuiu o fenômeno ao fato de que a maioria esmagadora dos jornalistas se concentra no eixo Nova York e Washington (o equivalente a São Paulo-Rio-Brasília).  “A bolha é real”, comentou.

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Ele lembra que em 2020, Donald Trump teve exatamente 9% dos votos em Manhattan, proporção mais baixa ainda em Washington – 5,4%. É claro que os meios de comunicação refletem este bioma mental. “Não conheço ninguém que votou nele”, se tornou uma das maiores desculpas para o choque de realidade nos meios de comunicação quando Trump foi eleito, em 2016.

O desaparecimento dos pequenos jornais do interior, tragados pela era digital, acabou com o equilíbrio entre liberais e conservadores que a imprensa regional tinha. Restaram os grandes veículos entre os quais, com a única exceção da Fox, prevalece o progressismo.

A maneira apaixonadamente partidária, militante, com que a eleição de 2020 foi coberta produziu até uma aberração. Quando o New York Post publicou uma reportagem mostrando e-mails comprometedores de Hunter Biden, o filho problema (apesar de já estar com 52 anos), do então candidato democrata, a repercussão foi de extrema negação. 

O Twitter baniu o Post e a grande imprensa caiu matando para desmerecer os fatos apresentados. Só este ano o Washington Post admitiu que havia errado e o New York Times enterrou o desmentido no milionésimo parágrafo de uma reportagem: os e-mails eram autênticos e mostravam Hunter usando o nome do pai, quando era vice-presidente de Barack Obama, para promover seus negócios com investidores estrangeiros.

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Joe Concha deu como exemplo da desconexão com a realidade que o excesso de partidarismo provoca uma declaração, que parece saída de um programa humorístico, do apresentador Don Lemmon: “Aqui na CNN não estamos no ramo da opinião, apresentamos a reportagem e procuramos ficar no caminho do meio”.

Nos primeiros cem dias de Trump, 93% das reportagens da CNN sobre o presidente outsider foram negativas.

Agora, quando até os veículos mais militantemente democratas estão decepcionados com Joe Biden – e que as audiências despencaram, com o fim do “efeito Trump -, estão sendo feitas algumas correções. O novo presidente da CNN (o anterior caiu por causa de uma relação não revelada com a chefe de publicidade da rede), Chris Licht, quer “menos opinião e mais jornalismo”, evocando os tempos em que o canal pioneiro das 24 horas de notícias apresentava fatos sem o excesso de comentaristas – e partidarismos.

“As pessoas perderam a confiança na mídia”, constatou Licht.

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Quando canais a cabo, jornais ou sites dedicam-se inteiramente a criticar com virulência, às vezes até com antifatos,  um presidente como Donald Trump é claro que uma parcela importante do público se sente mal servida. Só para lembrar: Trump teve 75 milhões de votos em 2020, embora ache que teve mais e que a eleição foi roubada.

No mesmo programa em que declarou a CNN isenta, Don Lemmon disse que “existe um partido que está enganando o público americano, e este é o Partido Republicano”. Já o Partido Democrata “está defendendo a democracia”.

Joe Concha lembrou um estudo feito em 2013 mostrando que apenas 7% dos jornalistas se identificavam com o Partido Republicano.

O relatório anual chamado Digital News Report, feito pelo Instituto Reuters, em 46 países, mostrou que a confiança na mídia caiu em 39 deles. No Brasil, este índice é comparativamente alto – 48% -, mas caiu seis pontos.

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O principal acesso à informação entre os brasileiros é através do YouTube. Seguem-se WhatsApp e Facebook.

Donald Trump se elegeu pelo Twitter, Jair Bolsonaro pelas lives na mesma plataforma e “o velhinho do TikTok”, Rodolfo Hernández, quase chegou lá na Colômbia. Todos eram considerados candidatos folclóricos, outsiders sem chances de disputar o primeiro plano. As reações de choque que a vitória de Trump causou em 2016 na grande imprensa tornaram-se legendárias e deram a pista de como seria a cobertura dali em diante.

Agora, até o New York Times, onde os comitês internos de inquisição praticamente tomaram o poder, está dando uma sutil recalibrada com o novo diretor de redação, Joe Kahn.

Uma fonte, obviamente anônima, disse ao Guardian que havia uma sensação de alívio diante do fato de que Kahn é uma pessoas “com pouca paciência para as eclosões de guerrilha cultural na redação que tanto nos desviaram do principal nos últimos tempos”.

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Um New York Times menos devorado pelas fogueiras da inquisição digital é bom para si mesmo, depois de ter incinerado profissionais formidáveis como Bari Weiss, e para o resto da imprensa. 

Ninguém espera que se torne menos liberal. Inclusive porque perderíamos as oportunidades de sorrir um pouco quando o maior jornal do mundo revela suas tendências em reportagens como a em que tentou desmentir que “os caras bons com armas” são um modo importante para interromper os autores de tiroteios que matam criancinhas e outros inocentes.

O jornal publicou um estudo com 433 casos desse tipo de matança, entre os anos 2000 e 2021. Em 131 deles, a polícia matou ou dominou o atirador. Em 64, foram pessoas comuns, armadas, que subjugaram ou eliminaram os malditos. Ou seja, um total de 195 casos em que os “bons” prevaleceram.

“Mesmo quando agentes da lei respondem rapidamente – às vezes em questão de segundos – ou se policiais já estão no local do crime quando o ataque começa, atiradores ativos podem ferir e matar pessoas”, disse o Times.

A reportagem não se pergunta o que teria acontecido se os “caras bons com armas” não estivessem lá.

Aliás, no último grande caso do tipo, em Uvalde, onde um desgraçado matou 19 alunos e duas professoras de uma escola, a polícia apareceu em questão de poucos minutos, mas o homem no comando não permitiu que usassem suas armas e equipamentos de proteção para salvar vidas inocentes.

Errar faz parte inerente do exercício do jornalismo, que lida com uma dinâmica inexoravelmente fadada a superar os profissionais. Mas quando as opiniões – que obviamente têm um lugar importante – contaminam a esfera dos fatos ou se tornam onipresentes, todos perdem: jornalistas, os veículos onde trabalham e o público que deveria confiar no contrato social implícito entre as partes, mas passa a desconfiar que está sendo mal informado ou manipulado pelos que cedem à tentação da arrogância dos sabe-tudo que desprezam a própria audiência como sabe-nada.

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