A dificuldade de Wadih Damous, amigo de Lula, para ser aprovado para a ANS
Ex-deputado do PT foi indicado pelo presidente há cinco meses para o cargo, estratégico para o governo, mas a sua sabatina nunca entrou na pauta do Senado

O governo Luiz Inácio Lula da Silva tem pressa para colocar o advogado petista Wadih Damous no cargo de diretor-presidente da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), principalmente porque tem interesse em fazer deslanchar um plano de baixo custo (em torno de 100 reais por mês) com potencial para atingir até 50 milhões de brasileiros — a iniciativa, que tramita na agência reguladora, depende em grande parte da efetivação de Damous no órgão, que hoje é comandado de forma interina.
Mas isso não está sendo nada fácil. Ele foi indicado por Lula para o cargo no dia 16 de dezembro do ano passado (ou seja, há cinco meses), mas a sua sabatina pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado jamais entrou na pauta e não tem, por ora, perspectiva de que isso aconteça. A sabatina é pré-condição para ele ter o seu nome submetido à votação e aprovação em plenário, quando precisará dos votos de ao menos 41 parlamentares.
Um dos motivos para a demora é a resistência do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), em fazer andar a indicação de nomes sugeridos por Lula para agências — não só a ANS, mas também a ANP (petróleo), Anvisa (vigilância sanitária) e Anac (aviação civil) esperam na fila, por conta de discordâncias políticas pontuais sobre cargos com o governo, mas esse não é o único fator que atrasa a nomeação de Damous.
Ex-deputado federal pelo PT do Rio de Janeiro (2015-2018), Damous não é unanimidade nem no lado governista. Nos últimos dias, houve relatos, por exemplo, de que o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que é médico, tem restrições à indicação de Damous, principalmente porque acha que ele tem pouco diálogo com as empresas de planos de saúde.
Esse é, aliás, outro ponto. Comandada por ele, a Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), órgão do Ministério da Justiça, abriu em novembro de 2024 processos contra catorze operadoras de planos de saúde para apurar questões como cancelamentos unilaterais de contratos e práticas consideradas abusivas. Pouco tempo depois, com a sua indicação ao cargo de diretor-geral da ANS por Lula, os procedimentos não andaram (ou andaram de forma imperceptível), mas isso não reduz a desconfiança do setor com o indicado.
A primeira polêmica de Damous com o setor, aliás, foi na seccional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Rio de Janeiro, que ele comandou de 2007 a 2012 e onde se projetou politicamente. Uma das acusações feitas a ele à época foi a de acabar com o plano de saúde para advogados, ao vender a carteira com 55 mil clientes para a Unimed Rio por 50 milhões de reais — hoje, apenas 5.000 permanecem com plano.
Saia-justa com Lewandowski
Damous também acumula algumas polêmicas em Brasília. Em setembro do ano passado, por exemplo, ele criou uma situação embaraçosa com o seu superior, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, quando a Senacon produziu uma nota técnica fixando 95 critérios para serem seguidos pelas plataformas de internet em relação a quesitos como anúncios e dados de usuários. O ministro, que havia assumido o cargo há poucos meses e mantido Damous a pedido de Lula, irritou-se com o gesto, sequer autorizou a publicação da nota técnica no Diário Oficial da União e, dias depois, baixou uma portaria para criar um novo e rigoroso trâmite interno para produção de normas desse tipo.
Fechamento do STF
Antes, em 2018, ele chegou a defender o fechamento do Supremo Tribunal Federal, que à época estava decidindo favoravelmente à Operação Lava-Jato, que apertava o cerco contra petistas no país. “Nós temos de redesenhar o Poder Judiciário e o papel do Supremo Tribunal Federal. Tem de fechar o Supremo Tribunal Federal. Nós temos de criar uma Corte Constitucional de guarda exclusiva da Constituição e os seus membros detentores de mandato”, disse.
Na mesma época, atacou também o hoje presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, que então tomava muitas decisões contra Lula, preso, e o PT, chegando a chamá-lo de “pior ministro dos últimos tempos do STF”. “Nós temos de evitar que gente como o ministro Roberto Barroso tenha o poder de ditar os rumos do processo eleitoral, de ditar os rumos da escolha popular, de ditar os rumos da democracia brasileira. Não foi para isso que essa turma foi colocada lá. Eu tenho alertado lá na Câmara dos Deputados: ou nós enquadramos essa turma ou essa turma vai enterrar de vez a nossa democracia”, afirmou
Nos últimos dias, também teve que dar explicações sobre uma reunião, em junho de 2024, que fez com três dos investigados hoje no escândalo do INSS: o ex-presidente Alessandro Stefanutto, o ex-procurador do órgão Virgílio Oliveira Filho e o responsável pela área de celebração de contratos com as entidades que promoveram descontos dos aposentados, André Fidelis. Em nota, Damous disse que foi uma reunião institucional com os dirigentes do INSS, que foi registrada na agenda pública do secretário.
Aliado de Lula
Damous tem a seu favor o apoio de Lula, de quem sempre foi fiel escudeiro. Já experiente pela defesa acirrada que fez de Dilma Rousseff até a queda da presidente, Damous também esteve ao lado do atual presidente durante o período de 580 dias de cárcere em Curitiba.
Como um de seus advogados, ele visitava Lula na cadeia e servia como ponte política com o mundo exterior. Também foi ele um dos autores do pedido de habeas corpus que quase levou à soltura do então ex-presidente em um domingo, quando o desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), concedeu liminar, logo cassada, para que Lula deixasse a prisão.