Em 2010, Marina atacou Serra no debate da Record. Por que Aécio não atacaria Marina agora? PT venceu no segundo turno, não no primeiro. E porque Marina deixou!

Até o admirável Marco Antonio Villa chama Aécio de “linha auxiliar do petismo” por criticar Marina. Mas não fazê-lo é ser linha auxiliar do marinismo.
“Ah, mas isto é menos pior!”, gritam alguns, seguros dessa tese também questionável. Ora, menos pior para o Brasil, na cabeça de Aécio, do PSDB e de seus eleitores, é que o mineiro passe ao segundo turno.
E para tristeza dos marinistas de fato e de ocasião (não estou incluindo Villa nisto), há chances, por menores que sejam, de que isto aconteça. Por que então Aécio deveria parar de disputar o segundo lugar do primeiro turno?
Marina não parou em 2010. Há 4 anos, igualmente no fim de setembro, lia-se essa matéria da Folha sobre o debate presidencial na TV Record, cuja edição de 2014 é neste domingo (hoje), às 22:30:
Sim, “Marina buscou o confronto com Serra do começo ao fim do debate”, sem deixar de atacar Dilma – o que aliás Aécio vem fazendo diária e intensamente em sua campanha, ao contrário do que a gritaria vitimista dos marinistas contra ele quer fazer crer.
Como dizia a reportagem: “É que, para eventualmente ir ao segundo turno, ela não pode apenas roubar votos do tucano. Também precisa abalar o desempenho de Dilma.”
Do mesmo modo, Aécio precisa abalar o desempenho tanto de Marina quanto de Dilma, o que os números deixam perfeitamente claro:
No Datafolha divulgado na última sexta, 26 de setembro, Dilma tem 40%, Marina 27%, Aécio 18%. Brancos e nulos somam 7% e os indecisos são 4%. (Em votos válidos – quando se tiram os nulos e brancos: Dilma tem 45%, Marina 31%, Aécio 21%.)
No Sensus, Dilma tem 35,1%, enquanto Marina (25%) e Aécio (20,7%) estão tecnicamente empatados quase no limite da margem de erro de 2,2% para mais ou para menos.
Vejamos agora os resultados disponíveis das pesquisas eleitorais na ocasião daquele debate de 2010:
No Datafolha divulgado naquele mesmo dia, Dilma tinha 46%(!!!) das intenções de voto contra 28% de Serra e apenas 14% de Marina. Ou seja: Dilma tinha 6 pontos a mais do que tem hoje! Sem falar que no Ibope, ela tinha 50% das intenções de voto!
Pior: em votos válidos no Datafolha, Dilma tinha 51%(!!!) contra 32% de Serra e 16% de Marina, o que lhe daria a vitória já no primeiro turno. O risco de que ela ganhasse por antecipação, portanto, era muito maior do que é hoje!
E isto aconteceu? Não! Já veremos o resultado final.
Mas antes: aqueles que exigem que Aécio pare de “bater” em Marina, onde estavam quando Marina “batia” em Serra? Não acusaram Marina de ajudar o PT naquelas circunstâncias bem mais graves? Nem quando ela optou por não apoiar Serra no segundo turno, o que teria mudado o resultado da eleição, como já mostrei aqui? Tá “Serto”!
Como bem escreveu uma leitora: “Ao contrário, em 2010, toda a mídia classificou Marina de ‘fenômeno político’ (e não de ‘traíra’ ou falsa oposição ao PT) por ter angariado os mesmos 20% que o Aécio teria hoje e de ter fingidamente se calado no 2º turno.
Exigir que hoje em plena campanha de 1º turno Aécio fique ao lado de Marina (que sempre ODIOU o PSDB, como todos que acompanham a política nestes últimos 24 anos sabem bem!) e do PSB, partido que sempre foi base de apoio dos governos Lulopetistas, é, do meu ponto de vista, uma sacanagem sem tamanho e, quiçá, uma torcida organizada para que o PSDB acabe o quanto antes.”
Eis o resultado final das eleições de 3 de outubro de 2010, em votos válidos:
Dilma terminou com 46,91%, Serra 32,61% e Marina 19,33%, ou seja: em relação ao Datafolha do dia 27 de setembro, Marina subiu 3,33% em votos válidos na reta final atacando ambos os adversários.
Se os pontos que Dilma perdeu foram para Marina e não para Serra, é justamente porque ela atacou os dois, mostrando-se como a melhor alternativa ao PT. Naquela época, o vazamento na receita e o escândalo na Casa Civil impediram Dilma de crescer; e hoje, o Petrolão e outros escândalos petistas poderiam fazer o mesmo, se bem utilizados pelos adversários.
Em relação ao Sensus de 26-28 de setembro de 2010 (quando Dilma tinha 47,5%, Serra 25,6% e Marina 11,6% dos votos válidos), Marina subiu 7,73% na reta final!
Marina, aliás, estava a 16 pontos de Serra em votos válidos no Datafolha e mesmo assim continuou atacando o candidato. Aécio está a 10 pontos, e não pode atacar Marina? Mesmo tecnicamente empatado com ela no Sensus?
Serra não estava em queda em 2010. Marina está em queda em 2014. Por que Aécio não tentaria vencê-la se está em ascensão? No lugar do candidato do PSDB, duvido que os marinistas de fato e de ocasião desistissem de tentar. Não se trata de revanche, nem vingança, mas de oportunidade.
O problema é que, na retórica de analistas e militantes, o desejo do que eles gostariam que Aécio fizesse se sobrepõe à compreensão da racionalidade daquilo que Aécio faz. Muitos não deixam claras as diferenças entre uma coisa e outra (nem a si próprios, provavelmente) – e o debate público vira uma guerra de desejos subjetivos, que só confunde a cabeça do eleitor.
Alguns atribuem a Aécio uma “tática suicida”, como se não fosse suicídio jogar a toalha antes da hora. (Tampouco distinguem “para quem” isto é suicídio. Para eles? Para o Brasil? Para o que pensam ser melhor para o Brasil? Para o que pensam ser melhor para Aécio?)
Ficando de fora do segundo turno – e a maior probabilidade é de que haja um -, Aécio ainda poderá apoiar Marina, que de qualquer modo terá mais tempo de TV para recuperar os votos perdidos e ganhar os que nunca teve.
De resto, é evidente que as críticas de Aécio a Marina, boa parte delas ao petismo da candidata, tendem a tirar muito mais votos dela para ele do que para Dilma, o que, se acontece, é numa porcentagem ínfima relativa aos indecisos que veem a confirmação do que o PT diz sobre Marina no discurso de Aécio, mas não querem votar nele. Esta suposta porcentagem é amplificada no discurso daqueles que preferem condenar o candidato do PSDB por lutar pela sua candidatura a condenar Marina por reagir mal aos ataques do PT.
Eu já mostrei aqui que Marina perdeu 9 pontos e Dilma cresceu 6 no Nordeste, e isto é resultado não das críticas necessárias de Aécio, mas do terrorismo eleitoral do PT sobre a perda de bolsa-família e benefícios afins.
Uma síntese geral do ponto de decisão humana em pauta seria mais ou menos esta:
Por medo de não vencer quando ainda existe a possibilidade, e sabendo que o mais provável é que haja uma segunda etapa para derrotar o suposto inimigo em comum, o melhor a fazer é aliar-se a alguém que sempre atacou você e que nem é (tão) diferente assim do inimigo em comum do qual esteve ao lado por mais de 20 anos?
OU:
Por medo das remotas chances de que o suposto inimigo em comum vença por antecipação a batalha, deve-se parar de lutar por uma chance de derrotá-lo na provável segunda etapa, só porque isto pode prejudicar alguém que sempre atacou você e que nem é (tão) diferente assim do inimigo em comum do qual esteve ao lado por mais de 20 anos?
Onde está, aliás, o discurso da candidata do PSB em favor dessa aliança? O que ela tem a oferecer em troca? Eu não sou radicalmente contra tal coisa, apenas avalio que a questão dependeria muito dos termos e que a antecipação dessa necessidade, pelo menos enquanto Dilma tem 40% no Datafolha, com rejeição de 31%, é um desespero desnecessário.
De minha parte, ademais, se a outra opção em jogo é Marina, que apoia o maior atentado do governo Dilma contra a democracia (o decreto 8.243), o remoto risco de que Dilma vença no primeiro turno dificilmente me faria deixar de lutar pela minha remota chance de passar ao segundo.
E você aí pode até ser a favor de uma aliança, preferir tal coisa, ter um desejo por ela, mas, dadas as circunstâncias, conforme analisado acima, a opção de Aécio pela luta até o fim é perfeitamente racional e digna – e não vejo motivo algum para condená-lo, ainda que Dilma seja eleita no primeiro turno, com seu terrorismo eleitoral.
Mas podem me culpar à vontade também, caso isto aconteça. Sei que os marinistas de fato e de ocasião vão se aproveitar do não governo de Marina para supor que ele seria muito melhor que o próximo governo de Dilma e vão atacar quem quer que não tenha apoiado a candidata do PSB, acreditando-se cobertos de uma razão demonstrável.
Fiquem à vontade. Não dou a mínima para a gritaria de petistas, marinistas ou antipetistas voluntariamente cegos.
[* VEJA O PRÓXIMO POST: Aécio ultrapassa Marina no Centro-Oeste. E ainda querem que ele jogue a toalha?]
Felipe Moura Brasil ⎯ https://www.veja.com/felipemourabrasil
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