Ramadan: mês sagrado para muçulmanos exige cuidados com diabetes
Celebração religiosa inclui jejum prolongado, o que demanda ajustes na rotina e conversa com o médico
Ao redor do mundo, inclusive no Brasil, milhões de pessoas iniciaram o Ramadan, que vai de 22 de março a 21 de abril de 2023. O período remete ao nono mês do calendário muçulmano, e é devotado à reflexão e à devoção divina. No Ramadan, os fiéis são convocados a realizar jejum do nascer até o pôr do sol, ou seja, por aproximadamente 12 horas. E isso costuma ser mais desafiador para quem convive com o diabetes.
O jejum deve ser total. Evita-se a ingestão de alimentos, de líquidos, de balas etc. No geral, as pessoas acordam antes do nascer do sol para tomar um desjejum que antecede o período de jejum. Assim que o dia se encerra, é feita outra refeição, muitas vezes em família. Outras atividades da rotina (trabalho, estudo…) podem seguir inalteradas.
Só que esse tempo sem comer pode impor desafios a quem precisa controlar a glicose, especialmente se faz uso de insulina, o hormônio que permite às células captarem o açúcar circulante. Se o sujeito ficar 12 horas sem se alimentar, há um grande risco de hipoglicemia. Não raro, pessoas que passam um longo período em jejum podem acabar matando a fome depois em refeições exageradas. Isso faz a glicemia ir às alturas. Outro perigo para quem tem diabetes.
Conclusão: o Ramadan é um período em que os hábitos alimentares das pessoas com diabetes mudam muito, com risco de redução de glicose ao longo do dia e aumento abrupto à noite. Essa situação pode predispor a problemas no curto e no longo prazo. Felizmente, o tratamento do diabetes evoluiu ao longo dos anos. Temos medicamentos orais e injetáveis que exercem seu efeito 24 horas por dia (ou até mesmo com duração semanal), e
que possuem risco baixíssimo de hipoglicemia, mesmo com jejum prolongado.
As insulinas de longa duração também apresentam risco cada vez menor de desencadear esses efeitos adversos. Ainda assim, existem remédios mais antigos, caso das sulfonilureias, que aumentam a propensão à hipoglicemia, especialmente em contextos como o do Ramadan. O mesmo se
aplica a insulinas como a NPH e a regular.
Então compartilho dois conselhos importantes aos muçulmanos que estão respeitando essa tradição. Primeiro: procure estabelecer uma boa relação com seu médico, troque informações e alinhe o planejamento terapêutico para evitar os sobes e desces exacerbados da glicemia. Segundo: faça um maior número de medições da glicose ao longo do dia (e hoje a tecnologia ajuda muito nesse sentido, com dispositivos automáticos de monitoração contínua), realizando os ajustes necessários nas medicações. Esses cuidados não deixarão o diabetes descontrolado neste mês tão abençoado.
*Carlos Eduardo Barra Couri é endocrinologista, pesquisador da USP de Ribeirão Preto e colunista de VEJA SAÚDE