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Isabela Boscov

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O Clã

Por Isabela Boscov Atualizado em 30 jul 2020, 23h54 - Publicado em 9 dez 2015, 10h00

Um novo – e tenebroso – círculo do inferno.

Como explicar a profundidade do horror exposto em O Clã, que estreia esta semana? Qualquer descrição do caso da família Puccio – e escreveu-se copiosamente sobre ele na Argentina – será sempre insuficiente.

Para se ter uma medida do quão chocante e doentio foi aquilo que se passou na casa dos Puccio, em Buenos Aires, entre 1983 e 1985, é preciso bem mais do que simplesmente relatar os fatos. É preciso um cineasta como Pablo Trapero, tão inflamado e irredutível (e ao mesmo tempo tão formidavelmente técnico) que não dá à plateia um segundo de paz: os personagens estão sempre ali, enfiados na cara do espectador, que não tem como fugir deles ou defender-se do que está vendo. É necessário, também, um ator com a resistência épica de Guillermo Francella, capaz de mergulhar em um personagem como Arquímedes Puccio, o tenebroso patriarca dos Puccio, sem fraquejar em um instante sequer. E é preciso ainda um ator com a doçura de Peter Lanzani, que faz Alejandro, o mais assediado e torturado dos filhos de Arquímedes: é principalmente do ponto de vista de Alejandro, sempre vacilante e dividido, que se veem os acontecimentos.

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Arquímedes Puccio, contador de formação e dono de rotisserie de fachada, era um dos vários “empreiteiros” contratados pela ditadura argentina para fazer sumir os desafetos do regime militar. A certa altura, os serviços desses empreiteiros passaram a ser utilizados também com fins mais pragmáticos: fazer caixa por meio de sequestros convencionais, sem motivação política, apenas para recolher o dinheiro do resgate – e nunca devolver as vítimas à família. Em 1982, porém, a situação começou a azedar para a ditadura, com a derrota na Guerra das Malvinas. Em 1983, a junta militar caiu, e iniciou-se um intrincado retorno à democracia. Profissionais como Arquímedes Puccio ficaram sem trabalho. E alguns deles, como o próprio Arquímedes, decidiram lançar-se nos negócios por conta própria.

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Quando a polícia chegou à casa do bairro de classe média de San Isidro, em 1985, e libertou uma empresária de 65 anos com sinais de maus-tratos brutais, três outras pessoas já haviam perdido a vida no esquema de Arquímedes – dois rapazes e um homem de meia-idade. Já parece hediondo? Pois não é nem o começo da história. Arquímedes era um tipo singular de psicopata. Não só enriquecia com os sequestros seguidos de assassinato e tirava de sua frieza grande orgulho profissional, como enredava obsessivamente a família nas suas atividades: os sequestrados eram mantidos na sua casa, acorrentados no banheiro ou, mais tarde, no porão, sem que Arquímedes e sua mulher, Epifanía (Lili Popovich), fizessem grande esforço para ocultar dos filhos mais novos a presença deles. Alejandro, um rapaz popular, cheio de amigos e jogador de rúgbi de futuro, era obrigado pelo pai a participar de todas as etapas do esquema – o primeiro sequestrado, aliás, foi um jogador do seu time de rúgbi com quem Alejandro desafortunadamente iniciara uma amizade. Quando Alejandro começou a dar sinais de que não mais suportava a pressão, Arquímedes mandou voltar da Nova Zelândia um outro filho, Maguila (Gastón Cocchiarale), que entrou no esquema imediatamente, sem titubear nem questionar.

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Mas, da mesma forma que em seus outros filmes (El Bonaerense, Família Rodante, Leonera, Abutres, Elefante Branco), Pablo Trapero tem um cenário maior em vista. Não é no circo de horrores que está seu interesse, e sim nas razões pelas quais ele se deu: assim como Arquímedes meticulosamente alicia a família e a torna a cúmplice dos seus crimes, a ditadura militar revelou a ele seu “potencial”, encorajou-o, treinou-o, deu-lhe oportunidades e o afagou, tratando-o como amigo próximo e pessoa de importância. É esse o efeito dos regimes corruptos: despertar os monstros do seu estado de latência, e disseminar a degradação não só no sistema político, mas no íntimo dos indivíduos e na mesa do jantar em família.


Trailer

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O CLÃ
(El Clan)
Argentina/Espanha, 2015
Direção: Pablo Trapero
Com Guillermo Francella, Peter Lanzani, Lili Popovich, Gastón Cocchiarale, Stefanía Koessl, Franco Masini, Antonia Bengoechea, Giselle Motta, Fernando Miró, Juan Cruz Márquez de la Serna
Distribuição: Fox
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