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O que há de mais legal no mundo dos quadrinhos

Em graphic novel, artista mineiro resgata memórias da Tragédia de Mariana

Em 'Doce Amargo', João Marcos Mendonça relembra como ele e sua família foram afetados pelo rompimento da barragem do Fundão, em 2015

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 24 out 2025, 12h22

Às vésperas da COP 30, a 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudanças Climáticas, o quadrinista e roteirista João Marcos Mendonça presta um serviço indispensável aos sábios que se reunirão em Belém do Pará com o objetivo de negociar ações para combater a crise ambiental em curso. Ao publicar a graphic novel Doce Amargo, lançada recentemente pela Nemo, selo da editora Autêntica, o artista relembra aos conferencistas as consequências humanas e ambientais de uma das maiores tragédias de mineração do país, ocorrida há quase uma década, em Mariana, Minas Gerais.

Em 5 de novembro de 2015, a barragem do Fundão, que armazenava 55 milhões de metros cúbicos de resíduos, se rompeu. O equivalente a 21.000 piscinas olímpicas cheias de rejeitos de minério foram despejados na natureza. Em pouco tempo, essa lama tóxica percorreu 660 quilômetros através do curso do Rio Doce, atingindo 38 municípios, matando pessoas e afetando um bioma riquíssimo. No meio desse caminho, estava Governador Valadares, onde Mendonça e sua família moravam. A graphic novel, primeiro trabalho solo de maior alcance para o público jovem e adulto, é um relato autobiográfico do que eles viveram no ano que se seguiu ao evento.

João Marcos Mendonça: relato pessoal em forma de quadrinhos -
João Marcos Mendonça: relato pessoal em forma de quadrinhos – (Editora Nemo/ Ana Pereira/Divulgação)

A obra nasceu de uma necessidade urgente de confrontar o esquecimento. “Existe meio que um silenciamento quase institucional nessas tragédias assim ambientais, onde tem muito dinheiro envolvido,” explica Mendonça. “Eu precisava de contar essa história até para poder colocar para fora mesmo isso que a gente viveu.” Inicialmente hesitante devido à sua natureza reservada e a de sua família, o autor encarou a exposição como um “preço que se paga para poder tirar isso que estava guardado no meu peito”. O desafio era transformar o trauma em arte, garantindo que o noticiário, que geralmente abarca apenas os números, não ofuscasse as “várias tragédias humanas dentro dessa tragédia maior”.

Doce Amargo mergulha na crise que levou Governador Valadares ao colapso. Mendonça lembra de um cenário de “apocalipse”, no qual a população de 280 mil pessoas ficou sem água por dez dias. As doações, muitas vezes ineficazes ou contaminadas (como caminhões de água que tiveram que ser descartados), não conseguiam atender à demanda. Hoje, a tragédia corre o risco de se reduzir a estatísticas e cifras. O autor observa que estamos vivendo o momento do pagamento das indenizações (Programa de Indenização Definitiva – PID), o que ele ironicamente chama de “silenciamento institucional”. “Sabe o quanto cada pessoa vai ganhar”, questiona, a título de retórica. ” São 35 000 reais, mas como é possível colocar valor nesse tipo de desastre?”

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DOCE AMARGO; De João Marcos Mendonça; Cores de Mariane Gusmão; 184 páginas; Preço: 89,90 reais (livro) e 69,90 reais (e-book) -
DOCE AMARGO; De João Marcos Mendonça; Cores de Mariane Gusmão; 184 páginas; Preço: 89,90 reais (livro) e 69,90 reais (e-book) – (Editora Nemo/Divulgação)

Uma década

Dez anos depois, as incertezas persistem. Mendonça relata que ele e muitas famílias continuam consumindo água mineral, pois há dúvidas constantes entre o discurso oficial da recuperação e a experiência dos atingidos. “A avaliação que eu faço é que as pessoas, o meio ambiente, são só um detalhe dentro desse negócio grande que é a mineração,” afirma.

Apesar de ser seu primeiro volume extenso para o público adulto, Mendonça não partiu do zero em termos de narrativa pessoal. Suas principais referências foram obras que exploram o potencial dos quadrinhos para contar histórias íntimas, como o clássico franco-iraniano Persépolis, de Marjane Satrapi, e os trabalhos de relato pessoal do canadense Guy Delisle, especialmente Pyongyang – Uma viagem à Coreia do Norte.

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Personagem de seu próprio trabalho: 'Doce Amargo' também é protagonizado pela família de João Marcos Mendonça -
Personagem de seu próprio trabalho: ‘Doce Amargo’ também é protagonizado pela família de João Marcos Mendonça e seus amigos – (Editora Nemo/Divulgação)

O processo de criação foi extenuante. Foram nove anos dedicados ao roteiro, um período marcado pela dificuldade em definir o recorte temporal e por diversos momentos de quase desistência. A produção final da arte, no entanto, foi uma maratona de sete meses ininterruptos, de janeiro a agosto. A cor, aliás, é um elemento fundamental. “Para mim os dois personagens principais são o Rio e as cores da Mariane [Gusmão], assim, que deram [beleza ao livro],” afirma Mendonça.

Antes de Doce Amargo, Mendonça dedicou 16 anos à Mauricio de Sousa Produções (MSP) como roteirista. Sua entrada no estúdio se deu de forma fortuita, após a apresentação de sua dissertação de mestrado sobre quadrinhos como arte. Durante esse período, o Cebolinha era seu personagem preferido para criar. Agora, com o lançamento da graphic novel, o autor já planeja a expansão de seu trabalho autoral. Ele manifestou o desejo de escrever uma nova história, desta vez uma “autobiografia educacional”, para contar sua experiência na educação básica e como a arte o salvou de quase entrar para as estatísticas de evasão escolar.

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Doce Amargo cumpre a missão de resgatar a dimensão humana de uma tragédia que, se não for contada, corre o risco de ser esquecida pela sociedade. A obra é um lembrete crucial de que a vida das pessoas e a cultura de uma cidade são mais importantes do que qualquer cifra.

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