O senhor Fox cai na armadilha da raposa
Ex-presidente mexicano fala o que quer e ouve o que não quer de Trump

Pobre Vicente Fox, o ex-presidente mexicano, que está tão longe de Deus e tão perto de Donald Trump. Ele sempre foi conhecido por ter um estilo algo destemperado – Fox, claro; Trump é inteiramente sem controle – e numa entrevista a Jorge Ramos, o mais conhecido entrevistador de origem mexicana da rede americana Univision, Fox soltou a língua. “Eu não vou pagar pela porcaria desse muro”, invectivou, usando em inglês uma palavra que começa com a letra F e geralmente acaba em briga. O tema era o muro que Trump propôs construir ao longo da imensa fronteira entre México e Estados Unidos para controlar a imigração ilegal. À provocação irrealizável, Trump ainda acrescenta que quem vai pagar a conta é o México. Daí o ataque de nervos de Fox.
Fox e Ramos, jornalista que resolveu comprar briga pessoal com Trump depois do que ele disse sobre mexicanos criminosos que entram nos Estados Unidos, também estavam abalados com o resultado da eleição primaria dos republicanos em Nevada, onde 44% dos hispânicos, a designação para quem tem origem latino-americana, haviam votado em Donald Trump. “Gostaria de saber quem são esses hispânicos? Estão seguindo um falso profeta”, indignou-se Fox, numa insinuação velada à grande comunidade de origem cubana que vive em Las Vegas.
“Ele é quem deveria pagar pelo muro. Ele tem dinheiro para isso”, reclamou Fox. O ex-presidente também fez uma análise correta de Trump ao dizer que ele “não é republicano; os republicanos não seguem esses princípios” – certo, pois basta ver o nível de oposição que o candidato bilionário recebe no próprio partido, ao qual na verdade nunca foi muito ligado.
Fox foi presidente do México de 2000 a 2006. Na época, sua eleição pelo Partido de Ação Nacional, o PAN, foi considerada histórica por quebrar a hegemonia do Partido Revolucionário Institucional, o eterno PRI, condutor da “ditadura perfeita”, na definição clássica de Mario Vargas Llosa – nesse departamento, coisas muito piores ainda aconteceriam na América Latina, mas nem o esplêndido escritor peruano tem dons proféticos.
As promessas de combate à corrupção feitas por Fox ficaram mais no campo das intenções. Alguma surpresa nisso? Depois que ele deixou a presidência, houve acusações de corrupção contra ele e a mulher. Alguma supresa nisso? A primeira mulher dele foi acusada, nos Estados Unidos, de participar de um esquema de lavagem de dinheiro chefiado por seu companheiro. O dinheiro vinha do tráfico de drogas e chegou a 500 milhões de dólares. Bem, aí até pelos padrões brasileiros existe um certo sentimento de surpresa.
Reposta de Trump à braveza de Fox: “O muro acaba de ficar três metros maior.” Raposa velha não deveria se meter nesse tipo de briga.