Comissão de Anistia pede desculpas a povo indígena por crimes da ditadura
Processo analisou violações contra a etnia krenak; é a primeira vez que o colegiado concede reparação coletiva a indígenas em nome do estado brasileiro
A Comissão de Anistia aprovou nesta terça-feira, 2, por unanimidade, a concessão de reparação coletiva e um pedido de desculpas formal aos indígenas da etnia krenak, do norte de Minas Gerais, por violações e atos de violência impetrados contra eles durante a ditadura. É a primeira vez na história do país que o colegiado aprovou a concessão de reparação coletiva a indígenas por violações provocadas pelo governo brasileiro. Embora não represente ressarcimento financeiro, a medida contribui para a garantia de direitos para a comunidade, como retificação de documentos e demarcação de terras.
O pedido que fundamentou a decisão, de autoria do Ministério Público Federal (MPF), relata violações à etnia krenak entre os anos de 1947 e 2003. O período mais violento, no entanto, ocorreu durante a ditadura.
O MPF destaca três episódios como marcantes de violação aos direitos dos krenak: a criação da Guarda Rural Indígena (Grin); a instalação do Reformatório Krenak, um presídio para indígenas em Resplendor (MG), que se tornou um centro de trabalhos forçados, torturas e desaparecimentos; e o deslocamento forçado para a fazenda Guarani, em Carmésia (MG), usada inicialmente como centro de tortura de presos pela Polícia Militar de Minas e que também funcionou como centro de detenção de indígenas após a extinção do Reformatório Krenak.
Ao final da sessão, vestida com um manto em homenagem aos krenak, a presidente da Comissão de Anistia, Enea de Stutz, se ajoelhou diante da matriarca dos krenak para pedir desculpas. “Em nome do Estado brasileiro, eu quero pedir perdão por todo o sofrimento que seu povo passou”, disse. A comissão também expediu uma recomendação a órgãos dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para que a terra dos krenak seja demarcada.
Segundo pedido
O colegiado também aprovou nesta terça-feira o pedido de anistia política coletiva feito pelos guarani-kaiowá da comunidade indígena Guyraroká, do Mato Grosso do Sul. Localizada no município de Caarapó (MS), a cerca de 275 quilômetros de Campo Grande, a comunidade abriga hoje cerca de 525 indígenas da etnia.
O pedido de reparação coletiva aos guarani-kaiowá também foi feito pelo MPF. Segundo o Ministério Público, a comunidade foi alvo de traslados compulsórios promovidos por políticas federais de povoamento do interior do país implementadas no pós-guerra do Paraguai (1864-1870) e durante períodos ditatoriais, o que teria provocado mortes e outras consequências trágicas da retirada do povo de sua terra tradicional.
As violações aos direitos dos guarani-kaiowá foram reconhecidas pela Comissão da Verdade. A estimativa é que cerca de 8.300 indígenas tenham sido mortos em decorrência da ação ou da omissão do governo brasileiro.