Dez filmes que dão vontade de acelerar
Fuga, perseguição, proezas ao volante: no cinema, gastar gasolina pode ser um prazer sem culpa
Mesmo quando o carro sem motorista houver transformado em memória distante aquele prazer incomparável de pisar no acelerador, filmes antigos e novos vão continuar celebrando as proezas ao volante, o ronco de um motor repleto de cilindros, as linhas agressivas de um esportivo ou a beleza intangível dos clássicos: uma paixão tão intensa quanto esta que dominou o século XX não esfria assim tão fácil – e um objeto tão dinâmico e fotogênico quanto o carro vai demorar a sair de moda no cinema. Confira, aqui, uma amostra de dez filmes que vão lembrar você de como pode ser eletrizante dirigir. (Mas lembre-se, nada de tentar copiar isso nas ruas.)
Wheelman
(2017 – Na Netflix)
Motorista de carro de fuga comparece para um trabalho com dois sujeitos que nunca viu antes. Recebe um telefonema estranho enquanto espera eles assaltarem o banco. E passa a hora e meia seguinte suando frio, rodando por ruas, viadutos e estacionamentos na tentativa de reverter o desastre em que a coisa toda descarrilhou. O ator e produtor Frank Grillo passa quase todo o tempo sozinho em cena, primeiro num BMW e depois num Porsche, mas cada mudança de marcha tem sua razão de ser neste exercício enxuto, direto e tenso.
Busca Sem Limites
(Collide, 2016 – Na Netflix)
Na Alemanha, o americano Casey (Nicholas Hoult) vende drogas na balada e faz outros servicinhos para o endoidecido traficante Geran (Ben Kingsley). Quando conhece a garçonete Juliette (Felicity Jones), Casey decide que vai mudar de vida. Mas eis que Juliette precisa de uma cirurgia urgente e, portanto, de dinheiro. E Casey, como um perfeito cavalheiro, entra num daqueles famosos “últimos golpes” contra um magnata do transporte de carga (Anthony Hopkins) que usa a fachada para controlar o narcotráfico europeu. O filme consiste, basicamente, de Casey roubando carros (de peruas de família a Mercedes, Aston Martins e Jaguars) para acelerar pela Autobahn e fugir de capangas barbudos. É uma bobagem, mas com ritmo e humor. E a ação é muito bem filmada.
Em Ritmo de Fuga
(Baby Driver, 2017 – No NOW, AppleTv, GooglePlay)
Aonde Baby (Ansel Elgort) for, eu vou junto. Mas no banco do passageiro, porque ao volante não há ninguém que se compare a este protagonista irresistível, que é o melhor motorista de fuga à disposição dos criminosos de Atlanta – embora ele próprio não seja criminoso, e sim apenas um rapaz que desgraçadamente entrou em dívida com Doc (Kevin Spacey, em fase pré-escândalo), agenciador de roubos variados. Enquanto Baby não quitar a dívida, Doc não vai deixar barato. Aliás, talvez nem depois. As perseguições de carro são do balacobaco, graças aos melhores dublês do ramo, à imaginação do diretor Edgar Wright e à sua minúcia de editar cada cena de fuga ou tiroteio precisamente contra as batidas da música de fundo – 43 faixas deliciosas, escolhidas a dedo. Um dos melhores filmes deste ano.
Drive
(2011 – Em DVD e ClaroVideo)
Um sujeito tão quieto que nem o nome dele se sabe trabalha como motorista de cenas de ação no cinema – e, nas horas vagas, dirige carros de fuga em assaltos. Ou seria o contrário? O Garoto (Ryan Gosling) é um virtuose do volante e um mestre intuitivo dos espaços em que os veículos se movem. Na sequência de abertura, a polícia identifica seu carro como parte de um crime – e a presciência com que o Garoto para numa vaga, ou apaga os faróis, para iludir as patrulhas faz desta perseguição sem ação um ato de bravura cinematográfica. Tão impassível é o Garoto que suas explosões de violência são um choque. Mais ainda porque, mesmo quando perde o controle, ele não se descontrola: cálculo e precisão são as suas marcas. E as duas terão de ser reequacionadas diante do imprevisto – uma mulher com um filho pequeno, apelando ao seu instinto protetor. O diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn faz um filme magistral, ultra-cool e estiloso, com um elenco que é um espetáculo e onde todo o sentido está na luz, no enquadramento, no close e no movimento (mais a trilha atmosférica de Cliff Martinez).
Rush – No Limite da Emoção
(Rush, 2013 – Em DVD)
Chris Hemsworth e Daniel Brühl mostram estilos radicalmente diferentes ao volante e na vida (balada num caso, disciplina no outro) nesta eletrizante recriação da antológica temporada de Fórmula 1 de 1973, em que o inglês James Hunt e o alemão Niki Lauda foram para o pau. Ron Howard (de Apollo 13) dirige como quem não tem um segundo a perder, e com um humor e uma vibração que transbordam da tela. Vale frisar: não, não é preciso entender bulhufas de Fórmula 1, e nem sequer ter qualquer interesse por corridas, para embarcar no filme.
Um Golpe à Italiana
(The Italian Job, 1969 – Na Netflix)
Poucas vezes a ação coreografada de maneira tão brilhante foi também tão divertida quanto neste filme estrelado por Michael Caine – no papel de um ladrão avesso à violência e afeito à inteligência que, para roubar um carregamento de ouro em Turim, na Itália, planeja parar a cidade com vários Mini Morris, alguns Jaguars, um ônibus e um engarrafamento monstro. Um dos mais deliciosos exemplares da tradição inglesa do filme de roubo. Ganhou uma refilmagem simpática em 2003, com Mark Wahlberg e Charlize Theron (que foi eleita, de longe, a melhor motorista do set).
Bullitt
(1968 – Em DVD e iTunes)
Este é o supra-sumo e o padrão-ouro dos filmes de perseguição. Como um policial de São Francisco encarregado de proteger um mafioso que vai testemunhar no tribunal, Steve McQueen prova, sem nenhum esforço e sem se perturbar, por que ficou conhecido como “o rei do cool”: ele é o cara, e não deixa para ninguém. Dois Mustang 390 GT Fastback e dois Dodge Charger 440 Magnum foram detonados na sequência antológica que define o filme; ao volante, o próprio McQueen (inclusive na cena em que um jato passa taxiando por cima dele) e o super-dublê Bud Ekins se revezaram, queimando pneu a até 170 quilômetros por hora nas ladeiras de São Francisco. É tanto ronco e freada que o compositor da trilha, o grande Lalo Schifrin, se recusou a acrescentar música à cena – já estava perfeito, disse ele, com toda razão. O tipo de filme que, hoje, nenhuma seguradora e nenhuma prefeitura deixariam fazer. Ainda bem, portanto, que já foi feito.
60 Segundos
(Gone in Sixty Seconds, 2000 – Em DVD e iTunes)
O roteiro é só pretexto. Mas quem se importa, com tanto cheiro de gasolina no ar? Randall “Memphis” (Nicolas Cage) é um mestre do furto de carros que sai da aposentadoria para salvar a pele do irmão mais novo. Sua missão: roubar cinquenta (!!!) carros raros/exóticos/valiosos e entregá-los todos no porto, intactos e prontos para o embarque, a tal hora de tal dia. O chefão a quem ele deve o serviço, a polícia e os rivais correm todos nos seus calcanhares, dificultando o que já não era simples. Mas Cage, que então era ainda um astro, tem na sua equipe Angelina Jolie (que então não era ainda uma estrela) e Robert Duvall (que foi sempre um ator maravilhos). Um dos exemplares mais divertidos do cinema barulhento do produtor Jerry Bruckheimer.
Encurralado
(Duel, 1971 – Em DVD)
O trabalho de estreia de Steven Spielberg nasceu como filme para a TV. Mas ficou tão estupendo que o estúdio mandou o rapaz filmar cenas adicionais para espichar a duração e qualificá-lo para exibição nos cinemas. Um sujeito está viajando de casa para o trabalho na sua banheira – um Plymouth Valiant – quando topa com um caminhão-tanque lerdo à sua frente e o ultrapassa em perfeita obediência às leis de trânsito. O caminhoneiro, porém, não perdoa, e durante os 80 e poucos minutos seguintes vai tentar de todas as maneiras jogar o motorista do Plymouth para fora da estrada. É Tubarão no asfalto: nunca se vê o rosto do caminhoneiro, nunca se explica sua fúria incontrolável, nunca se dá pausa à perseguição. Coisa de gênio.
Carga Explosiva
(The Transporter, 2002 – Em DVD e Telecine)
Ex-soldado das Forças Especiais britânicas, Frank ganha a vida fácil na Riviera Francesa, transportando “pacotes” para lá e para cá sem perguntar nomes e sem querer saber do conteúdo. Um dia, porém, o “pacote” começa a se transportar sozinho e, pela primeira vez, Frank viola suas próprias regras (e, mais importante, as regras do contratante) e vai ver o que tem lá dentro. Seguem-se várias cenas deliciosamente absurdas, em que Frank dirige seu BMW tunado feito louco por aquelas estradinhas cheias de curvas e precipícios. Carga Explosiva teve duas continuações e virou até série de TV, porque tinha um motor e tanto: Jason Statham, provando que, além de durão, tinha humor e muito carisma.