ARTIGO: O que irá definir a vitória de um candidato nas eleições de SP
Os desafios na gestão da capital do estado são inumeráveis, de modo que exigem projetos consistentes e ousados

O eleitor paulistano está diante inumeráveis problemas incrustrados em sua cidade. Os desafios são inumeráveis, de modo que exigem projetos consistentes e ousados com sua realidade nada fácil. No centro da capital do Estado, o problema mais notório diz respeito aos moradores em situação de rua, sobretudo a Cracolândia, estabelecimentos comerciais fechando suas portas por falta de segurança pública, e o grande número de propriedades abandonadas que poderiam ser úteis para a redução do déficit de moradias. Os bairros periféricos sofrem não só com a falta de segurança como também há a necessidade de modernização das redes de transportes, incluindo a qualidade e necessidade de mais corredores de ônibus. Além disso, a periferia requer projetos mais contundentes de iluminação pública, aparelhos culturais,
urbanização de ruas e córregos, acesso a hospitais, empregos e escolas de melhor qualidade, revelando o histórico descaso com a população que mais precisa de políticas públicas para a consolidação do direito à cidade e à dignidade humana.
Estes entre outros problemas na cidade acabam sendo ofuscados com a nacionalização da campanha eleitoral municipal no ano de 2024. Diferentes cientistas políticos têm apontado que as eleições desse ano no Brasil, especialmente em São Paulo, vêm adquirindo caráter de terceiro turno das eleições de 2022, quando Lula e Bolsonaro monopolizaram e polarizaram o debate político, deixando pouca margem para que governadores, deputados estudais, federais e senadores adquirissem maior protagonismo para a discussão de seus problemas locais ou outros problemas nacionais de maior relevância. Nas eleições presidenciais de 2022 o que se viu foi uma batalha de
rejeições alimentandas nas redes sociais, em que as propostas políticas foram escanteadas diante de fake-news, debates sobre pautas morais e discursos de ódio que em nada contribuem com os reais problemas da população.
Estas tendências já estão dando o tom para as eleições municipais, por isto afirma-se a sua nacionalização. Lula e Bolsonaro já estão rodando o país servindo de
cabos eleitorais ou garotos-propaganda para candidatos do próprio partido ou de aliados, atacando-se mutuamente. A respeito da cidade São Paulo, Lula apoia o candidato do PSOL, Guilherme Boulos, que está tecnicamente empatado e liderando as pesquisas ao lado de Ricardo Nunes (MDB), apoiado por Bolsonaro. Segundo o Instituto
Datafolha em pesquisa divulgada no dia 08 de agosto, Nunes possui 23% e Boulos 22% das intenções de voto. Vale destacar que em 2022, a cidade de São Paulo registrou no segundo turno da campanha presidencial, Lula com cerca de 53% dos votos contra 46% de Bolsonaro. Uma outra recente pesquisa do Datafolha em maio de 2024, aponta que o índice de rejeição de qualquer candidato indicado por Bolsonaro na cidade é de cerca de 61% e Lula 45%.
O ESPAÇO PARA A MODERAÇÃO
Como azarões e logo atrás de Nunes e Boulos, José Luiz Datena (PSDB) e Pablo Marçal (PRTB) estão empatados com 14%, seguidos por Tabata Amaral (PSB) com 7%. No imaginário do eleitor, Datena, o mais popular entre os candidatos devido às três décadas de apresentação de programas de TV, está vinculado a setores mais conservadores da cidade, sobretudo os que defendem maior rigor policial ou que possui simpatia com a chamada bancada da bala. Pablo Marçal, visto por muitos como clone de uma campanha bolsonarista, apresenta-se na condição de candidato antissistema, realizando críticas contraproducentes direcionadas aos seus adversários, divulgando sua imagem com bravejos, gritos, palavrões que por mais espalhafatosos que sejam parecem ter chegado ao seu esgotamento na cidade, bastaria observar
os índices citados de rejeição do Datafolha e o desempenho da extrema-direita na última campanha presidencial. Tabata Amaral expressa ser a candidatura mais moderada e que procura não só conciliar lados opostos, como tem focado suas falas em debates em posicionamentos propositivos para a solução dos problemas da cidade. No entanto, sem se considerar de esquerda ou de direita, senão centro, sua candidatura parece que não vai a lugar nenhum.
A cidade de São Paulo foi palco nos últimos anos, ao menos desde o impeachment de Dilma em 2016, dos desfiles das elites e classes médias trajadas de verde e amarelo na Avenida Paulista. Com a prisão de Lula em 2018 e com a campanha de Bolsonaro, fora as vitórias de Doria à prefeitura em 2016 e ao governo do Estado em 2018, o conservadorismo dominou as preferencias do eleitorado, alcançando o seu auge. No entanto, a catastrófica gestão ou falta dela durante a pandemia em 2020, a crise econômica, desemprego e a inflação fizeram com que o discurso ultraconservador perdesse fôlego na cidade, pois as pautas morais destoam ou são inúteis em
relação à materialidade dos problemas que o país e a cidade enfrentam, o que justifica os números de Lula em 2022 e Boulos na atual campanha municipal.
O perfil de um eventual vencedor na cidade exige aproximação com preferências do eleitorado mais moderado, que certamente irá definir o resultado das eleições, conforme tem ocorrido desde a eleição do falecido prefeito Bruno Covas em 2020. Estes moderados pendem para candidatos ora de direita, ora de esquerda, sem que estes se apresentem com visões consideradas mais incisivas ou radicais. Os complexos problemas da cidade requerem conciliação e diálogo entre diferentes grupos heterogêneos que compõem o universo chamado São Paulo.
*Paulo Niccoli Ramirez é cientista político e professor de Sociologia da ESPM. autor dos livros “Sérgio Buarque e a Dialética da Cordialidade” (EDUC, 2011) e
“Ética, cidadania e sustentabilidade” (SENAC, 2021).