“StartUp”: uma série para devorar
Um banqueiro, uma hacker, um gângster haitiano e um agente do FBI se enrolam uns com os outros num lugar que “não é os Estados Unidos – é Miami”

Quase infartei no quinto episódio de StartUp. Aconteceu aquilo que eu achava que ia acontecer, mas ver de fato acontecendo – foi um teste duro para os nervos. Já aquela outra coisa, por ela eu realmente não esperava. Além do choque inicial, houve a tensão quase insuportável de constatar que o negócio não iria parar por ali: a situação foi indo, e piorando, e ficando cada vez mais terrível, até o ponto em que eu não sabia mais se grudava de vez na televisão e arriscava a minha sorte ou corria para tomar um ansiolítico antes de ter uma síncope. Pode existir algo melhor do que o espectador ser pego totalmente de surpresa por uma série? Comecei a ver StartUp, uma produção da plataforma emergente Crackle que aqui está disponível pela AmazonVideo, sem nenhuma referência, apenas porque Martin Freeman está no elenco – e Freeman é talvez o melhor ator vivo no mundo neste momento. Seja como Jim no The Office inglês, em O Mochileiro das Galáxias, como Bilbo em O Hobbit, como Watson no Sherlock com Benedict Cumberbatch, ou como o agente Everett Ross em Capitão América: Guerra Civil e em Pantera Negra, ele sempre excede as melhores expectativas. Até aqui eu achava que, com todo o seu brilhantismo, Freeman não conseguiria ultrapassar seu trabalho extraordinário na primeira temporada de Fargo. Pois, em StartUp, ele se supera. Se eu um dia vir Freeman andando na calçada, vou atravessar a rua, porque estou com medo dele. E, no entanto, ele tem companhia à sua altura de sobra em StartUp. Primeiro, dos outros três atores principais – Adam Brody, de The O.C. (!!!), da desconhecida Otmara Marrero e em particular de Edi Gathegi, um queniano que já fez pequenos papéis em X-Men: Primeira Classe, Medo da Verdade e até Crepúsculo: Lua Nova. O protagonista de Gathegi, segundo-tenente de uma gangue haitiana, é o que mais cresce em StartUp, e ele é um estouro. Minto: o personagem que a série realmente quer revelar é Miami, uma cidade de contracorrentes culturais e econômicas tão intensas e promíscuas que, conforme propõe o criador Ben Ketai (também roteirista e diretor da maioria dos episódios), ela é um território à parte do americano.

Verdade seja dita, os dois primeiros episódios da temporada inaugural (neste ano irá ao ar a terceira) são bacanas o suficiente para o espectador prosseguir, mas não anunciam o que vem pela frente. Há a quota regulamentar de lugares-comuns (sexo no chuveiro etc.) e parece algo arranjada a confluência de quatro pessoas tão distintas: o jovem banqueiro Nick (Adam Brody, também produtor da série), que é filho de um financista muito sujo e por isso mesmo faz questão de andar na linha; a filha de cubanos Izzy (Otmara Marrego), que é um gênio da tecnologia mas uma pessoas dificílima, razão pela qual não consegue vender a ninguém sua ideia revolucionária de uma moeda digital que vai muito além do BitCoin; o haitiano Ronald (Edi Gathegi), pai de família dedicado e gângster eficientíssimo mas enojado com o gangsterismo, disposto a tudo para tirar os filhos do gueto e dessa vida; e o agente da divisão de crimes financeiros do FBI Phil Rask (Martin Freeman), que, doido para passar para o lado negro da força, está tentando extorquir 2 milhões de dólares do pai de Nick. Persista além dos dois primeiros episódios: no momento em que o rolo finalmente se forma, StartUp dispara, tomando rumos inesperados e ganhando altíssima voltagem. Devorei os dez episódios iniciais, e de hora em hora entro na Amazon para conferir se ela já liberou por aqui a segunda temporada.