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Isabela Boscov

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Sicario – Terra de Ninguém

Por Isabela Boscov Atualizado em 11 jan 2017, 16h03 - Publicado em 21 out 2015, 16h38

O fim do mundo, aqui e agora.

Ontem eu fiz um post sobre The Walking Dead; hoje, eu pergunto: e se você olhasse em volta e o apocalipse de fato já estivesse acontecendo? Se, em todos os lados, você só visse o fim do mundo, e o pesadelo fosse real?

É essa a sensação que tive em Sicario, o novo filme do provocateur Denis Villeneuve. É essa também a sensação da agente da SWAT Kate Mercer (Emily Blunt). Ao estourar um “aparelho” do tráfico no deserto do Arizona em busca de duas pessoas sequestradas, Kate e sua unidade encontram uma cena grotesca: entre as paredes da casa, escondidos pelo dry-wall, cadáveres às dezenas aguardam sua descoberta – todos de pé, lado a lado, como um coro que tem algo de terrível a anunciar. Quem viu outros filmes de Villeneuve, como Incêndios ou Os Suspeitos, sabe que esse é o tipo de horror que ele é mestre em conjurar – e, no qual, aqui, ele é magnificamente auxiliado pela fotografia de Roger Deakins. É verdadeiramente uma barbaridade. Kate está tão chocada que, sem refletir, ela no mesmo dia se junta a uma força-tarefa formada por sabe-se lá quais agências governamentais, com sabe-se lá qual propósito, exatamente. Pelo cinismo de Matt Graver (Josh Brolin), o agente que comanda a força-tarefa, não há de ser boa coisa. Pelo jeito soturno de Alejandro (Benicio Del Toro), o sujeito enigmático que acompanha Graver, pode-se ter certeza: vai ser pior ainda do que Kate imagina.

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Denis Villeneuve jurou de pés juntos em várias entrevistas que Sicario nada tem a ver com o Traffic de Steven Soderbergh; são mera coincidência o tema e o cenário (o narcotráfico na fronteira México-Estados Unidos) e a escalação de Benicio Del Toro. Pois pode continuar negando: Sicario é Traffic quinze anos depois – quinze anos em que os cartéis só fizeram expandir tanto seus negócios quanto sua selvageria, em que o combate a eles só fez se intensificar sem se tornar mais eficaz, em que gente que se acha da paz no mundo todo continua a promover, com seu nariz, um dos ramos criminosos mais bárbaros, cruéis e destrutivos da história da humanidade.

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Que cara teria Traffic hoje? A cara de Sicario: uma guerra às drogas que, na pressão por resultados, vai se tornando tão corrupta quanto o alvo que ela quer combater. Benicio Del Toro, o policial mexicano que em Traffic tinha o coração tão no lugar certo? Não é impossível que, em algum ponto desse caminho, ele tivesse se transformado no Alejandro de Sicario. Até na linguagem Sicario é irmão de Traffic – na luz acachapante da fronteira e na câmera sempre contígua aos personagens, como se a ação estivesse sendo apanhada ali, no momento, com todo o imprevisto e a volatilidade dele.

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Uma coisa, porém, falta a Villeneuve em comparação com Soderbergh: uma certa discrição. Quanto ele parte para o choque e o drama, ele vai com tudo – e, em vez de aumentar o impacto de certas cenas com esse ímpeto todo, faz com que elas ganhem um quê de programado e manipulativo. Villeneuve está no seu melhor não nesses instantes de resolução dramática, mas sim quando se deixa levar por seus excelentes atores para o caos, para a vertigem e o nervosismo que eles estão sentindo. Apesar dessa ressalva, é um belíssimo trabalho. Mas ele ganha ainda mais sentido para quem viu Traffic (lá vou eu de novo) e tem ainda na memória a cena final do filme de Soderbergh. Compare-a à cena final de Sicario, e daí me diga: é uma “continuação”, por assim dizer, ou não é?


Trailer

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SICARIO – TERRA DE NINGUÉM
(Sicario)
Estados Unidos, 2015
Direção: Denis Villeneuve
Com Emily Blunt, Benicio Del Toro, Josh Brolin, Victor Garber, Daniel Kaluuya, Jon Bernthal, Jeffrey Donovan, Raoul Trujillo, Julio Cedillo
Distribuição: Paris Filmes
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