Sob pressão por leilão de arroz, ex-ministro de Dilma se diz ‘tranquilo’
Neri Geller, cujos ex-assessores teriam atuado em certame promovido pelo governo, diz que despachou normalmente com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro
Na berlinda após repercussão negativa do leilão de 1,31 bilhão de reais organizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para aquisição de 263 mil toneladas de arroz importado, na semana passada, o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, disse não estar preocupado em relação à lisura do certame, nem sobre sua permanência no cargo. “Estou muito tranquilo, já fui ministro e hoje estou aqui para ajudar”, disse ele, que fez parte do primeiro escalão do governo Dilma Rousseff, comandando a pasta da Agricultura.
Geller afirmou que se reuniu nesta segunda-feira com o ministro Carlos Fávaro, da Agricultura, e que expôs sua tranquilidade em relação ao leilão. “Disse a ele que estou 100% tranquilo, conheço o setor há 20 anos”. Segundo o secretário, após esta conversa, a reunião se desenrolou sobre os demais assuntos ordinários da pasta. “Depois fui para a minha sala e despachei normalmente”, disse — leia matéria aqui sobre as reuniões envolvendo a área de agricultura do governo nesta segunda.
O governo, no entanto, vem discutindo internamente sua permanência. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou sua insatisfação pelo fato de um assunto que foi pensado para ser positivo para o governo acabou se transformando numa “crise”. No Congresso, já há deputado recolhendo assinaturas para a criação da CPI do Arroz, provavelmente alavancada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro — leia matéria aqui.
Ex-assessores de Geller
O secretário entrou na mira após a divulgação da informação de que a FOCO Corretora de Grãos, que atuou no leilão, pertence ao empresário Robson Almeida de França. Robson foi assessor parlamentar de Geller na Câmara, quando ele era deputado federal. Além disso, é sócio do filho do secretário, Marcello Geller, em outras empresas. “Ele trabalhou comigo até 2020. Falei com ele recentemente e ele até brincou dizendo que eu não pago mais o salário dele”, justificou.
Além de Geller, também está na berlinda o diretor de Operações e Abastecimento da Conab, Tiago José dos Santos, responsável pela organização do certame. O leilão vem sendo questionado também por causa das empresas que saíram vitoriosas. Em representação ao Tribunal de Contas da União (TCU), deputados de partidos como o Novo, PP e PSDB apontaram indícios de “fraude”, “direcionamento” e “uso de artifícios para restringir a competititvidade”.
“Queijo Minas”
Os parlamentares argumentam que das quatro empresas que participaram do leilão, apenas uma trabalha no ramo de importação. Quatro empresas venceram o primeiro leilão, realizado na quinta-feira, 6, após o governo derrubar uma liminar da Justiça gaúcha que proibia o certame, a pedido de entidades e políticos ligados aos produtores de arroz do Rio Grande do Sul, que respondem por mais de 70% da produção nacional. As quatro vencedoras receberão 1,3 bilhão de reais.
A maior suspeita recai sobre o o principal vencedor, a empresa Wisley A. de Souza Ltda., que funciona em Macapá sob o nome fantasia de Queijo Minas. A firma ganhou o direito de importar 147,3 mil toneladas de arroz e receber, por isso, 736,3 milhões do governo. O problema é que a ampresa tinha um capital social de 8.000 reais até o final de maio, mas mudou, dias antes do leilão, para 5 milhões, valor que lhe permitiria participar da disputa.