Ortega persegue nicaraguenses e dá abrigo a esquerdistas estrangeiros
O argentino Mario Firmenich tem livre trânsito e salário de assessor presidencial, enquanto mais de trezentos patriotas tiveram nacionalidade cassada
É uma inversão total de valores. O pequeno déspota Daniel Ortega vingou-se dos 222 presos políticos colocados num avião para os Estados Unidos mandando cassar sua nacionalidade. Depois, mais 91 nicaraguenses já vivendo no exterior por causa da perseguição política também sofreram o mesmo castigo, ilegal por todos os princípios fundamentais do direito.
Agora, uma rede de repórteres independentes chamada Nicarágua Investiga e Conectas revelou que uma das figuras mais violentas da história da argentina, o ex-líder montonero Mario Firmenich, está morando no país, contratado como assessor presidencial com um salário equivalente a 3 700 dólares.
Firmenich zerou suas contas com a justiça ao ser anistiado em 1990 pelo governo argentino, na época chefiado por Carlos Menem, e foi professor universitário na Espanha. Pode morar onde quiser, mas note-se a brutal ironia: ele, um defensor e praticante de crimes de sangue, justificou a perseguição de patriotas nicaraguenses de diversas tendências políticas pelo crime de fazer oposição a Ortega.
“As prisões preventivas por lavagem de dinheiro financiado pela interferência eleitoral norte-americana são justificadas pelo direito”, escreveu num artigo publicado pelo site do Canal 6, surpresa, o canal de televisão é controlado pelos filhos de Ortega e Rosario Murillo, a parceira, influencer política e vice-presidente Rosario Murillo.
Foi num evento de moda promovido por Camila Ortega Murillo – notaram o sobrenome? – que ele apareceu no ano passado. Também estava presente outro convidado especial do regime nicaraguense, Salvador Sánchez, ex-presidente de El Salvador denunciado por peculato e lavagem de dinheiro em seu país.
Outro protegido do companheiro Ortega também presidiu El Salvador, também é procurado pela justiça e também é de esquerda: Mauricio Funes, que foi casado com a brasileira Vanda Pignato, trocada por uma beldade mais nova quando se tratava de câncer no útero. Vanda chegou a ser presa, acusada de colaborar em rede de lavagem de dinheiro no âmbito de “uma sofisticada operação para extrair fundos” da nação montada pelo ex-marido.
Um sobrinho de Moamar Kadafi, o ditador líbio despachado para o além em condições brutais, Mohamed Lashtar, hoje é embaixador da Nicarágua no Kuwait.
Mas nenhum deles tem a aura de Mario Firmenich, que se tornou símbolo da audácia e do idealismo dos jovens argentinos que abraçaram a luta armada e, ao mesmo tempo, das atrocidades que cometeram, propiciando deliberadamente o golpe militar que, em sua loucura, consideravam o predecessor de uma revolução popular.
O arco de assassinatos políticos e sequestros cometidos com a participação de Firmenich é quase inacreditável. Vai de Pedro Aramburu, que havia sido ditador militar (e o responsável pelo “desaparecimento” do corpo de Evita Perón) a José Ignacio Rucci, secretário-geral da CGT, a central sindical criada por Perón.
“Não fizemos nada para impedir (o golpe) porque ele também fazia parte das lutas internas do peronismo”, disse Firmenich sobre o fim trágico da volta de Perón, com o líder populista morto e sua viúva e vice, a ex-dançarina Isabelita Perón, deposta pelos militares. “Fizemos uma mudança de cálculos, cálculos de guerra, e nos preparamos para suportar, no primeiro ano, um número de perdas humanas não inferior a 1 500 baixas”.
A repressão foi muito maior, arrastando inocentes, familiares, crianças, tudo o que estivesse associado, certa ou erradamente, à luta armada.
Os horrores praticados pela ditadura foram exorcizados por comissões da verdade, julgamentos de militares e outras instâncias. As vítimas foram devidamente reconhecidas e homenageadas. Mas o papel da esquerda armada continua a ter áreas de sombra, com assassinatos e sequestros de inocentes relegados a um plano bem distante.
Firmenich foi preso no Brasil em 1984, a pedido da justiça da Argentina redemocratizada, extraditado, julgado e condenado a trinta anos de prisão, uma pena encerrada pelo indulto de Menem.
Poderia ter colocado sua inteligência excepcional a serviço de boas causas, mas preferiu emprestá-la à grotesca dupla Ortega/Murillo. Pelos oposicionistas que perderam a nacionalidade, em lugar da simpatia de um ex-exilado, só manifesta ódio.
Os nicaraguenses punidos certamente vão recuperar um dia o direito indiscutível à própria nacionalidade. Como é possível que Mario Firmenich não saiba disso?