A eternidade de Evandro Teixeira e de sua obra
Gigante do fotojornalismo, ele deveria ter seu acervo exposto, junto com o de Orlando Brito, em grande museu nacional. Os dois contaram a história do país
O tamanho de um fotojornalista é medido pela capacidade de deixar assinaturas em suas fotos sem assiná-las. É quando a própria imagem já declara que é de determinado fotógrafo. Conheci poucos assim. Um deles foi Orlando Brito. Outro faleceu nesta segunda-feira, 4, aos 88 anos. Era Evandro Teixeira.
Os dois deixaram como legado um acervo que se mistura com a história do Brasil nos últimos 60 anos, 70 anos, e justamente essa marca de estilo.
Criança e adolescente, com meus pais, padrasto, madrasta e meu irmão mais velho – todos jornalistas -, tinha acesso aos mais importantes matutinos impressos no país. O meu preferido era o JB, o velho Jornal do Brasil. A primeira coisa que eu olhava com atenção era a foto de capa. Muitas vezes eu via a foto e, antes de ler o crédito, sabia que era uma imagem do mestre.
Na galeria de Evandro Teixeira, existem fotos icônicas como a passeata dos cem mil, a violência da ditadura contra os estudantes – o militar com o cassetete e o estudante no ar, além da foto mais que icônica do Forte de Copacabana, o único jornalista que fotografou o início do golpe militar naquela noite de 1º de abril de 1964, no Rio de Janeiro.
As imagens se somam a algumas do meu querido amigo Orlando Brito. Foi Brito que fez a imagem do Congresso Nacional vazio e um militar ao fundo no lugar mais iluminado. Os dois contam histórias da ditadura militar, um dos momentos mais sombrios da nossa história, de forma sublime.
Mas não pararam na cobertura do regime. Evandro Teixeira e Orlando Brito continuaram escrevendo através de imagens como foi a redemocratização, com inúmeras fotos que mereciam estar num museu.
Falta ao Brasil um museu sobre o regime militar, como defendo no livro Em Nome dos Pais. Somos o único país que não enfrentou crimes cometidos pelo Estado naquele período. Somos o único país que passou por uma ditadura sem fazer uma justiça de transição.
Evandro e Orlando poderiam ser os grandes nomes desse museu nacional, com imagens expostas sobre algo que não queremos que se repita no país – a destruição completa do estado democrático de direito.
Convivi mais com Orlando Brito. Também tive momentos com Evandro Teixeira, gênio do fotojornalismo. Um dia saímos os dois para conversar sobre fotografia no Rio de Janeiro. Mostrei para ele algumas fotografias que tinha feito. Educado, ele as elogiou. Era uma figura carinhosa. Não que ele às vezes não ficasse mal-humorado, mas Evandro Teixeira tinha uma espécie de paixão pela vida no ar. Era o que o levava a fotografar de forma tão genuína e ímpar.
Orlando Britto e Evandro Teixeira eram as torres gêmeas do fotojornalismo brasileiro. A única diferença entre os edifícios de Nova York atacados pelo terrorismo é que, na história do Brasil, eles ficarão permanentemente em pé, para sempre. Viva Evandro Teixeira. Viva Orlando Brito. Que os dois possam encontrar Jorge Bastos Moreno em outro plano para fazerem uma cobertura jornalística que, certamente, adoraria ver e ler.
É que os reis da fotografia tombaram.
Longa vida à rainha Gabriela Biló!