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O lado menos visível do fiasco na pandemia

Pobreza e fome avançam: descontrole na gestão da pandemia degrada a estrutura social brasileira em ritmo muito mais acelerado do que o avanço da Covid-19

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 15 Maio 2021, 09h06 - Publicado em 15 Maio 2021, 09h00

Em agosto do ano passado, o Brasil mantinha 9,5 milhões de pessoas vivendo na extrema pobreza, segundo a Fundação Getulio Vargas.

Na época, contavam-se 121 mil mortos na pandemia.

Seis meses depois, o número de pessoas na linha de pobreza havia aumentado 184%. Somou 27 milhões, calculou a FGV em fevereiro.

A mortandade avançou 110% nesse período, chegou a 221 mil vítimas no início da segunda “onda” pandêmica, que ainda não terminou.

Os dados sugerem que o descontrole na gestão da pandemia está degradando a estrutura social brasileira num ritmo muito mais acelerado do que o avanço da Covid-19.

Significa que o país estará muito mais fragilizado quando acabar a pandemia. Principalmente, no Norte e  no Nordeste, onde se vivem 70 milhões dos 212 milhões de brasileiros.

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Antes da pandemia, um de cada quatro habitantes dessas regiões sobrevivia com renda média inferior a R$ 260,00 por mês — equivalente a um quarto do salário mínimo.

A inflação dos alimentos agravou esse quadro. Nos doze meses contados até março, os preços dos produtos alimentícios subiu 11,7%, tendo-se como referência o Índice de Preços ao Consumidor (IPC).

O impacto na renda domiciliar é grande para ampla maioria, porque gastos com alimentação consomem cerca de 60% dos orçamentos das famílias.

Comida cara e mais escassa no prato reflete o descontrole na gestão da pandemia, com falência do sistema de saúde combinada à falta de política estável para mitigação dos efeitos sócio-econômicos.

O feijão-com-arroz, básico na mesa brasileira, é caso exemplar. A saca de arroz custava em média R$ 62,00 em julho do ano passado e agora não é vendida por menos de R$ 85. O feijão estava no patamar de R$ 300 e subiu para R$ 350.

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Nessa etapa de pandemia, escassez e preços altos, seria natural a atuação do Estado como regulador do mercado. Foi precisamente para isso que há três décadas, no governo Fernando Henrique, criou-se a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) com a função de formar estoques reguladores de alimentos básicos, em parte comprados de pequenos produtores.

A Conab virou item de negociação no loteamento partidário de sucessivos governos — na versão atual, o  bolsonarismo chama isso de “acordo” com o Centrão.

A Conab perdeu 27 armazéns, mas permanece no mapa das empresas estatais.

Esvaiu-se na função de reguladora de estoques. Na última década, os estoques de alimentos do setor público foram reduzidos em 96% (média anual).

Esse organismo público, instituído para mitigar efeitos de grandes oscilações de preços no mercado de alimentos, começou o segundo ano da pandemia sem feijão e com uma ínfima porção de arroz (21,1 mil sacas) nos seus depósitos, mostrou ontem o repórter Claudio Conceição, do portal Ibre-FGV.

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O avanço da fome entre os mais pobres está semi-oculto. Por enquanto, é o resultado menos visível do fiasco administrativo na pandemia. No Senado há quem aposte que, adiante, o assunto vai emergir na agenda da CPI da Pandemia. E será tema inevitável nas eleições do próximo ano.

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