O cacique xavante que admitiu receber uma mesada de 200 mil reais
Damião Paridzané foi alvo de operação da PF que apura arrendamento ilegal de terra indígena para a criação de gado

O cacique Damião Paridzané, que ganhou projeção como um dos principais líderes indígenas do país, reconheceu em depoimento, segundo a Polícia Federal, ter recebido 200 mil reais mensais para arrendar ilegalmente porções da Terra Indígena Marãiwatsédé, no norte de Mato Grosso, para a exploração de gado.
A trajetória do cacique xavante era reconhecida pela persistência com que liderou a retomada da aldeia onde nasceu, após ter sido retirado do local ainda adolescente, na ditadura militar. Ele já se reuniu com lideranças no Congresso, participou das conferências climáticas Eco-92 e Rio+20 para falar das invasões de sua terra e foi agraciado em 2014 com o Prêmio Direitos Humanos, entregue pela então presidente, Dilma Rousseff.
Sobre ele recai agora a suspeita de lucrar milhões de reais com o arrendamento de porções de terra, o que é proibido pela Constituição e pelo Estatuto do Índio. Batizada de Res Capta, uma operação da PF no início de março apontou que ele recebia 889 000 reais por mês, com base em depoimentos do coordenador regional da Funai e um de seus auxiliares, que foram presos. Um pecuarista disse que pagava diretamente a ele pelo arrendamento. Depósitos de outros fazendeiros foram identificados pela PF. Segundo o delegado Mário Ribeiro, Damião admitiu que ficava com 200 000 reais mensais para despesas pessoais, sem revelar para onde iria o restante. A Justiça bloqueou as suas contas bancárias e impôs diversas medidas restritivas — se voltar a arrendar terras ou mantiver contato com os demais investigados, ele pode ser preso.
As desconfianças da PF sobre Damião vêm desde 2017, quando começaram a ganhar corpo as denúncias de arrendamentos. Aumentaram três anos depois, quando o cacique chegou para prestar depoimento em uma caminhonete Toyota Hilux SW4 avaliada em 380 000 reais. Damião disse que o veículo era dele, mas os agentes descobriram que o veículo estava no nome de um arrendatário e que poderia ser um “presente”. Por outro lado, a tribo vivia situação “de penúria”, sem comida nem assistência. “Fica nítido que o dinheiro não estava indo para a aldeia”, diz o delegado Ribeiro.