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O holandês agitador: Wilders se torna tão radical quanto inimigos

Líder de partido de “um homem só” se coloca contra toda a religião muçulmana; pode ser o mais votado no próximo dia 15, mas não leva

Por Vilma Gryzinski 24 fev 2017, 12h08

Como  Salman Rushdie, Geert Wilders vive sob proteção permanente do estado, mudando de casa em casa. Se algum dos planos para assassiná-lo der certo, sua morte seria comemorada em todo o mundo muçulmano. Ao contrário do escritor, Wilders nunca se livrará da sentença pendente. 

O incidente mais recente foi especialmente sinistro. Um segurança do serviço de proteção a autoridades que participava do esquema de proteção a Wilders foi detido, acusado de vazar informações sigilosas para uma organização criminosa. 

O segurança é uma de família de marroquinos, justamente os imigrantes mais criticados por Wilders. O líder do Partido da Liberdade foi recentemente condenado num processo por incitação ao ódio racial.

Defendeu-se em seu estilo, agressivo , preciso e convincente para a parcela do eleitorado holandês que se sente ameaçada em seu estilo de vida e em sua segurança pelo mesmo fenômeno que atinge outros países europeus: habitantes de origem muçulmana, às vezes de segunda ou até terceira geração, que não se integram ao novo país.

Na Holanda, isso se manifesta especialmente por altos índices de criminalidade – comparativamente, claro – entre jovens de origem marroquina. Mesmo atos de falta de civilidade, como lixo no chão e elevadores usados como banheiros, provocam enorme incômodo num país que demorou séculos para acomodar suas tensões internas, onde imperam ordem, limpeza e jardins aparentemente cultivados por gnomos dedicados. 

 Wilders raramente aparece em público e, por causa da suspeita sobre a segurança oficial, suspendeu os raros comícios. Nas pesquisas, ele aparece empatado ou um pouco à frente do partido do atual primeiro-ministro, Mark Rutte, de centro-direita, ambos na casa dos 25%.

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Se ganhar, dificilmente conseguirá formar a obrigatória coalizão que possibilita um governo funcional. Praticamente todos os partidos rejeitam uma aliança com Wilders. Ele já disse que ter perfeita consciência dos problemas criados por suas propostas extremistas, inclusive sua inviabilidade política, mas se considera imbuído de uma missão. “Se eu parar ou ficar mais moderado, aqueles que usam ou ameaçam usar a violência contra a democracia sairão ganhando”. 

De uma posição quase libertária, voltada especialmente para abusos cometidos contra mulheres e homossexuais com base em preceitos muçulmanos, e repressão aos pregadores do fundamentalismo, Wilders caminhou em direção a propostas absurdas, como proibir o Alcorão e fechar todas as mesquitas da Holanda. 

Três integrantes do seu partido já romperam com ele por causa dessa radicalização. Atribuem essa involução ao isolamento de Wilders, tanto ideológico quanto físico. Não discute propostas com o partido e faz campanha sozinha. Para sair de casa, que cada hora é num lugar diferente, Wilders precisa de um veiculo blindado da policia e vários seguranças.

 Seu gabinete no Parlamento fica no canto mais isolado, no fim de um corredor sob constante vigilância. Usa colete a prova de balas e, geralmente, só se encontra com a mulher, a ex-diplomata húngara Krisztina Marfai, uma vez por semana.

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Pessoas mais próximas falam de um homem simpático e engraçado, que usa a inteligência brilhante com humor e gentileza. 

Apesar do estilo individualista, Wilders se alinhou com a extrema-direita populista da França e da Alemanha. A questão nem existia para ele no começo, mas hoje faz campanha contra a União Europeia e os programas de austeridade, que implicam em cortes de benefícios insustentáveis que fizeram da Holanda um dos modelos do estado de bem-estar social.

Parte dos novos eleitores de Wilders está mais interessada, nada estranhamente, em preservar aposentadorias e serviços de atendimento a idosos. 

Geert Wilders entrou na política mais como uma figura exótica, um homem alto e bonito que chamava atenção pelos cabelos descoloridos – uma brincadeira de juventude – e das ideias ousadas para uma sociedade em que a mais remota crítica a políticas de imigração era tratada como manifestação insuportável de discriminação. 

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Apaixonadamente pró-Israel, onde passou temporadas na juventude trabalhando em fazendas coletivas, Wilders seria um personagem estranho para a extrema-direita europeia, marcada pelo anti-semitismo.

Isso se a esquerda anti-Israel não tivesse se tornado desequilibrada a ponto de tentar escavar uma bisavó judia para atacar Wilders, como se houvesse desonra no fato presumido. Como a família dele, por parte de mãe, é de holandeses da época do domínio colonial na Indonésia adversários de Wilders, tolamente, também procuram uma antepassada “nativa” em sua árvore genealógica e atribuem os cabelos tingidos de loiro a um esforço de “branqueamento”. 

A guinada que aproximou Wilders do radicalismo começou com um estrondoso assassinato político, em 2004. Theo Van Gogh foi abatido a tiros, quase decapitado a faca e teve um punhal cravado no coração, com um bilhete que o acusava de blasfêmia por ter feito um filme de dez minutos chamado Submissão, mostrando quatro casos extremos de mulheres maltratadas em nome de princípios da religião muçulmana. O assassino era de origem marroquina. 

Geert Wilders, na época deputado independente, pediu uma suspensão temporária de imigração para que a Holanda, excessivamente “tolerante com a intolerância”, parasse de “importar uma sociedade atrasada”. 

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O debate só se radicalizou desde então, fechando portas a argumentos menos maniqueístas. À esquerda, todos os males são atribuídos a obstáculos à  integração, à falta de oportunidades e ao preconceito inerente contra estrangeiros. A direita ao estilo Wilders aponta os próprios fundamentos da religião islâmica como fonte de todos os males. 

“O Islã é incompatível com a liberdade”, disse ele numa entrevista esta semana ao jornal USA Today. “Isso pode ser constatado em quase todos os países onde ele predomina. Existe total ausência de liberdade, de sociedade civil, de estado de direito, de classe média. Jornalistas, gays, apóstatas, todos têm problemas. E é isso que nós importamos”. 

Infelizmente, ele não está inteiramente errado. E o país que mais poderia desmentir Wilders, a Turquia, cada vez mais vê desaparecer todas as instituições mencionadas sob uma onda de autoritarismo de inspiração islâmica . 

É claro que Wilders erra estrondosamente ao propor medidas como o fechamento das mesquitas, que contrariam o cerne das liberdades que pretende defender. 

“Nada vai parar o processo da primavera patriótica”, promete Wilders, explorando o veio de insatisfação que alimenta o populismo de direita na Europa e nos Estados Unidos. Curiosamente, usa um termo que ficou conhecido recentemente por causa de protestos em massa e mudanças políticas em países muçulmanos, a  “primavera árabe”. Como sempre, os extremos se atraem.

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