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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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Prefeitos exigem participação em repactuação de Mariana

Carta aberta critica tentativa da mineradora de impedir litígios internacionais e defende inclusão dos atingidos nas negociações

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 31 jul 2024, 08h52 - Publicado em 30 jul 2024, 18h07

Prefeitos da Bacia do Rio Doce divulgaram carta pública nesta terça-feira, 30, solicitando ao Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6) maior representação nas reuniões de repactuação de Mariana – previstas para 6, 7 e 8 de agosto, em Brasília. A demanda surge em meio a preocupações crescentes sobre a falta de inclusão dos atingidos nas tratativas e a recente exposição das ações da BHP para impedir que municípios brasileiros busquem justiça em tribunais estrangeiros.

O documento do Fórum Permanente de Prefeitos da Bacia do Rio Doce pede a participação de quatro integrantes do Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (Coridoce) nas reuniões de repactuação. “É lamentável que as tratativas seguem sendo realizadas sem a participação direta ou a representação constituída pelos atingidos, o que certamente haverá de comprometer a própria legitimidade de todo e qualquer pacto que porventura possa vir a ser celebrado em tais condições”, afirma a carta.

Além disso, os prefeitos criticaram os valores discutidos na repactuação, afirmando que estão muito aquém do necessário para ressarcir os prejuízos causados pelo rompimento da barragem do Fundão, ocorrido em 2015.

Frente aos valores baixos, esses prefeitos enfatizam a importância de continuar a ação judicial contra a BHP em andamento na Inglaterra, com indenizações avaliadas em R$ 230 bilhões e julgamento marcado para outubro. A carta chama a atenção, ainda, para as recentes investidas contra os municípios por parte mineradoras, que tentam obstruir o processo inglês e “assumidamente inviabilizar qualquer decisão que possa fornecer ou sugerir parâmetros indenizatórios minimamente adequados às vítimas do desastre de Mariana”.

O documento cita a ação movida em junho pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) no Supremo Tribunal Federal, questionando a possibilidade de prefeituras brasileiras participarem de litígios no exterior, com o argumento de defender a soberania nacional. “Valendo-se de uma visão autoritária que nega a autonomia dos entes Municipais e que os rebaixa a entes de terceira categoria – por se sustentar que não lhes seria permitido, ao contrário de todas as outras pessoas físicas e jurídicas brasileiras, buscar no exterior a responsabilização por danos praticados por empresas estrangeiras”, criticam os prefeitos.

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Nessa semana, uma ordem judicial da Corte inglesa foi assinada pela BHP, proibindo a empresa, suas subsidiárias ou agentes de continuar ajudando o Ibram em sua ação. A ordem estipula que, se a BHP não cumprir com o estipulado, enfrentará sérias consequências criminais, como prisão para seus diretores e congelamento de ativos. A BHP chegou a admitir que financiou o processo do Ibram em R$6 milhões, reforçando as acusações de que a empresa estava tentando impedir que os municípios continuassem suas reivindicações na Inglaterra.

A carta descreve a ação do Ibram no STF e o financiamento da BHP como “estarrecedor e imoral”. “Tudo para não pagar o que deve ao povo brasileiro e aos seus Municípios, impedindo que os verdadeiros atingidos sejam ouvidos em seu próprio país sobre o valor que entendem como justo para a reparação que lhes é devida e, ironicamente, invocando a defesa da ‘soberania brasileira’. A verdadeira soberania nacional reside na justiça para o povo brasileiro, não na proteção dos interesses de corporações estrangeiras”, argumenta o texto.

Os prefeitos concluem a carta pedindo a inclusão dos atingidos nas negociações de repactuação e o fim das medidas intimidatórias da BHP. “A presença, em igualdade de condições de diálogo e deliberação, de todos os entes federativos atingidos pelo desastre (União, Estados e Municípios), dos órgãos que institucionalmente defendem os interesses sociais difusos, bem como ainda, das próprias pessoas diretamente atingidas, é algo moralmente indispensável”.

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Leia a íntegra da carta:

CARTA ABERTA À POPULAÇÃO
Mariana, 30 de julho de 2024.
Os representantes do Fórum Permanente de Prefeitos da Bacia do Rio Doce,
através do Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (CORIDOCE),
vêm, a público, informar que solicitou ao TRF-6 a participação de 4 (quatro)
membros do CORIDOCE nas reuniões de Repactuação do Caso Mariana, previstas
para acontecer nos dias 6, 7 e 8 de agosto, em Brasília.
Tomamos conhecimento, através da imprensa, de que, nesta nova rodada de
reuniões, poderão ser definidos os termos finais de um eventual acordo a ser
celebrado entre a União, os Governos estaduais e as mineradoras.
É lamentável que as tratativas seguem sendo realizadas sem a participação direta
ou a representação constituída pelos atingidos, o que certamente haverá de
comprometer a própria legitimidade de todo e qualquer pacto que porventura
possa vir a ser celebrado em tais condições.
Diante disso, expomos a urgência da inclusão dos Municípios e de representantes
dos atingidos, que diariamente sofrem com as consequências do rompimento da
barragem e reiteramos os seguintes pontos:
1. Sabemos também que os valores que estão sendo discutidos nessa
repactuação estão muito aquém do mínimo necessário para o devido
ressarcimento dos prejuízos causados pelo rompimento da barragem.
2. Entendemos que em um Estado Democrático de Direito acordos
indenizatórios que envolvem reparações que atingem parcelas
expressivas da sociedade devem ser realizados de forma transparente e
devem contar com a efetiva participação dos atingidos.
3. Enquanto seguimos clamando para sermos ouvidos e motivados pelo
desejo de reparação em quaisquer tratativas indenizatórias, nós
prefeitos e centenas de milhares de vítimas dessa tragédia, optamos por
recorrer também a cortes estrangeiras, por meio de uma Ação judicial
na Inglaterra contra a empresa multinacional BHP, uma das mineradoras
responsáveis pelo desastre. Esta ação, tendo reconhecida a competência
CONSÓRCIO PÚBLICO PARA DEFESA E REVITALIZAÇÃO DO RIO DOCE – CORIDOCE
CNPJ 45.421.031/0001-54 – Pça. Juscelino Kubitschek, 134 Sl.001 Centro – 35420-003 Mariana-MG
das Cortes jurisdicionais inglesas para a sua apreciação, tem o seu
julgamento marcado para o mês de outubro.
4. Porém, em face da proximidade do julgamento e da possibilidade de que
possam vir a ser condenadas em um valor indenizatório muito superior
ao que pretendem pagar em uma repactuação no Brasil, as mineradoras
responsáveis pelo dano vêm tomando um conjunto de iniciativas para
intimidar ou assumidamente inviabilizar qualquer decisão que possa
fornecer ou sugerir parâmetros indenizatórios minimamente adequados
às vítimas do desastre de Mariana.
5. Nesse contexto, uma dessas iniciativas foi a propositura da ADPF Nº 1178
junto ao STF, com o objetivo de inviabilizar a possibilidade de Municípios
brasileiros receberem indenizações. Valendo-se de uma visão autoritária
que nega a autonomia dos entes Municipais e que os rebaixa a entes de
terceira categoria – por se sustentar que não lhes seria permitido, ao
contrário de todas as outras pessoas físicas e jurídicas brasileiras, buscar no
exterior a responsabilização por danos praticados por empresas
estrangeiras-, pretendem apenas atender a interesses espúrios movidos
pela ganância daqueles que julgam que a globalização é boa para
remeter seus lucros para seus acionistas estrangeiros, mas que é
péssima para honrar com a violação de direitos humanos.
6. Ocorre que, agora, acabaram vindo à tona os reais interesses que
motivaram a aludida ADPF em que se utiliza como pretexto a “soberania
nacional” para que brasileiros não sejam indenizados por uma poderosa
multinacional. Esta ação foi proposta pelo IBRAM, por solicitação e
pagamento – pasme-se – de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais). Ou
seja: uma entidade brasileira agiu, a soldo estrangeiro, para inibir que
brasileiros e brasileiras sejam ressarcidos, em valores justos, por um
dano que ceifou e destruiu suas vidas.
7. É estarrecedor e imoral que o Judiciário brasileiro seja utilizado dessa
maneira escandalosa por uma multinacional estrangeira que
instrumentalizou e pagou um preposto brasileiro para dissimuladamente
atuar processualmente em seu nome.
8. Tudo para não pagar o que deve ao povo brasileiro e aos seus Municípios,
impedindo que os verdadeiros atingidos sejam ouvidos em seu próprio país
sobre o valor que entendem como justo para a reparação que lhes é devida
e, ironicamente, invocando a defesa da “soberania brasileira”. A verdadeira
soberania nacional reside na justiça para o povo brasileiro, não na
proteção dos interesses de corporações estrangeiras.
CONSÓRCIO PÚBLICO PARA DEFESA E REVITALIZAÇÃO DO RIO DOCE – CORIDOCE
CNPJ 45.421.031/0001-54 – Pça. Juscelino Kubitschek, 134 Sl.001 Centro – 35420-003 Mariana-MG
Por fim, resta dizer que a presença, em igualdade de condições de diálogo e
deliberação, de todos os entes federativos atingidos pelo desastre (União, Estados e
Municípios), dos órgãos que institucionalmente defendem os interesses sociais
difusos, bem como ainda, das próprias pessoas diretamente atingidas, é algo
moralmente indispensável.
Nesse sentido, o CORIDOCE e os Municípios que o integram, pedem:
I- a impossibilidade de que quaisquer negociações sejam concluídas sem que
os atingidos pelo desastre do rompimento da barragem do Fundão sejam
ouvidos diretamente e por meio de suas associações representativas ou de
representantes brasileiros regularmente constituídos;
II- que a multinacional estrangeira BHP pare de se utilizar de mecanismos
inibidores e/ou de intimidação para evitar que as vítimas desse desastre,
incluídos os Municípios, possam legitimamente lutar pela satisfação dos seus
direitos violados;
III- que sejam discutidos valores e condições minimamente aceitáveis para
um eventual acordo a ser pactuado, no Brasil, com as mineradoras
responsáveis pelo desastre em questão.

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