Câmara aprova projeto ilegal apenas para confrontar o Supremo
Hugo Motta pode dizer que cumpriu o regimento interno, mas foi além da prudência: se expôs conduzindo a Câmara a uma situação de irrelevância institucional

Presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta terminou a quarta-feira (7/5) com uma novidade na sua biografia parlamentar: comandou a aprovação de uma resolução legislativa que ele e quase todos os 458 deputados presentes sabiam ser ilegal apenas para confrontar o Supremo Tribunal Federal.
Leis ruins não são raridade no plenário da Câmara. Durante o ano passado os deputados disseram “sim” a 716 projetos. Demonstrando com eloquência que na produção legislativa quantidade costuma ser incompatível com qualidade.
É incomum, no entanto, o aval consciente a uma iniciativa parlamentar reconhecida como inconstitucional dentro e fora da Câmara, e com prévio atestado de ilegalidade emitido pelo Supremo.
Por 315 votos a 143 a Câmara aprovou uma resolução para sustar uma ação penal em andamento no STF, abrangendo todos os crimes imputados a todos os envolvidos. Não há precedente.
Só um dos 34 acusados tem direito a imunidade parlamentar — e mesmo assim restrita a delitos cometidos depois da diplomação como deputado federal. Trata-se do deputado Alexandre Ramagem, acusado de crimes quando dirigia a agência de espionagem (Abin) antes de se eleger para a Câmara pelo Partido Liberal do Rio. O Supremo havia informado à Câmara que dos cinco delitos atribuídos a Ramagem dois estariam cobertos pela imunidade processual durante o mandato parlamentar.
Numa manobra tosca produziu-se uma resolução legislativa concedendo imunidade processual a Ramagem e aos 34 acusados no processo sobre a tentativa frustrada de golpe de estado. Jair Bolsonaro está no topo da lista.
Aprovada, a resolução agora será promulgada pelo deputado Hugo Motta, presidente da Câmara. Por ser reconhecidamente inconstitucional, deverá ser refutada pelo STF.
Se os deputados pretendiam demonstrar insatisfação com o Judiciário, perderam a chance ao produzir uma mensagem autodestrutiva.
O presidente da Câmara sempre poderá dizer que cumpriu o regimento interno e os acordos essenciais à sua eleição. No entanto, Motta foi além da prudência: se expôs conduzindo a Câmara a uma situação de irrelevância institucional.