Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Imagem Blog

Mundialista

Por Vilma Gryzinski Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Se está no mapa, é interessante. Notícias comentadas sobre países, povos e personagens que interessam a participantes curiosos da comunidade global. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Genocídio incontestável: única palavra que define massacre dos armênios

Mais de cem anos já se passaram, mas a Turquia ainda se revolta quando a palavra é usada para descrever o que aconteceu com população armênia

Por Vilma Gryzinski 28 abr 2021, 08h29

Joe Biden fez muito bem em usar a palavra genocídio para classificar os crimes inomináveis cometidos pela Turquia, num momento histórico de enormes mudanças, contra os armênios, uma minoria cristã que vivia principalmente na região da Anatólia Oriental.

A palavra genocídio ainda nem existia quando começaram as campanhas de deportação em massa através de marchas forçadas para fora do país, sob a acusação de que os armênios eram colaboradores da Rússia, a potência protetora dos cristãos ortodoxos, ela própria perto de entrar no grande abismo da revolução e dos massacres em massa.

Foi o judeu polonês Raphael Lemkin quem cunhou a palavra para definir o extermínio em massa de todo um povo promovido pela Alemanha nazista que ficou conhecido como Holocausto.

Mas o uso sistemático da violência para eliminar um povo inteiro é a única maneira de tentar entender o que foram as atrocidades coordenadas e sistematizadas para varrer os armênios não só do mapa da Turquia como da face da Terra.

Pelo menos 1,5 milhão de pessoas, civis arrancados de suas casas e privados de qualquer propriedade, foram obrigados a marchar em direção ao deserto da Síria, sem comida nem água, em condições atrozes, com o objetivo específico de que morressem no caminho.

As histórias são muito parecidas com as que viriam a acontecer entre os judeus da Polônia ocupada pelos nazistas ou entre os tutsis de Ruanda. Civis impotentes sendo massacrados em série, fuzilados, enforcados, violentados e obrigados a uma longa marcha de horrores. 

Continua após a publicidade

Num dos episódios mais lancinantes, um comandante curdo exasperou-se com as crianças que teimavam em sobreviver ao martírio, tendo espantosamente chegado a pé até a Síria. Mandou encher um navio com elas, soltar a âncora e incendiar a embarcação.

Os executores do genocídio eram curdos, minoria étnica muçulmana que até hoje procura sua própria independência na Turquia e países vizinhos.

As ordens vinham de cima e eram incontestáveis. O ápice do genocídio dos armênios foi em 1915, quando a Turquia estava na transição entre o poderoso mas já alquebrado império otomano e a república laica que seria criada em 1923 e absurdamente envolvida do lado alemão na I Guerra Mundial. O processo se prolongou por anos.

Mesmo no caos que mudaria o mapa da Europa, as atrocidades contra os armênios levaram potências navais europeias a mandar navios tentando resgatar os refugiados que conseguissem chegar até as linhas costeiras. Frequentemente, eram estraçalhados a tiros de canhões turcos quando pareciam estar tão perto da salvação.

Continua após a publicidade

Depois da guerra, a Turquia encolheu e virou um país nominalmente laico, sob o comando férreo de Kamal Ataturk, que modernizou o país na marra. Muitos governos se sucederam depois e hoje o presidente Recep Tayyp Erdogan é um islamista mal disfarçado, que abomina o modelo de república laica.

Em comum entre todas as diferentes correntes política e religiosas existe a violenta rejeição a que sequer seja usada a palavra genocídio para definir o que aconteceu com os armênios há mais de um século.

Erdogan tem uma grande caixa de ferramentas para chantagear os países que ousam dar nome aos bois. A Turquia foi um aliado vital da aliança atlântica, a OTAN, na época da guerra fria com a União Soviética. 

Continua a ocupar uma posição estratégica e a insinuar alianças com o Irã e a Síria. Tem ainda uma poderosa bomba humana: os mais de dois milhões de refugiados da guerra civil síria em seu território. Volta e meia, ameaça a Europa Ocidental com mais uma crise de refugiados se suas vontades não forem atendidas.

Continua após a publicidade

Quantas pessoas morreram no holocausto armênio? Os próprios armênios fecham com o número de 1,5 milhão. A Turquia diz que foram 300 mil. Uma associação internacional de especialistas em genocídio, a IAGS, considera que houve “mais de um milhão” de mortes.

Durante gerações, os armênios que se espalharam pelo Oriente Médio, a Europa, os Estados Unidos e o Brasil mantiveram viva a memória de uma das maiores monstruosidades da história humana. Os mortos inocentes merecem ser lembrados. 

Usar a palavra genocídio para descrever o que sofreram não deve ser de forma alguma uma maneira de ofender as gerações atuais de turcos ou macular o orgulho nacional. Idealmente, a atrocidade dos antepassados deveria ser reconhecida, aceita e lamentada como um fato histórico doloroso. 

Como estamos muito longe do ideal, é bom que os Estados Unidos tenham reconhecido uma realidade já incorporada oficialmente por países como França, Alemanha, Canadá e o próprio Brasil. 

Continua após a publicidade

Depois de reclamar muito, como está fazendo agora com os Estados Unidos, o reconhecimento do genocídio é assimilado e a história some do mapa. Inclusive porque ninguém fala em indenizações, como no caso do extermínio dos judeus europeus.

Até que ressurja em outras circunstâncias. A terrível e maligna sombra do genocídio cujo nome os turcos se recusam a dizer não vai desaparecer facilmente.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.