Como a IA pode auxiliar no diagnóstico precoce do câncer de pele?
Em poucos anos, inteligência artificial estará presente em todas as etapas: desde a triagem até o suporte à decisão clínica nos tratamentos mais complexos
A inteligência artificial (IA) deixou de ser uma promessa distante para se tornar realidade nos consultórios dermatológicos brasileiros. Esse é um dos destaques do 78º Congresso da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), que reúne, no Rio de Janeiro, especialistas de todo o país para discutir os avanços e desafios da área.
A IA já vem sendo incorporada como uma ferramenta de apoio na prática clínica, principalmente por meio do diagnóstico por imagem. Hoje conseguimos treinar algoritmos capazes de diferenciar lesões benignas de melanomas (tipo de câncer de pele) com sensibilidade e acurácia superiores à observação clínica isolada.
Além disso, a IA tem se mostrado útil na análise de margens cirúrgicas, no acompanhamento de pacientes com múltiplas lesões e até na teledermatologia, onde auxilia na triagem de casos que necessitam de atenção prioritária. No campo terapêutico, embora ainda em fase inicial, há pesquisas que buscam associar a IA a protocolos de imunoterapia e de terapia-alvo, ajudando a prever resposta ao tratamento e personalizar condutas em casos de melanoma avançado.
Os dados confirmam a urgência do tema. De acordo com o Inquérito Dermatológico da SBD, publicado em 2024, os cânceres de pele representaram 6,9% dos atendimentos dermatológicos no Brasil, sendo que 58,3% desses casos foram diagnosticados na rede pública. Isso reforça o papel central do SUS na detecção de casos graves, ao mesmo tempo em que evidencia a necessidade de tecnologias capazes de otimizar a triagem, sobretudo em regiões com poucos dermatologistas.
O uso da inteligência artificial tende a crescer e se diversificar. O futuro aponta para uma medicina cada vez mais personalizada e integrada. Em poucos anos, a IA estará presente em todas as etapas: desde a triagem automatizada em regiões remotas, passando pelo diagnóstico
precoce em consultórios, até o suporte à decisão clínica nos tratamentos mais complexos. Novas possibilidades surgirão, como modelos preditivos que avaliam risco individual com base em fatores genéticos, ambientais e de estilo de vida. Isso permitirá que a prevenção seja ainda mais direcionada, reduzindo a incidência dos tumores de pele mais graves.
Brasil e o cenário internacional
No cenário internacional, países como Estados Unidos, Alemanha e Austrália lideram o uso da IA na dermatologia e em programas nacionais de rastreamento de câncer de pele. Ainda assim, o Brasil não fica para trás. Temos grupos de pesquisa de excelência, acesso a imunoterapias modernas no tratamento do melanoma e iniciativas pioneiras de rastreamento populacional. Nosso maior desafio ainda é a desigualdade de acesso.
A IA pode promover maior acesso ao diagnóstico em regiões com poucos especialistas, detecção precoce de cânceres agressivos como o melanoma, redução de custos para sistemas de saúde e suporte ao médico na tomada de decisão. Para países com grande extensão territorial como o Brasil, a IA pode ser uma ferramenta poderosa para reduzir desigualdades regionais, mas precisamos ser críticos.
Embora otimista com os avanços, é preciso estarmos atentos aos riscos da adoção indiscriminada de novas tecnologias. A IA pode reproduzir vieses dos bancos de dados com os quais foi treinada, o que impacta diretamente na segurança do paciente. Além disso, há questões éticas ligadas à privacidade de dados, responsabilidade legal em caso de erro e risco de substituir o julgamento clínico pelo automatismo. A tecnologia deve ser uma aliada, nunca um substituto do olhar humano.
Enquanto a ciência avança, o desafio continua sendo levar informação, diagnóstico e tratamento a todos os brasileiros. A tecnologia pode ser uma ponte nesse caminho, mas o compromisso com a saúde da pele ainda começa na conscientização.
Importância da conscientização e os desafios
Mas nem tudo é tecnologia. Campanhas de conscientização, como o Dezembro Laranja, também desempenham papel crucial na prevenção. Na última edição, em 2024, a ação nacional da SBD realizou cerca de 18 mil atendimentos com o objetivo de diagnosticar precocemente lesões suspeitas e orientar a população sobre a exposição solar segura. Os resultados chamam a atenção:
- O carcinoma basocelular (CBC) foi detectado em 14,84% dos pacientes e outras pré-neoplasias representaram 11,51% dos casos
- O diagnóstico de carcinoma epidermoide (CEC) ocorreu em 4,68% dos casos, enquanto melanomas malignos (MM) em 2,31% e outros tipos de tumores malignos em 1,21% dos consultados
- Com outras dermatoses, foram diagnosticados 41,22%, seguidos pela ausência de dermatoses em 24,23% dos casos
Além disso, os hábitos de exposição solar seguem sendo motivo de alerta: 62,51% dos atendidos declararam se expor ao sol sem proteção, enquanto apenas 31,63% afirmaram usar protetor solar regularmente. Há pessoas e até médicos que ainda duvidam do uso do protetor solar, questionando eficácia, necessidade e até mazelas que o produto pode causar.
Essa dúvida é alimentada muitas vezes pela desinformação, pela circulação de conteúdos não científicos em redes sociais. E também porque os resultados do uso do protetor não são imediatos. Trata-se de uma prevenção de longo prazo, o que pode gerar descrédito, porém a literatura científica é unânime ao afirmar que o uso regular de filtros solares reduz significativamente o risco de câncer de pele, sendo uma medida segura e eficaz, sem contraindicações relevantes para a população em geral.
As raras reações de sensibilidade a determinados filtros podem ser resolvidas com a escolha de produtos alternativos. O grande desafio é criar o hábito diário de fotoproteção, assim como escovar os dentes ou usar o cinto de segurança.
Apesar da prevalência do câncer de pele no Brasil, ainda há grandes desafios de acesso à dermatologia. Um levantamento inédito da SBD em parceria com o Instituto Datafolha e a divisão de Beleza Dermatológica do Grupo L’Oréal no Brasil revelou que cerca de 90 milhões de brasileiros com 16 anos ou mais, o equivalente a 54% da população, nunca consultaram um médico dermatologista.
Esses dados mostram uma realidade preocupante: ainda falta à população a consciência de que a pele pode ser um sinal de alerta para diversas doenças, das mais simples às mais graves. Estar atento a qualquer mudança e procurar um dermatologista para check-up anual deve ser um hábito. Cuidar da pele vai muito além da estética, é uma questão de saúde.
*Carlos Barcaui é presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD)
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