A certeza de mais sanções: Trump só tem que escolher o ritmo do castigo
Brasil e Venezuela são os dois problemas no colo do presidente americano – e ele acha que vai ter uma solução dura para ambos

Donald Trump vai escalar a crise com o Brasil até chegar à ruptura? Não é impossível, basta olhar como tem conduzido a crise nas relações bilaterais. Não é preciso nem ler a reportagem do Financial Times citando uma fonte da Casa Branca sobre o “menu de opções” para o presidente escolher como reagirá à condenação de Jair Bolsonaro.
Tudo o que ele fez até agora indica uma escalada bem planejada, sem nada do voluntarismo frequentemente associado ao presidente. Da mesma forma como todos sabem qual será o resultado do julgamento, independentemente dos argumentos da defesa, também dá para concluir que Trump assumiu a briga por Bolsonaro.
A senadora Teresa Cristina, ministra da Agricultura no governo anterior, fez um relato simples e valioso sobre o que ouviu em visita aos Estados Unidos, em entrevista à Folha de S. Paulo. Vale ouvi-la de novo: “A gente achava que a parte política existia, mas não era tão forte e tão ligada à parte comercial, mas ela é. Por onde nós conversamos, diziam o seguinte: que o presidente Trump se vê na mesma condição em que hoje está o presidente Bolsonaro, de perseguido.”
Por envolver aspectos de identificação pessoal, o conflito bilateral tem poucas possibilidades de que Trump se desinteresse pelo assunto e que resolva deixar para lá ou mesmo atender aos apelos dos importadores americanos de produtos brasileiros, os primeiros prejudicados pelo aumento de tarifas.
‘POVO MARAVILHOSO’
O Brasil é um adversário com cartas fracas na mão, com apenas pouco mais de 2% do total das importações feitas pelos Estados Unidos e uma presença externa irrelevante. O fato de que a popularidade do presidente Lula da Silva tenha se beneficiado ligeiramente da narrativa de defensor da soberania brasileira também tem pouca influência sobre Trump – ou talvez o influencie pelo lado contrário, de aumentar sua bronca.
Sob esta ótica, o “maravilhoso povo do Brasil”, como já disse o presidente americano, parece menos maravilhoso e mais merecedor de um castigo.
Não ajuda em nada a alucinação coletiva que levou a deputada Jandira Feghali, do PCdoB, a dizer que o Brasil “está dando lição ao mundo” (com o acréscimo de que “os Estados Unidos nem justiça eleitoral têm”), uma versão da visão colonialista da reportagem de capa da Economist, a revista tão brilhante em vários aspectos, mas com uma tradição firmada de sempre errar nas reportagens sobre o Brasil.
(Por que colonialista? Se um tribunal fizesse na Inglaterra um décimo das arbitrariedades que estão sendo feitas aqui, os ingleses se alçariam em rebelião. Mas como é para esse fim de mundo…).
Para a diplomacia americana tradicional, não seria bom alienar o Brasil, ainda mais no momento em que Lula se beneficia do bonezinho nacionalista e Nicolás Maduro promete “resistência” aos imperialistas malvados, que nem fizeram nada fora mandar um contingente naval para águas caribenhas. Ah sim, explodiram uma lancha aparentemente do crime, com onze traficantes dentro. É uma amostra de como a situação vai escalar.
VÍRUS DO NACIONALISMO
Já sabemos que Trump não é convencional e provavelmente acha que pode muito bem administrar a dupla crise na América do Sul. Quanto mais Maduro surta, mais a situação piora para o lado dele piora. “Oito barcos de guerra, 1,2 mil mísseis e um submarino nuclear apontam contra a Venezuela. Isto constitui a ameaça máxima para a América Latina em sua história”, foi a última maluquice madurista.
Maduro tem interesse máximo em transformar o problema venezuelano em questão que envolve toda a América Latina.
O Brasil teria interesse máximo em se descolar de suas maluquices, exercer todo o autocontrole possível no relacionamento com os Estados Unidos e não complicar uma relação já altamente inflamada.
Mas o vírus do nacionalismo é altamente contagioso e traz resultados imediatos nas pesquisas. Combine-se isso a juízes que fazem discursos políticos inflamados com teor salvacionista e a um Trump pessoalmente identificado com o destino de Bolsonaro, sem nenhuma consideração pelas regras tradicionais do jogo, e está armada uma deterioração crescente. E, obviamente, perigosa.
Sem contar que os três líderes aqui mencionados usam boné, um mau indicador.