Polêmica do IOF deve atrasar isenção de IR, que é aposta de Lula para 2026
Ex-presidente da Câmara e relator do projeto, Arthur Lira tem segurado o andamento da proposta em razão do clima ruim para o governo no Congresso

O clima ruim entre o governo Lula e o Congresso — acirrado por conta da derrubada do decreto do IOF, que agora foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) — pode engavetar, ao menos pelas próximas semanas, uma das propostas legislativas mais caras ao PT, na qual a sigla aposta inclusive para turbinar a campanha pela reeleição em 2026. O ex-presidente da Câmara, deputado federal Arthur Lira (PP-AL), tem segurado a apresentação do relatório do projeto de lei que isenta do pagamento do Imposto de Renda para pessoas que ganham até 5.000 reais por mês enquanto o clima no Congresso não desanuviar — e a chance de uma aprovação não subir.
O PL n° 1087 de 2025 foi proposto pelo governo federal em março e, estrategicamente, foi parar nas mãos de Lira. Uma das características mais fortes da sua passagem pela presidência da Câmara foi o perfil de “entrega”: ele dificilmente permitiu que uma proposta à qual era favorável fosse à votação sem a convicção razoável de que teria o “sim” da maioria. Por isso, apesar da pauta da Câmara em regra ser alinhada com os líderes, não foram raros os momentos em que Lira pautou projetos de última hora — e que passaram, muitas vezes, em horários inóspitos.
Dois casos ilustram esse perfil. Um, a reforma tributária, cuja redação final foi costurada madrugada adentro em cima de 800 emendas, para ser votada em segundos na manhã do dia seguinte. Outro exemplo foi o PL das Fake News, mas no sentido contrário. Quando Lira viu que a pressão das big techs estava criando resistência entre os parlamentares para o projeto, determinou a abertura de um grupo de trabalho para discutir a questão e não deixou a proposta ser derrotada no plenário — até hoje, a iniciativa não andou.
O mesmo tato foi usado agora no PL 1087. Lira é relator de outra proposta, que atualizava a tabela da isenção do imposto de renda, cujo limite hoje é de dois salários mínimos. Apesar de caminhar junto com a isenção de até 5.000 reais, a proposta mais enxuta passou, enquanto a outra, que muito interessa ao governo, vai ter que esperar a poeira abaixar. Para se ter uma ideia do clima, o atual presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), trocou alfinetadas com o ministro da Fazenda Fernando Haddad, que o acusou de “mudar” o combinado com o governo por colocar em pauta a derrubada do decreto do IOF.
Com ou sem entregas, o engavetamento (temporário ou não) do projeto que isenta de IR quem ganha até 5.000 reais abre margem para mais barganhas e mais emendas. Reportagem da edição de VEJA desta semana mostra que, diferente dos outros mandatos de Lula, o petista agora lida com um Congresso bem mais empoderado e com um apetite declarado por emendas. No outro lado do Legislativo, o presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) recebeu mais de 20 milhões de reais em emendas só depois da derrubada dos decretos do IOF. A cena mostra que, até o recesso do meio do ano do Legislativo, que começa no próximo dia 17, é praticamente impossível que o PL n° 1087 passe. O desfecho do xadrez depende do quanto o governo conseguir negociar e estiver disposto a ceder e da melhora do ambiente político no Congresso.