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Até que ponto o consumo de bebidas alcoólicas eleva o risco de câncer?

Estudos alertam para íntima relação entre o álcool e o surgimento de tumores - e ela é condicionada pelo volume ingerido

Por Ricardo Caponero*
Atualizado em 3 jun 2024, 17h08 - Publicado em 27 mar 2024, 08h14

Apesar dos avanços na oncologia, o câncer continua sendo uma das principais causas de morte no mundo. Todos os anos, mais de 19 milhões de pessoas são diagnosticadas com câncer e 10 milhões morrem da doença, o que representa uma em cada seis mortes no planeta. Dois terços delas ocorrem em países de rendimento baixo e médio, onde o câncer é frequentemente diagnosticado tardiamente e o acesso ao tratamento é limitado.

É previsto que o fardo global anual do câncer aumente para mais de 28 milhões de casos até 2040. Estas estatísticas sombrias suscitaram apelos mundiais para reduzir a mortalidade por câncer em um terço na próxima década. E o fundamental para que isso aconteça é a prevenção primária, a detecção precoce e o tratamento do câncer, ou de suas lesões precursoras, o mais cedo possível.

As bebidas alcoólicas acompanham a história do homem e estão associadas a ocasiões festivas, religiosas, recreacionais, mas também a episódios de abuso e doença (alcoolismo). A discussão sempre gira em torno da ponderação sobre seus eventuais benefícios e potenciais riscos. A alegação de que o vinho é rico em resveratrol, um famoso composto natural que possui diversas propriedades benéficas à saúde, parece não se sustentar quando contrabalançada pelos efeitos nocivos do álcool.

O álcool é um agente cancerígeno conhecido que aumenta o risco de vários tipos de câncer. Um relatório da American Association for Carcer Research (AACR) atribui ao consumo de bebidas a terceira posição nas causas de tumores, perdendo apenas para o tabagismo e o excesso de massa corporal.

Conforme o relatório do Global Burden of Disease (GBD), o álcool é o segundo fator de risco mais importante em homens e o sétimo em mulheres. Essa segunda colocação tem se mantido estável há mais de uma década.

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+ LEIA TAMBÉM: O que determina quanto álcool você toma?

Numa revisão da literatura médica em que foram identificados 572 estudos, incluindo dados de 486.538 casos de câncer, os riscos relativos para quem bebe com alta frequência em comparação com não bebedores e bebedores ocasionais foram 5,13 para câncer oral e faríngeo, 4,95 para carcinoma espinocelular de esôfago, 1,44 para colorretal, 2,65 para câncer de laringe e 1,61 para câncer de mama.

Há uma clara relação entre dose e risco – quanto maior a ingestão, pior. Os bebedores pesados tinham um risco significativamente maior de câncer de estômago, fígado, vesícula biliar, pâncreas e pulmão. Também houve indicação de associação positiva entre consumo de álcool e risco de melanoma e câncer de próstata.

Vale lembrar que o “grau” de percentagem alcoólica impresso em todos os rótulos de bebidas é a fração em volume (em quantidade de mililitros de álcool absoluto) contida em 100 mililitros de mistura hidroalcóolica. Uma taça de vinho com 120 ml, (em média 12ºGL) contém 14,4g de álcool, uma lata de cerveja de 330ml (5ºGL) contém 16,5g, e um copo de destilado (30ml a 40ºGL) contém 12g de álcool.

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Globalmente, estima-se que 741.300, ou 4,1% de todos os novos casos de câncer em 2020, foram atribuíveis ao consumo de álcool. Os homens representaram 76,7% do total desse montante.

Hoje não parece haver uma quantidade segura para o consumo. Em relação ao câncer de mama, o risco relativo pode dobrar para as pacientes com consumo de 36g/dia de álcool em relação às abstêmias. Uma revisão de estudos sobre o consumo de álcool e o risco de desenvolvimento de câncer de mama mostra riscos crescentes com o aumento do consumo.

Interpretamos esses resultados não como uma prova de causalidade, mas como um forte apoio a uma associação entre o consumo de álcool e o risco de vários tumores. Nós nos expomos diariamente a várias substâncias carcinogênicas, mas, quanto mais as evitarmos, melhor. Nesse sentido, o uso eventual de bebidas alcoólicas pode ser tolerável, mas deveria ser evitado o máximo possível.

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* Ricardo Caponero é oncologista e médico do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo

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