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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog

Condenar golpistas de 2023 não encerrará ciclo de terror iniciado em 1964

Entenda

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 1 abr 2025, 00h46 - Publicado em 31 mar 2025, 20h27

No primeiro 31 de março desde o golpe de 1964 em que generais estão no banco dos réus, o Brasil precisa compreender a importância de punir golpistas do 8 de janeiro – um momento histórico, de fato -, sem esquecer o maior erro da nossa história após a escravidão: a impunidade dos torturadores da ditadura militar.

A nova tese que circula no país, e principalmente em Brasília, é de que o caso da trama golpista pode finalmente curar a ferida de 1964, ou mesmo enterrar o corpo insepulto dos crimes imprescritíveis e continuados dos generais do regime militar.

Mentira.

Sim, eles estão conectados. Se o Brasil tivesse escolhido outro caminho, o da justiça de transição após o regime, punindo seus golpistas, não teríamos nem um presidente que fez odes à torturadores nem a destruição da sede dos Três Poderes após a eleição de 2022.

As Forças Armadas têm uma tradição golpista desde a fundação da República. Os primeiros presidentes brasileiros foram militares, civis como Artur Bernardes governaram com o estado de sítio em vigor. É uma história toda entrecortada por tentativas de golpes e violência vil por parte dos militares.

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Entre 1946 e 1964 houve tumultos e ameaças, com militares tentando impedir posses de presidentes. Teve governo aberto sim, relativa liberdade de imprensa, mas não exatamente uma democracia plena. A democracia era amedrontada, assustada, sempre acuada.

Um presidente suicidou-se com um tiro no peito. Jacareacanga e Aragarças, chamadas de “revoltas”, foram movimentos golpistas da FAB que queriam derrubar presidentes com a velha desculpa de combater a corrupção e outras “mazelas da esquerda”.

Lembra bem o 31 de março, quando Exército, Marinha e Aeronáutica também se colocaram como reservas morais do país na luta contra o comunismo e a “corrupção dos progressistas”. Derrubaram um político que de comunista mesmo não tinha nada. João Goulart era um trabalhista.

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Entramos então no dia que durou 21 anos. Sombrios, tenebrosos. Congresso fechado, cassação de opositores, troca de ministros do Supremo. A tortura virou prática comum do estado brasileiro em prédios públicos. Quartéis que deveriam proteger brasileiros viraram máquinas da morte.

Mas há sim ligações com os tempos atuais.

O general Sylvio Frota em 1977 queria colocar novo combustível na linha dura – mais perseguições, torturas e assassinatos do regime que começava timidamente e lentamente a se abrir. Geisel que havia fechado o Congresso em abril disputou na faca com a linha dura que queria um novo AI-5. Era o lado muito ruim contra o péssimo.

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E quem era um dos principais assessores de Frota?

O general Augusto Heleno, hoje réu por envolvimento na primeira tentativa de golpe desde a redemocratização em 1985. O Brasil foi construído em uma cultura de impunidade e longos sobressaltos antidemocráticos. É essencial punir os golpistas de hoje, mas isso não resolve os horrores da ditadura. Criminosos do regime ajudaram na organização das milícias que mataram Marielle Franco e Bruno Pereira. Não é por acaso.

A democracia constitucional de massas, com a constituição cidadã, presenteou o país, nos últimos 40 anos, com o maior período de normalidade institucional brasileira. E o que aconteceu? Foi fortemente ameaçada durante todo o governo Bolsonaro. Houve eleições, alternância de poder, mas vivemos novamente uma tentativa de golpe.

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Nesta última turnê de Gilberto Gil entoa-se “Cálice” e “Não chores mais”. Imagens de Rubens Paiva, Vladimir Herzog e Stuart Angel nos telões, dores da ditadura, levam o público a vincular as imagens a Bolsonaro e o grito de sem anistia. Nunca curamos as dores da ditadura, e já temos as dores de agora. Juntamos os tempos, sem resolve-los separadamente.

O acordão dos militares com parte da sociedade civil que nos levou à anistia em 1979, e à redemocratização em 1985, é o segundo maior cover up de crimes imprescritíveis e contra a huma­nidade do país. Criminosos estão protegidos pelo muro da impunidade que deveria ter sido derrubado há anos. No Brasil, perdoou principalmente os militares. E eles se aferram a isso até o fim para evitar processos. O STF falhou fragosamente ao não mudar essa realidade.

Não estamos em um novo terreno com os generais no banco dos réus. É o mesmo terreno movediço em que os fantasmas antidemocráticos voltarão a nos assombrar. Chico Buarque foi realmente genial ao escrever música em 1973, censurada pela ditadura até 1978.

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Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado, eu permaneço atento
Na arquibancada, pra a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa

Pai (Pai), afasta de mim esse cálice

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