Israelenses não querem nem ouvir falar na solução dos dois estados
E palestinos aumentam o apoio ao Hamas, que não quer estado nenhum, mas um califado, enquanto Estados Unidos insistem na fórmula
“Uma solução de dois estados depois do 7 de outubro seria um prêmio para o Hamas”. Assim resumiu uma fonte do governo para o site Times of Israel a posição que não é apenas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, mas de todas as principais forças política, inclusive de esquerda. “Netanyahu é quem diz isso em voz alta e direta, mas não existe nenhum apetite em todo o espectro político pela ideia dos dois estados”, acrescentou.
O presidente Isaac Herzog, praticamente desprovido de qualquer poder, mas investido de força moral que o transformou numa espécie de porta-voz da nação pela veemência com que denuncia as atrocidades do Hamas, explicou por que o assunto deveria ser evitado no momento. “Existe um capítulo emocional aqui que precisa ser tratado. Meu país está de luto. Meu país está traumatizado. Para voltar à ideia de dividir a terra, negociar a paz ou conversar com os palestinos, primeiro, e acima de tudo, é preciso tratar o trauma nacional que estamos vivendo e e a necessidade de uma plena sensação de segurança para as pessoas”, disse em entrevista à AP.
Herzog é um trabalhista histórico, de centro-esquerda, uma posição mais ou menos parecida com a do líder da oposição, Yair Lapid. O mais ácido crítico de Netanyahu tem evitado a expressão “dois estados”, uma alternativa que ele apoiava antes do 7 de outubro. Benny Gantz, o único oposicionista que entrou para o governo de emergência nacional, disse que “velhos conceitos” precisam mudar.
Chance zero
Para esclarecer: a solução dos dois estados, que parece tão justa e necessária, significaria um país independente que poderia, como aconteceu com Gaza em 2007, cair nas mãos do Hamas a qualquer momento.
Netanyahu acrescenta que mesmo a Autoridade Palestina, hoje responsável pela autonomia controlada da Cisjordânia, não seria aceitável. “O Hamas quer nos matar de uma vez só, a AP quer fazer isso aos poucos”, afirmou recentemente. Ele também já declarou “ter orgulho” de seu bloqueio à solução dos dois estados: “Todo mundo agora entende no que um estado palestino poderia ter se transformado, agora que vimos o pequeno estado palestino em Gaza”.
Para dar uma ideia de como o país apoia maciçamente a guerra em Gaza, mesmo com perdas de vidas dos soldados e episódios arrasadores como a morte, por engano de forças israelenses, de três reféns: apenas 10% da população de Israel acha que está havendo um uso excessivo da força.
O governo americano persiste com a versão oposta. Joe Biden chegou a falar que Israel ‘bombardeia indiscriminadamente” alvos em Gaza – o que não é verdade. Todos seus subordinados também insistem em dizer que uma Autoridade Palestina “revigorada” ou “revitalizada” deveria assumir a administração de Gaza depois da guerra, uma alternativa que parece francamente fantasiosa. E, claro, a solução dos dois estados é continuamente mencionada.
Dia seguinte
Insistir numa alternativa que, infelizmente, tem chances zero até onde a visão alcança obedece à necessidade de acalmar os aliados árabes dos Estados Unidos, como Egito, Jordânia, Emirados e Arábia Saudita, e também a opinião pública americana, principalmente democrata. Até entre os próprios funcionários do Departamento de Estado e da Casa Branca crescem os apelos por um cessar-fogo, o qual beneficiaria o Hamas.
Sobre o “dia seguinte”, continuam a reverberar os resultados de uma pesquisa entre palestinos da Cisjordânia e de Gaza indicando um aumento do apoio ao Hamas, maior no primeiro território e relativamente menor, mas ainda importante, no segundo, que está pagando o preço terrível da guerra desencadeada pelos islamistas radicais.
Segundo a pesquisa, 75% da população da Cisjordânia e 38% dos habitantes de Gaza preferem que o Hamas continue no comando do território depois da guerra. Apenas 16% optaram pela Autoridade Palestina. A figura mais rejeitada de todas é do quase nonagenário Mahmoud Abbas, o presidente da AP: 90% dos palestinos prefeririam que ele renunciasse.
É nessa pesquisa que 85% dos palestinos da Cisjordânia e 52% de Gaza aprovam o comportamento do Hamas. Apenas 7% acreditam que a organização islamista cometeu as atrocidades amplamente documentadas.
Risco existencial
Pesquisas feitas no ápice de conflitos anteriores demonstram radicalização similar. Ocorre que dessa vez a realidade mudou, segundo a opinião quase unânime dos israelenses. A barbárie dos crimes cometidos em 7 de outubro e a possibilidade de que venham a se repetir se o Hamas não for “esmagado”, segundo a promessa do governo israelense, criaram um risco existencial para Israel.
A solução dos dois estados, que já era altamente improvável, se tornou, realisticamente, impossível. Equivocadamente, muitos acham que é só “trocar” Netanyahu por um governo menos à direita e, por mágica, o fim da intervenção em Gaza e uma solução negociada para a Palestina, em troca do reconhecimento da Arábia Saudita e outras vantagens para Israel, seriam possíveis. As manifestações recentes em todo o espectro político mostram que isso não vai acontecer, mesmo com o Hamas derrotado.
Por sua vez, o movimento fundamentalista não quer solução nenhuma, nem um nem dois estados. Fathi Hammad, da direção da organização, deu uma entrevista à televisão do Hamas dizendo que em breve será estabelecido um califado islâmico, a forma mais radical de governo islamista, com Jerusalém como sua capital. E, obviamente, sem judeus.
Ele também insuflou os integrantes dos serviços de segurança da Autoridade Palestina a “agir como homens de verdade” e se rebelar contra Mahmoud Abbas.
Os Estados Unidos, como hiperpotência, podem fazer muita coisa, mas esta é uma realidade sobre a qual têm pouco poder de interferência: nenhuma das partes envolvidas quer saber, hoje, da solução que os americanos defendem.
Otávio Augusto volta a falar sobre Grazi Massafera: ‘Não tem sentido’
LDU x Palmeiras na Libertadores: onde assistir, horário e escalações
Flamengo x Racing na Libertadores: onde assistir, horário e escalações
INSS alerta risco a serviços e pagamento de benefícios após bloqueio de verbas pelo governo Lula
Melhores bases do mundo tem quatro clubes do Brasil no top 20; confira lista

