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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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O 2 de Julho, a verdadeira independência do Brasil e o ataque a Benedita

Data em que os portugueses foram expulsos do país, comemorada na Bahia, deveria ter o reconhecimento nacional como passo para a tão sonhada igualdade

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jul 2024, 12h25 - Publicado em 3 jul 2024, 23h59

Todo 2 de julho é dia da Independência da Bahia, uma data que marca também a independência do Brasil, sendo entendida como a verdadeira libertação do país, com a expulsão das tropas portuguesas. No entanto, esse importante evento histórico ainda não tem a repercussão e o reconhecimento nacional que merece.

Recentemente, em uma conversa com uma baiana, fui lembrado do significado profundo do 2 de julho. Para ela, essa data, celebrada com orgulho pelo povo baiano, é o verdadeiro marco da independência do Brasil, apesar dos seus paradoxos. Ela recitou trechos do Hino ao 2 de Julho, cujos versos ressoam com a força de um clamor atemporal e, atualmente, mais do que urgente: “Com tiranos não combinam, brasileiros, brasileiros corações”. Essas palavras não são apenas um eco do passado, mas um grito contínuo por liberdade e justiça que ainda buscamos. 

Ao ouvi-la, percebi a importância de uma história frequentemente negligenciada.

A Bahia, cuja capital tem a maior população negra fora da África, foi o palco de uma resistência que define a identidade da nossa “brava gente”, como nos recorda o Samba-enredo de 2023 da Beija-Flor de Nilópolis. A luta pela independência, que culminou em 1823 – e tem até hoje as figuras do caboclo e da cabocla como símbolo – começou muito antes e teve também o povo negro na linha de frente.  Mais uma vez, “o sangue do orgulho tinto e servil avermelhava as terras do Brasil”.

A narrativa oficial muitas vezes omite o caráter híbrido da luta pela independência, já que lutaram lado a lado fazendeiros, escravizados, libertos e lavradores pobres. Na linha de frente – como em outros episódios da história brasileira, a exemplo da Guerra do Paraguai –, pessoas escravizadas lutavam não apenas pela soberania, mas sobretudo pela libertação do seu povo. Uma promessa de liberdade que, mais de dois séculos adiante, ainda não foi cumprida.

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As mulheres também desempenharam um papel crucial. Maria Felipa, Joana Angélica e Maria Quitéria não são apenas nomes em nossos livros de história, mas símbolos de resistência e coragem. Essas heroínas representam a força feminina que impulsionou a luta pela liberdade.

A cada 2 de julho, deveríamos lembrar também não apenas a vitória de 1823, mas também as contínuas batalhas por igualdade e justiça social. Se “o Brasil já tem jurado independência ou morrer”, invoco novamente as reflexões de minha interlocutora baiana, mulher negra, que me lançou a questão: “Seguimos morrendo, mas pela independência de quem?”.

Segundo o Atlas da Violência 2024, nos últimos 11 anos, a cada 12 minutos, uma pessoa negra é assassinada no Brasil. São essencialmente jovens negros, cujas mães transcendem a dor para transformar luto em luta por justiça.

O mês em que se celebra o 2 de julho é também dedicado às mulheres negras: dia 25 de julho é o dia internacional da mulher negra latino-americana e caribenha. No Brasil, é também dia de Tereza de Benguela, líder quilombola que resistiu à escravização por duas décadas no comando do quilombo do Quariterê.

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Mulheres negras no nosso país, apesar de formarem o maior segmento social (28% da população brasileira), não têm a sua luta histórica e cotidiana valorizada. Jamais construiremos uma democracia justa e para todos e todas se liberdade e igualdade continuarem sendo para as pessoas negras (e indígenas também) uma mera promessa.

Celebrar o 2 de julho e o Julho das Pretas – denominação atribuída pelo movimento de mulheres negras – é, antes de tudo, reconhecer a contribuição de todos os brasileiros, especialmente daqueles que continuam à margem na hora de repartir os frutos da vitória contra a tirania, seja da vitória da independência, seja da frágil vitória da democracia.

“Pela mátria soberana, eis o povo no poder são Marias e Joanas, os brasis que eu quero ter”. São Marias, Mahins, Marielles, Malês que precisam também estar à frente dos rumos do Brasil.

PS – Especificamente nesta terça, 2, houve a declaração de Carla Zambelli que se referiu a Benedita da Silva como Chica da Silva, mulher escravizada do século XVIII que conseguiu a alforria e a ascensão social. A declaração gerou uma onda de solidariedade à parlamentar com inúmeras mensagens, incluindo do presidente Lula. A fala de Zambelli só mostra que esses assuntos são ainda mais que necessários no Brasil de 2024.

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