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Novo plano contra Trump: desequilibrado que pode prejudicar Ucrânia

Homem que levou Kalashnikov a 400 metros do ex-presidente era um fanático pela causa ucraniana, do tipo que ninguém quer por perto

Por Vilma Gryzinski 17 set 2024, 06h44

Como o Coringa, Ryan Wesley Routh deu risada na primeira audiência para ouvir as acusações contra ele. Também tem seu histórico de absurdos: queria levar ex-soldados afegãos treinados pelos Estados Unidos para lutar na resistência ucraniana à invasão russa. Dizia que conseguiria aviões que os transportassem até a Polônia e, com subornos nos lugares certos, conseguiria colocá-los na Ucrânia.

Os verdadeiros integrantes da legião de estrangeiros que lutam pela Ucrânia achavam que era um desequilibrado a ser evitado. Depois que agentes do Serviço Secreto atiraram contra ele ao ver o cano de uma arma num matagal, atrás de uma cerca de arame, a apenas 400 metros de onde Trump jogava golfe em seu clube na Flórida, o homem de 58 anos está sob investigação oficial por tentativa de assassinato.

Passou doze horas na campana no local onde o Serviço Secreto o avistou, ao que tudo indica aguardando seu alvo. Como ele sabia que Trump passaria por ali?

“Ouvimos tiros. Eles me pegaram e me tiraram muito bem”, contou Trump, elogiando a forma como um agente do Serviço Secreto conseguiu ver o cano da arma de Routh no meio da vegetação.

Routh conseguiu escapar depois de ser localizado e só foi preso mais tarde, por agentes da polícia da Flórida, em cenas impressionantes capturadas por câmeras corporais.

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As acusações, por enquanto, se referem ao uso irregular de armas, uma por ter uma Kalachnikov com o número raspado, o fuzil que usou no clube de golfe, e outra por ser criminoso condenado, devido a um confronto com a polícia em 2002, e portanto proibido de andar armado.

ENGANOU O TIMES

É mais um maluco exibicionista ou realmente chegou bem perto de atingir Trump, na segunda tentativa de matar o ex-presidente em dois meses? Ou talvez uma mistura de ambos?

Uma coisa parece clara: não é um fabulista comum, o tipo que inventa histórias para exaltar a si mesmo. Chegou a ser entrevistado pelo New York Times, um jornal com uma enorme equipe de checadores e que tem nada menos do que 1,7 mil jornalistas altamente formados na sua equipe. Sem nenhuma autoridade intelectual ou política, afirmou que iria participar de uma conferência sobre a Ucrânia com a Comissão de Helsinque, um órgão ligado a questões de segurança e cooperação entre Estados Unidos e Europa.

Como conseguiu enganar o jornal mais conhecido do mundo?

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Essa é mais uma dúvida que se soma às dúvidas, espantosas, sobre o autor do primeiro atentado, um caso que está sendo investigado pelo FBI, pelo Serviço Secreto e por uma comissão do Congresso, mas continua com perguntas vitais ainda sem resposta.

Qual a motivação de Routh é uma das questões mais importantes a ser investigada. Estaria “decepcionado” com Trump por causa da Ucrânia? Se o país for envolvido, mais uma vez, numa questão interna dos Estados Unidos as consequências podem ser muito negativas.

MÚSICA PARA O KREMLIN

Uma ala da direita trumpista resolveu endossar, muito equivocadamente, todos os argumentos plantados pela Rússia contra a Ucrânia: os Estados Unidos não deveriam interferir, através da ajuda militar em massa, numa questão regional, dizem. O governo de Volodymyr Zelensky só sabe tirar dinheiro dos contribuintes americanos, acusam. E o potencial de um envolvimento direto dos Estados Unidos pode conduzir a uma Terceira Guerra Mundial, ameaçam.

Tudo música para os simpatizantes do Kremlin, hoje uma bizarra mistura de esquerdistas à moda antiga e de trumpistas à moda moderna, que ignoram os altos interesses do mundo ocidental em impedir a abominação russa na Ucrânia, um perigo enorme para o arcabouço criado pelos Estados Unidos, com os aliados europeus, depois da II Guerra Mundial.

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Se um simpatizante da causa ucraniana, mesmo que um maluco – uma forma de expressão, nada sabemos com certeza sobre sua saúde mental – com planos mirabolantes como Ryan Wesley Routh, tiver como pretexto a questão ucraniana para um atentado contra Trump, essa turma sai ganhando.

Ainda não dá para traçar um retrato definitivo do potencial assassino, que havia mudado para o Havaí e tinha um pequeno negócio de construção de depósitos de materiais em residências, o quartinho, como dizemos no Brasil. Já foram levantadas 19 doações de pequenas quantias em benefício de candidatos de esquerda, como Elizabeth Warren e Andrew Yang. Também está na lista a ex-deputada Tulsi Gabbard, uma das mais renitentes defensoras da causa contra a Ucrânia. Mas há também tuítes em que ele chama a ex-deputada de “idiota” e diz que ela deveria unir forças com Trump e Vladimir Putin.

Pelo menos Routh tem um histórico digital, mesmo que contraditório. “Parece que o psicopata passa muito tempo assistindo propaganda de esquerda”, tuitou Donald Trump Jr.

CREMAÇÃO PRECIPITADA

Ao contrário da incrível “ausência digital” de Thomas Matthew Crooks que por uma questão de centímetros não matou Trump em 13 de julho, durante o comício na arena do centro de feiras agrícolas em Butler, na Pensilvânia. Também não há nenhuma avaliação concreta até agora sobre seu estado mental.

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A incrível sequência de erros cometidos pelo Serviço Secreto, que deu tempo a Crooks para fazer oito disparos contra Trump, pegando de raspão na orelha do ex-presidente e atingindo três espectadores do comício, com um deles morto, ainda estarrece quem procura respostas. As duas explicações são de arrepiar: negligência extrema do Serviço Secreto ou, livrem-nos os céus, descaso proposital.

Como o jovem de 20 anos conseguiu subir no telhado de um prédio que dava uma linha de fogo direta contra Trump? Como pessoas do público viram e avisaram que havia um homem correndo pelo telhado sem que houvesse uma intervenção a tempo?

Como foi autorizada a precipitada cremação do corpo, dez dias depois que Crooks foi neutralizado por um atirador de elite, num caso em que obviamente poderia haver dúvidas sobre a necrópsia e o certo seria não permitir a eliminação de um elemento importante como o corpo do assassino para futuras investigações?

PERIGO DOS IMITADORES

Duas tentativas de assassinato em dois meses abrem ainda a pior das perspectivas: a de que surjam mais “imitadores”, chamados em inglês de “copycats”, desequilibrados que querem seguir os passos dos antecessores e conseguir o que não conseguiram, o prêmio máximo para esse tipo de psicopata, matar Trump.

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É um processo parecido com o dos atiradores em massa que despertam os desejos assassinos de seguidores que sonham imitá-los.

O fato de que Routh tenha chegado tão perto de Trump também provocou uma nova tempestade de críticas ao Serviço Secreto, embora o ex-presidente tenha agradecido aos patrióticos agentes que o protegeram e pelo “incrível trabalho” que fizeram.

Seja qual for a avaliação da segurança dele, as teorias conspiracionistas que pareciam tão completamente absurdas até bem pouco tempo atrás vão ficando cada vez menos exóticas.

O que está acontecendo com a segurança do candidato republicano e como tem ficado tão fácil furá-la são questões que afetam todos os Estados Unidos – e, por consequência, o mundo.

“AUTORIZAÇÃO PARA MATAR”

Imaginem a desordem e a revolta que um assassinato assim a menos de 50 dias da eleição para presidente, provocaria. “A retórica deles está fazendo com que atirem em mim”, afirmou Trump, referindo-se aos democratas, uma instrumentalização errada dos acontecimentos, embora seja incontestável que o nível de linguagem agressiva na política é quebrado todos os dias pelos dois lados.

O próprio Routh escreveu num livro digital que era um dos responsáveis “pela criança retardada que elegemos presidente” e o Irã deveria ”se sentir livre” para matá-lo pela ruptura do acordo nuclear, em 2018. Em outras palavras, em sua imaginação, estava dando uma autorização para o assassinato do presidente, uma loucura em si mesmo. Atualização: integrantes dos serviços de inteligência comunicaram recentemente à campanha de Trump que o Irã tem planos de escalar ataques contra o ex-presidente e familiares dele.

Logo depois da prisão de Routh, Trump fez uma jogada de mestre. “Certamente foi um dia interessante!”, postou, coerente com o papel de imorrível que não procurou, mas recaiu sobre ele desde o atentado na Pensilvânia, como o mais improvável dos heróis.

Imaginem quanto Coringas estão pensando em provar que está errado.

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