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Recorde na Câmara: 30 segundos para leitura de 513 artigos sobre impostos

Texto aprovado reflete pressões de grupos organizados ansiosos pela redução de tributos sobre seus negócios e aumento da taxação para os concorrentes

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 11 jul 2024, 08h00

Arthur Lira, presidente da Câmara, deu trinta segundos para que 480 deputados pudessem ler o projeto de 513 artigos que regulamenta a reforma tributária, antes da aprovação.

O texto legislativo começou a ser redigido por volta das duas horas da madrugada de quarta-feira. Estava pronto às nove horas da manhã, quando começou a sessão de votação.

Recebeu cerca de 800 propostas de emendas em 12 horas, média de 66 a cada 60 minutos de sessão. Elas refletiam as pressões de grupos organizados, com acesso e poder de influência nas bancadas parlamentares para defender seus interesses que, basicamente, se resumem à redução de impostos sobre seus negócios e investimentos e aumento da taxação para outros, de preferência os concorrentes.

Houve momentos no plenário em que o silêncio valia ouro. Um deles foi quando o governo e a bancada do Partido dos Trabalhadores fizeram de conta que não estavam nem aí para o lobby da redução (de 85% para 26,5%) dos tributos cobrados sobre produção e comércio de armas e munições. Ao mesmo tempo, aumentavam-se (em cerca de 16%) impostos sobre livros. O Psol protestou, mas, no final, votou pela aprovação do projeto.

Queixas sobre o comportamento do governo se multiplicavam no plenário, principalmente entre os governistas. “O Ministério da Saúde”, reclamou o deputado Paulo Folletto, do PSB do Espírito Santo, “deveria ter demonstrado um interesse maior na taxação desses alimentos ultraprocessados, que fazem mal à saúde da população, principalmente, da população mais vulnerável.” Acrescentou:“[No governo e na Câmara] cederam ao lobby das grandes indústrias, cederam ao dinheiro. Não tiveram coragem de encarar uma alíquota diferenciada para alimentos ultraprocessados.”

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Quase metade do texto previa exceções fiscais — reduções e isenções — para alguns produtos, compensadas com aumento na carga tributária de outros produtos. Produções artísticas, por exemplo, foram premiadas com cortes (cerca de 60%). Em contrapartida, será cobrado mais na compra de veículos de resgate, como ambulâncias.

Às 19h48 os deputados lidavam com a quarta versão “final” da futura legislação sobre normas tributárias. Então, Lira deu trinta segundos para leitura antes da votação.

Um deputado do Partido Novo, o catarinense Gilson Marques, reagiu: “Fazer isso em menos de trinta segundos realmente é algo desproporcional, não é razoável e, principalmente, causa um precedente muito complicado, ainda mais porque dá ao presidente [da Câmara] um poder excepcional — caso isso vire regra a partir de agora — de, em trinta segundos, colocar qualquer tipo de texto e, em trinta segundos, iniciar a votação. Um absurdo total!”

Não adiantou. Foram 336 votos a favor (79 além do mínimo necessário, de 257), 142 contra e duas abstenções. Depois de 33 anos a Câmara aprovou a regulamentação. Agora, o texto vai ao Senado, onde será discutido e votado, provavelmente, ainda neste semestre. Depois voltará à Câmara, que terá a palavra final sobre cada vírgula, antes de remeter à sanção presidencial. Arthur Lira encerrou a sessão sorrindo: já tem uma reforma tributária para chamar de sua.

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