Mais juízes negros é dever das empresas e de todos
A iniciativa que une sociedade civil e empresarial para ajudar a pagar a conta e os custos da preparação dos futuros magistrados

A manifestação mais intensamente visível das desigualdades raciais na sociedade brasileira é sobejamente identificável no profundo grau de exclusão que separa e opõe negros e brancos em todos os espaços de prestígio público e privado do país. Não existe sequer um presidente ou presidenta negro nas 2 000 maiores empresas públicas e privadas do país, e são rareadas suas presenças no alto escalão das forças armadas, nos partidos e classe política, religiosa, esportiva, na comunicação social e na cultura.
Considerando que os negros representam a maioria dos brasileiros e que o regime democrático impõe a pluralidade e a diversidade como princípios basilares e estruturantes da igualdade jurídica, da representação e da participação social, é possível antever o quanto essa dura realidade joga por terra e se afasta indelevelmente da promoção do bem de todos sem distinção de cor e raça como exige e determina a Constituição cidadã de 1988.
É do alto dessa verdade cristalina que se apresenta um dos mais difíceis e intrincados desafios do país: como garantir a presença equilibrada dos cidadãos negros entre os magistrados brasileiros, quando nem a garantia de cotas de 20% para negros, em vigor há mais de dez anos, conseguiu promover e realizar tal façanha?
Disputar uma vaga na magistratura exige tempo e preparação que poucos podem ter e exige muito dinheiro para pagar os melhores cursos preparatórios e comprar os caríssimos livros de direito; dinheiro que os negros não têm. Sem desconsiderar os vieses raciais e de toda natureza que atravessa a vida do candidato negro, sem posses, padrinhos, e sem pedigree. Esse é um dos decisivos fundamentos que explica a presença de menos de 15% de negros no judiciário brasileiro, num país em que os negros são quase 60% da população, e que, consequentemente, alimenta e robustece o racismo estrutural que mantém negros e brancos separados e desiguais.
Uma das respostas possíveis é seguir a máxima de Geraldo Vandré: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Isto é, sair do conforto, deixar de lado o discurso e colocar o pé na estrada para construir uma nova história. E é justamente isso que o próprio Presidente da Suprema Corte e do Conselho Nacional de Justiça Luís Roberto Barroso juntamente com a Universidade Zumbi dos Palmares e Fundação Getúlio Vargas resolveram fazer. Convocar a sociedade civil e empresarial para ajudar a pagar a conta e os custos da preparação dos futuros magistrados. E é exatamente dessa forma que um grupo cada vez maior de presidentes e suas empresas têm respondido afirmativamente à sociedade, à justiça e aos futuros juízes negros: colocando os recursos na mesa para tornar possível essa missão grandiosa.
Em mais uma ação cívico empresarial, na próxima quinta, 22, Diego Barreto, Presidente da Empresa IFood e sua esposa Carol Nomura, abrem as portas da sua residência para receber outras dezenas de empresas e presidentes interessados e dispostos em fortalecer essa potente iniciativa, certos e convictos que construir o novo e forjar uma nova história de igualdade, oportunidades e justiça, é dever e responsabilidade de todos. Uma atitude solidária e transformadora que merece reconhecimento e aplausos de todos. Sozinhos os negros ficarão sempre reféns de dificuldades e obstáculos insuperáveis, com a ajuda dos empresários e juntos, a jornada fica mais curta e o sucesso mais perto. E, a magistratura mais representativa, enriquecida, diversa e justa.