O áudio que escancara o golpismo bolsonarista e a violência contra Moraes
Interceptações reforçam que grupo planejava ações armadas contra ministros do STF e líderes eleitos

Um policial federal da ativa afirmou, em áudios interceptados pela investigação da PF no caso da trama golpista, que fazia parte de um grupo preparado para prender ministros do Supremo Tribunal Federal. Caso fosse necessário, disse ele, a ação incluiria mortes. Segundo o próprio agente, bastava “uma canetada” do então presidente Jair Bolsonaro para que a operação tivesse início.
“A gente ia prender o Alexandre de Moraes. Eu ia estar na equipe. Ia botar pra f*** nesse f***. […] A gente ia empurrar meio mundo de gente, matar meio mundo de gente. Não ia estar nem aí.”
O policial se chama Wladimir Soares. Estava lotado, durante a transição de governo, na equipe de segurança do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo a PF, usou essa função para repassar informações sigilosas sobre rotas e estratégias de proteção aos organizadores da tentativa de golpe.
Nos áudios, Wladimir confirma que o grupo estava pronto, com estrutura armada e apoio operacional. “Esperávamos só o ok do presidente. Uma canetada. Só que o presidente deu para trás.”
Ele afirma que o grupo, com “poder de fogo elevado”, foi formado para “empurrar quem viesse à frente”. E reforça: havia disposição para matar. “A gente ia com muita vontade. Ia empurrar meio mundo de gente. Matar meio mundo. Não ia estar nem aí.”
Como se sabe, o plano de ação, segundo as investigações, foi batizado de “Punhal Verde e Amarelo”. Um dos documentos que orientavam o golpe foi impresso dentro do Palácio do Planalto. O objetivo era prender ou eliminar autoridades como o presidente da República, o vice-presidente e ministros do STF.
Há trechos ainda mais graves. Wladimir chega a fazer pedido direto a um delegado da Polícia Federal para integrar a equipe que prenderia Moraes. A resposta foi:“Grande Wladimir! Estaremos eu e você.”
POSSE DE LULA
Em tom de desespero, o agente também revela como recebeu a posse de Lula:
“Minha vontade era chorar. Meu estômago todo embrulhado. A vontade era chorar só.”
A insatisfação com o Exército aparece em forma de acusação conspiratória. “Os generais foram lá e deram a última forma. Disseram que não iam mais apoiar ele. […] O PT pagou para eles. Comprou esses generais.”
Sobre a retirada dos acampamentos golpistas, diz: “O Exército já está começando a tomar medidas, bloquear vias. Não é porque querem que acabe, não. É porque a manifestação já legitimou.”
O conteúdo dos áudios veio a público nesta semana, em um furo de reportagem de Marcelo Parreira e Márcio Falcão, no G1.
Críticas ao Supremo Tribunal Federal ou ao ministro Alexandre de Moraes fazem parte do debate público. Mas o que revelam os áudios não é crítica, nem divergência. É conspiração. É plano armado. É ruptura democrática pensada e articulada dentro do Estado.
Não é bravata. É registro. Um projeto golpista que só não avançou por falta de comando — e não por falta de convicção.
Mais um passo, e o país teria cruzado, novamente, a linha que já atravessou em 1964. Um golpe militar que deixou feridas abertas, cicatrizes profundas e um trauma institucional que ainda não foi superado.