Bolsonaro pode perdoar Silveira, mas STF julgará indulto, diz jurista
Presidente anunciou decreto perdoando crimes do deputado, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão por ameaças à Corte

Ao editar um decreto para perdoar os crimes do deputado bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ), nesta quinta-feira, 21, o presidente Jair Bolsonaro (PL) abriu nova frente em sua conflituosa relação com o Supremo Tribunal Federal (STF), que na quarta condenou Silveira a 8 anos e 9 meses de prisão por fazer ameaças à Corte.
Diante da afronta de Bolsonaro ao STF, advogados criminalistas ouvidos por VEJA afirmam que o presidente exerceu uma prerrogativa constitucional, mas ponderam que há nuances sobre o momento da efetividade do decreto e apontam a possibilidade de o próprio Supremo analisá-lo. Opositores do presidente já preparam ações à Corte questionando o perdão a Silveira, a exemplo do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e do presidenciável Ciro Gomes (PDT).
Bolsonaro afirmou que o indulto foi concedido com base no inciso 11 do artigo 84 da Constituição, que diz que é privativo ao presidente da República “conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei”.
Antes de ler o decreto, Bolsonaro disse que iria dar uma “notícia de extrema importância para nossa democracia e nossa liberdade” e afirmou que tudo estava fundamentando em decisões do ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal contra o deputado no STF, sem explicar a que se referia.
“Em regra, esse indulto só pode ocorrer depois do trânsito em julgado, mas o presidente fez o decreto antes, para tentar evitar uma condenação definitiva do deputado. Se o decreto valer antes do trânsito em julgado, não há pena e nenhum efeito derivado dela. É como se ele nunca tivesse sido condenado, é isso que Bolsonaro quer”, diz Pierpaolo Bottini, professor livre docente do Departamento de Direito Penal, Criminologia e Medicina Forense da Faculdade de Direito da USP.
De acordo com o jurista, no entanto, o próprio Supremo pode, quando acionado pela oposição, delimitar o momento em que o indulto assinado pelo presidente teria efeito, se antes ou depois do trânsito em julgado – a decisão que influiria sobre a cassação do mandato de Daniel Silveira e sua inelegibilidade, diz o criminalista.
“O que o STF pode fazer é decidir que só é possível indultar após a condenação. Nesse caso, a Câmara dos Deputados decidirá sobre a perda do mandato, como lhe cabe em condenações criminais, e, pela lei da Ficha Limpa, pelo simples fato de ser condenado, transitado em julgado, o deputado fica inelegível”, afirma Pierpaolo Bottini.
Além disso, a súmula 631 do STJ (Superior Tribunal de Justiça) diz que “o indulto extingue os efeitos primários da condenação (pretensão executória), mas não atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais”. A inelegibilidade é um desses efeitos secundários da condenação penal no caso de Silveira.
Para o criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, o Supremo ainda poderá analisar se houve desvio de finalidade no decreto de indulto. “Existe a previsão constitucional e é necessário respeitar a independência entre os Poderes. Porém caberá ao Supremo Tribunal decidir se cabe graça constitucional nos casos dos crimes pelos quais foi condenado o deputado. Cabe a última palavra ao Judiciário”, afirma.