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Isabela Boscov

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Tom Hiddleston

Por Isabela Boscov Atualizado em 11 jan 2017, 16h02 - Publicado em 15 out 2015, 21h12

Um papo-cabeça com Tom Hiddleston.

Um dos integrantes da nova geração de ouro de atores britânicos – à qual pertencem os igualmente articulados, versáteis e trabalhadores Benedict Cumberbatch, Eddie Redmayne e Michael Fassbender –, Tom Hiddleston já tinha uma década de carreira (esteve nas séries Cranford e Wallander, e em Cavalo de Guerra, Amor Profundo e Meia-Noite em Paris) quando subitamente estourou em Thor, de 2011, como o irmão também divino mas muito encrenqueiro e invejoso de Chris Hemsworth. Tudo mentirinha: Hiddleston, de 34 anos, é um doce de coco, conhecido entre equipes técnicas e elencos de apoio por ser o sujeito mais gentil, educado e afável de qualquer set em que esteja. Nos vinte minutinhos que passei ao telefone com ele falando sobre A Colina Escarlate, do diretor Guillermo del Toro, não encontrei nada que pudesse desmentir essa reputação, e muita coisa para confirmá-la. Mas que a conversa dele é séria, isso é.

Seu personagem em A Colina Escarlate, Thomas Sharpe, é típico da literatura do século XIX: o cavalheiro cuja casa abriga os segredos que ele não pode revelar ao mundo.

Esse é, sem dúvida, o ponto de partida. A grande inspiração de Guillermo del Toro para os personagens de A Colina Escarlate foram os romances góticos do século XIX, em especial Jane Eyre. E esse arquétipo do estranho sedutor, que exerce um apelo enigmático e magnético sobre a heroína inocente e de coração aberto, é a grande constante dos romances góticos. Na literatura, no folclore e nos contos de fadas, o cavalheiro com a mansão misteriosa no topo da colina representa o perigo. Guillermo, Mia Wasikowska e eu nos divertimos burilando as convenções desse arquétipo, do homem em tensão com o seu passado. Há algo no passado com que o personagem quer romper, mas de que não pode escapar. Outro aspecto do romance gótico que contém muita matéria-prima com a qual trabalhar é o empuxo entre sexo e morte, os opostos polares das nossas vidas. No gótico, a sexualidade propele a heroína na sua trajetória – mas nessa viagem, em algum lugar das sombras, em um corredor escuro, há sempre a morte à espreita.

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Corredores escuros não faltam na mansão de A Colina Escarlate. Por que essas mansões sobrenaturais ou com vida própria dos romances góticos?

Acho que em geral elas representam aquilo de que os vitorianos não podiam falar: sexo. Bom, nenhum de nós viveu na era vitoriana, mas essa é a impressão que formamos dela: um tempo de imenso progresso e inovação na indústria, na tecnologia, na organização, e de terrível repressão à sexualidade. Em certa parcela da sociedade vitoriana, ao menos, o sexo era coisa para portas fechadas, dentro do matrimônio, e mesmo assim não devia ser mencionado. Mas como se pode domar uma força tão vital quanto o sexo? Não se pode, é evidente. A sexualidade, se reprimida, vai emergir de outras formas. Por exemplo, nessa corrente subterrânea do romance gótico, nessa associação com o sobrenatural.

Por isso talvez o sobrenatural nesses romances seja tão desordenado e inquietante?

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Com certeza. Os góticos mudaram a maneira de falar do sobrenatural: antes os fantasmas eram explicados nos termos da tradição judaico-cristã, da oposição entre Deus e o demônio. Na literatura gótica, eles viraram uma representação de traumas emocionais não resolvidos; os espíritos estavam aqui para falar conosco, para nos alertar sobre um perigo iminente ou às vezes para causar esse perigo ou para castigar. Para as jovens heroínas desses romances, o sexo seria um conhecimento que, uma vez adquirido, não pode ser esquecido. Esse conhecimento, esse segredo é muito parecido com o conhecimento que os fantasmas têm a transmitir – daí uma coisa tão frequentemente tomar o lugar da outras nesses romances.

Os atores que trabalham com Guillermo del Toro costumam dizer que, nos sets que ele cria para os seus filmes, não é preciso usar a imaginação: eles são tão palpáveis e detalhados que é como estar dentro da cabeça de Guillermo. Foi essa sua experiência também?

Sinceramente, o set de A Colina Escarlate é o mais lindo e o mais completo, o mais real, em que já pus os pés na vida. Meu trabalho, como ator, às vezes consiste de responder com emoções verdadeiras a coisas que não estão na minha frente – que nem sequer existem, na verdade. Em A Colina Escarlate, ao contrário, foi como abrir uma porta mágica e entrar em outro universo. A mansão foi construída em três andares, com um elevador que funcionava de verdade; no papel de parede, se você olhar com atenção, está sutilmente entretecida a palavra “fear”, ou medo; a casa não está só metaforicamente em ruínas, afundando no pântano sob ela: quando pisávamos nas tábuas do chão, lama de verdade subia por entre as frestas.

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Você já conhecia os trabalhos anteriores de Guillermo, como A Espinha do Diabo ou O Labirinto do Fauno?

Conhecia, e muito bem. O Labirinto do Fauno, em especial, me deixou boquiaberto. Eu nunca tinha visto alguém casar o mais completo naturalismo das interpretações, com emoções tão enraizadas no mundo real, a um mundo tão fantástico, tão perturbadoramente singular. E gosto igualmente dos filmes em língua inglesa dele – Hellboy, ou Círculo de Fogo. O que Guillermo tem de único é o entusiasmo, a capacidade quase infantil de se maravilhar. E essa é uma qualidade contagiosa. Trabalhar com ele é sentir-se bem durante todas as horas do dia.

Você é conhecido por ser um amor de pessoa, invariavelmente gentil e simpático com todo mundo. Mas, quando o papel pede, você pode ser feroz. Qual das duas coisas fez Guillermo convidá-lo para o papel de Thomas Sharpe, a suavidade ou o perigo?

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Quando conheci Guillermo, fiquei incrivelmente lisonjeado: ele tinha visto tudo que eu fiz. Não só Thor e Os Vingadores, mas até meus papeis pequenos, como em Cavalo de Guerra. Ele até foi me ver no teatro, em Coriolano. E Coriolano é, sim, feroz mesmo, um dos personagens mais coléricos criados por Shakespeare. Enfim, sei lá o que Guillermo viu em mim – só sei que ainda bem que ele viu alguma coisa, porque um dos meus maiores prazeres em ser ator é interpretar personagens que não têm nada a ver comigo. Quanto mais distantes de quem eu sou verdadeiramente, maior o prazer em fazê-los.

Você diria que talvez essa seja a razão pela qual a plateia elegeu Loki como o vilão mais carismático dos filmes de super-heróis da Marvel, porque você o leva a sério, digamos assim?

É claro que filmes de super-herói são e têm de ser entretenimento, mas acredito que, por baixo de todo o barulho e todos os efeitos, existe sempre uma estrutura, um esqueleto, de verdades simples sobre a natureza humana – ou eles não funcionariam do jeito que funcionam. O antagonismo entre Thor e Loki é uma coisa antiga, primal. Por mais safado que seja o senso de humor de Loki, ali há algo sombrio mesmo. Mas nem Loki é uma criação só minha, nem Thor é só uma criação do Chris Hemsworth: construímos juntos ambos os personagens. Sem Chris, não teria rolado.

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E agora, no fim de novembro, você vai ser visto em um papel completamente diferente de qualquer um desses – como Hank Williams (1923-1953), o maior ícone da música country americana, em I Saw the Light. Como foi a experiência?

Pois é, aí está outro sujeito complicado. E um desafio gigantesco. Falando em personagens que não têm nada a ver comigo, Hank bate o recorde: um americano do Sul, do Alabama, nascido em 1923, criado numa família paupérrima no meio da Grande Depressão, que virou um dos maiores compositores, músicos e cantores do século XX, venerado por gente como Bob Dylan e Bruce Springsteen. Lamentavelmente, Hank tinha um talento que era grande demais para ser suportado. Era alcoólatra, tinha uma péssima relação com pílulas e comprimidos, e também com as pessoas. Principalmente com sua primeira mulher, Audrey, com quem ele viveu um caso de amor e ódio que lhe custou muito caro. Foi meio apavorante mergulhar de cabeça em um homem como esse, mas também um deleite: tanto sofrimento pessoal, e tanto júbilo na arte. Ele brilhou forte, e sucumbiu cedo demais.

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